Cunha estabelece rito para votação de impeachment

Raphael Di Cunto e Thiago Resende 

24/09/2015

Em documento encaminhado ontem aos partidos para responder à questão de ordem da oposição sobre a tramitação dos pedidos de impeachment, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), afirma que a possibilidade de responsabilizar o presidente da República por atos praticados no mandato anterior, mesmo que no exercício da função, é decisão do plenário da Casa.

"A indagação sobre a possibilidade de responsabilização do presidente da República reeleito por atos praticados no curso do primeiro mandato, no exercício das funções presidenciais, não se reduz a questão de procedimento ou interpretação da norma regimental", diz o pemedebista, em referência ao objetivo da questão de ordem, que é esclarecer pontos do regimento.

"Trata-se, de fato, do cerne da decisão do plenário, a partir do trabalho da comissão especial, no exercício do juízo de admissibilidade da denúncia. Não cabe, portanto, ao presidente da Câmara, em sede de questão de ordem, substituir-se às instâncias competentes para tomar essa decisão", completa Cunha.

Até agora, Cunha tem repetido que seu entendimento é que o presidente da República só pode ser responsabilizado por crimes cometidos no atual mandato. A oposição argumenta, porém, que, como a reeleição só foi permitida anos depois de promulgada a Constituição Federal, este artigo precisa ser reinterpretado para que os mandatos consecutivos sejam tratados como um só.

A resposta aos questionamentos da oposição, que será lida em plenário hoje, abre espaço para o presidente da Câmara deixar a decisão sobre se é possível processar a presidente Dilma Rousseff por atos do primeiro mandato para a comissão especial que analisa a admissibilidade do impeachment. Ou seja, esta avaliação só ocorreria depois de iniciado o processo contra a petista.

"Não cabe nem a ele nem à comissão especial se meter nesse assunto. É uma questão constitucional, já há manifestações da Procuradoria-Geral da República e de ministro do Supremo Tribunal Federal [STF] de que não cabe investigação por fatos anteriores ao mandato", diz o deputado Wadih Damous (PT-RJ), ex-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) do Rio. "Isso é artifício para pressionar o governo".

O pemedebista rebate que não houve mudança, apenas respondeu à questão de ordem e que se alguém discordar pode recorrer. "Minha posição não é predominante. O regimento é feito para que o plenário tenha sempre a última palavra. Não há como o presidente substituir o plenário", disse Cunha, que a partir da próxima semana começará a responder os pedidos de impeachment já protocolados. "Vou me ater especificamente aos pedidos."

Cabe ao presidente da Câmara decidir se há indícios concretos de crime praticados pelo presidente da República para dar início ao processo de afastamento, com a criação de comissão especial que emitirá parecer sobre os supostos crimes. O entendimento de que a avaliação sobre os fatos anteriores ao atual mandato será feita em etapa posterior pode levar à instalação de comissão pela provável rejeição das contas de Dilma de 2014 ou as "pedaladas fiscais".

O relatório precisa ser votado em plenário e aprovado por 342 deputados, de 512 possíveis, para que o presidente seja afastado do cargo e julgado pelo Senado Federal. Esta comissão, decidiu Cunha, será composta por 66 titulares e igual número de suplentes e os cargos de presidente e relator poderão ser disputados no voto, sem precisar seguir a regra de tamanho das bancadas.

Na resposta, de 18 páginas, o pemedebista determinou ainda prazo de cinco sessões para um deputado protocolar recurso contra a decisão do presidente da Câmara de rejeitar pedido de impeachment. A decisão sobre a abertura, então, passaria ao plenário, que poderia aprová-lo por maioria simples (de metade dos deputados presentes mais um).

A estratégia da oposição é, caso Cunha rejeite o pedido de impeachment do jurista Hélio Bicudo, um petista histórico, recorrer ao plenário. Segundo Cunha, não há prazo para votar em plenário o recurso que, a partir do momento em que for protocolado, ficará "sobre a mesa". Ou seja, estará na pauta das sessões e dependerá de apoio da maioria do plenário para ser votado - os contrários pode recorrer a requerimentos para adiar a votação ou retirar de pauta.

Valor econômico, v. 16 , n. 3848, 24/09/2015. Política, p. A9