Correio braziliense, n. 19341, 09/05/2016. Política, p. 2

A barreira psicológica do impeachment

Com o afastamento de Dilma Rousseff praticamente definido, tropas se digladiam em torno dos 54 votos necessários para confirmar a saída da presidente. Governo e oposição avaliam que um placar dilatado na quarta-feira impulsionará a análise do processo de cassação

Por: Guilherme Waltenberg

 

A semana em que a abertura do processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff será votada no Senado — podendo impor o afastamento dela do cargo — começou com as tropas governistas e da oposição contando votos para o julgamento final da petista, que pode demorar até 180 dias. Hoje, o placar aponta 51 votos a favor da saída temporária da chefe do Executivo, 10 além do necessário. Caso a oposição conquiste mais três apoios, o resultado da quarta-feira representará o fim das esperanças da presidente de reverter o placar no julgamento final, marcado para o segundo semestre. A avaliação é partilhada tanto por petistas e aliados como pelas bancadas alinhadas ao vice-presidente Michel Temer.

 

Segundo cálculos de governistas, um placar que indique o total de votos necessários para o afastamento definitivo de Dilma — 54 ou dois terços do total de senadores — poderia afundar as esperanças de uma eventual vitória no futuro. Foi o que relatou o líder do governo na Casa, Humberto Costa (PT-PE), em entrevista ao Correio. “Se eles tiverem, agora, dois terços ou um pouco mais, isso é favorável a eles. Se eles tiverem algo perto de 58 votos, aí fica mais difícil puxar cinco ou seis do lado de lá. Mas, se eles não atingirem os 54, acho que tem um clima favorável para nós”, avaliou Costa.

Entre os votos não declarados ou considerados indecisos, está o do presidente da Comissão Especial do Impeachment, Raimundo Lira (PMDB-PB). O senador paraibano havia se declarado favorável ao afastamento temporário, mas voltou para o rol dos indecisos antes de assumir o cargo na comissão. “Quero assumir a Presidência da Comissão sem juízo de valor, para ter liberdade de conduzir o processo e respeitar o contraditório”, disse Lira à época. Agora, ele diz ter definido o voto, mas não abrirá a posição até a votação. “Já que eu me declarei isento para assumir a presidência e está muito próximo (da votação), estou resguardando esse voto”, disse. Até mesmo apoiadores do governo, no entanto, apostam que ele manterá a opinião já divulgada, aumentando para 52 os apoiadores declarados pelo afastamento.

 

Rito

Por isso, a tarefa da tropa governista é evitar que dois senadores de uma lista de nove (veja quadro) sigam o rumo do impeachment. Os indecisos são Benedito de Lira (PP-AL), Edison Lobão (PMDB-MA), Eunício Oliveira (PMDB-CE), Fernando Collor (PTC-AL), Otto Alencar (PSD-BA), Renan Calheiros (PMDB-AL), Roberto Rocha (PSB-MA) e Walter Pinheiro (Sem partido-BA).

A sessão em que o parecer pela abertura do processo de impeachment no Senado será votado terá início, provavelmente, às 10h. Pelas regras estabelecidas, cada senador terá direito a falar por 15 minutos. Os líderes terão cinco minutos para orientar a bancada. Assim, a votação demorará ao menos 20h. Segundo Lira, haverá uma reunião de líderes na segunda para definir se haverá alguma mudança ou restrição na regra estabelecida até agora. “Mas parece estar tudo certo”, disse.

A ideia é que não haja interrupção da sessão e que, dessa forma, ela entre na madrugada de quarta para quinta-feira, nos moldes das sessões da Câmara. “É a tendência atual”, reforçou o presidente da Comissão Especial. Uma vez votado, o resultado é enviado à presidente pelo Presidente do SenadoRenan Calheiros (PMDB-AL). “A partir daí, o afastamento será uma realidade”, prosseguiu Lira.

Um grupo de seis senadores mantém a estratégia de propor novas eleições em contraponto à proposta de impedimento da presidente Dilma Rousseff. Na última sexta-feira, como apelo final, eles lançaram um manifesto defendendo a medida. No texto, eles afirmam que ela é a única que poderia reunificar o país após os protestos que tomaram as ruas do país no início deste ano.

Entre os senadores, a maioria está contra a abertura do processo, como João Capiberibe (PSB-AP), Lídice da Mata (PSB-BA), Paulo Paim (PT-RS) e Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Cristovam Buarque (PPS-DF) é favorável e Walter Pinheiro (Sem partido-BA) figura como indeciso.

 

Em cima do muro

Confira os nove senadores que ainda não divulgaram como pretendem votar no afastamento de Dilma Rousseff da Presidência

 

Benedito de Lira (PP-AL)

Edison Lobão (PMDB-MA)

Eunício Oliveira (PMDB-CE)

Fernando Collor (PTC-AL)

Otto Alencar  (PSD-BA)

Raimundo Lira (PMDB-PB)

Renan Calheiros (PMDB-AL)

Roberto Rocha (PSB-MA)

Walter Pinheiro (Sem partido-BA)

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Estratégia pós-afastamento

Por: NAIRA TRINDADE

 

As vésperas de deixar o governo, a presidente Dilma Rousseff passa a apostar todas as fichas do jogo na possibilidade de um eventual governo de Michel Temer desandar com as pressões de movimentos sociais e com a abertura do processo de impeachment contra o vice na Câmara. Com a ajuda do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva — que pretende vir a Brasília todas as semanas até o julgamento do mérito do processo — Dilma articulará no Palácio da Alvorada para convencer os senadores a reverter o clima na Casa. Ao lado de Lula, ela deve viajar pelo país, na tentativa de convencer senadores a modificarem o voto.

Ela terá o suporte de cinco governadores do Norte e Nordeste: Rui Costa (Bahia), Camilo Santana (Ceará), Tião Viana (Acre), Flávio Dino (Maranhão) e Wellington Dias (Piauí). Na votação da admissibilidade do impedimento na Câmara, os governadores fizeram um intensivão para mudar a opinião de deputados das bancadas estaduais nos últimos instantes. Um dos deputados catequizados de última hora é o atual presidente da Câmara, Waldir Maranhão (PP-MA), que mudou o voto aos 45 minutos do segundo tempo. Aliado do presidente da Câmara afastado, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é Waldir que estará à frente da Casa nos próximos dias. Por isso, caberá a ele definir o andamento do processo de impedimento contra Temer.

Em Porto Alegre para a comemoração do Dia das Mães, Dilma Rousseff recebeu ontem a homenagem de cerca de 50 simpatizantes que se reuniam na frente do prédio dela. A petista tirou fotos, ganhou buquês de flores e desejou feliz Dia das Mães, mas não conversou com a imprensa. No ato deste domingo, os apoiadores de Dilma falaram palavras contrárias ao processo de impeachment e levaram cartazes com dizeres como “Fica, Querida”. Mais cedo, a presidente pedalou pela capital gaúcha.

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