Valor econômico, v. 17, n. 4080, 30/08/2016. Política, p. A8

Lula aprova tom político de discurso

Ex-presidente demonstrou impaciência com respostas técnicas de Dilma e ainda busca votos

Por: Andrea Jubé / Thiago Resende

 

Foi um Luiz Inácio Lula da Silva com ar abatido e de enfado que acompanhou ontem a sessão de defesa de sua afilhada política, a presidente afastada Dilma Rousseff, no momento mais dramático do julgamento do impeachment. Lula achou que Dilma foi bem, embora tenha sido prolixa nas respostas. A avaliação geral dos senadores foi de que Dilma fez um discurso equilibrado, sem agressões, mas insuficiente para reverter votos. Dilma começou bem disposta o dia em que passaria mais de 15h respondendo às perguntas de seus julgadores: "Vamos à luta", conclamou, no café da manhã com aliados no Palácio da Alvorada.

"Gostei, gostei, ela falou o que tinha que falar", disse o ex-presidente Lula a um grupo de jornalistas, na saída da galeria do Senado, de onde acompanhou a sessão. Ele deixou o Senado por volta das cinco horas da tarde, na metade do depoimento.

De fato, Lula apreciou o discurso, que foi escrito a várias mãos, inclusive pela própria Dilma. A parte técnica foi abastecida pela auxiliar Sandra Brandão, braço-direito de Dilma na Presidência, e pelo advogado José Eduardo Cardozo. Os ex-ministros Jaques Wagner, Aloizio Mercadante e Ricardo Berzoini também colaboraram, e a versão final teve retoques de jornalistas próximos.

A avaliação de Lula e de senadores aliados é de que o discurso teve o tom político, sugerido pelo ex-presidente, com doses de emoção. Lula aprovou, em especial, quando Dilma lembrou que o impeachment nasceu de um ato de vingança do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha, e quando ela mencionou o seu passado de luta pela democracia.

Lula acompanhou o desempenho de Dilma acomodado na galeria do plenário ao lado do compositor Chico Buarque, do ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil Marcelo Lavernére, de ex-ministros de Dilma e do presidente do PT, Rui Falcão. Uma liderança petista disse ao Valor que o ex-presidente foi aconselhado a não comparecer à sessão. Lula, porém, avaliou que deveria aparecer ao lado de Dilma até o fim, para manifestar solidariedade e não ser acusado de abandono da afilhada política.

Lula mal disfarçava a impaciência com as respostas excessivamente técnicas e prolongadas de Dilma aos senadores. No almoço, em uma ala reservada no gabinete da presidência do Senado, aconselhou a petista a "falar mais ao povo, aos brasileiros" e menos aos senadores. "Eu vou chegar lá", prometeu Dilma. Mais tarde, contudo, um senador petista lamentou ao Valor que Dilma insistia nas respostas técnicas. "Jogamos a bola pra ela rebater em tom político, mas ela não consegue."

Enquanto Dilma era indagada, seus aliados espalhavam que ela conseguira reverter votos. Lula saiu para fazer mais conversas. Ele deixou o Senado no meio da tarde e não retornou à noite.

Na sexta-feira, ele se reuniu reservadamente com o senador Edison Lobão (PMDB-MA). Senadores petistas alegavam que, apenas com o discurso, Dilma poderia conquistar os votos de Cristovam Buarque (PPS-DF) e Reguffe (sem partido-DF).

Mas uma liderança do PMDB disse ao Valor que não acredita que o discurso tenha revertido votos. "Dilma não tem condições políticas para voltar. Duvido que a maioria dos senadores contribua para retornamos ao clima de instabilidade política", avaliou. Ele elogiou, contudo, a disposição de Dilma de se defender pessoalmente. "Ela fez história, valorizou a biografia", avaliou.

Do lado pró-impeachment, a articulação também não foi interrompida. O presidente interino Michel Temer ligou para o senador Wellington Fagundes (PR-MT), que teve alta do hospital ontem. A aliados do pemedebista, Fagundes disse que vai votar no julgamento final e opinará pela destituição da petista. Mas "dilmistas" ainda tentam conseguir apoio do senador, que oficialmente ainda declara estar indeciso.

O Palácio do Planalto confia que terá os votos suficientes para destituir Dilma. De 58 a 60 apoiadores do impeachment. O grupo de Temer assegura que os três votos do Maranhão continuarão contra Dilma, apesar das investidas petistas. Renan, segundo aliados, não deve mesmo votar.

Distante do Senado, Temer procurou uma liderança pemedebista preocupado com afirmações de Roberto Requião (PR) de que haveria um grupo de 30 senadores a favor do retorno de Dilma. Coube ao correligionário acalmar o presidente interino e garantir que o clima é pelo afastamento definitivo dela. Temer também quis saber da previsão de conclusão do processo. Ouviu que o resultado deve sair amanhã de manhã, o que viabilizaria a viagem dele para a reunião do G-20, na China.

Petistas alegam terem se aproximado dos 28 votos necessários para a volta de Dilma. Um deles seria Acir Gurgacz (PDT-RO), que já almoçou com Dilma e aliados neste mês. "Eu ficaria surpreso se ele não votar com a gente", comentou um articulador petista. Mas governistas seguem confiantes.

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