Dilma quer discutir com Alckmin redução da maioridade penal

9 jun 2015

Catarina Alencastro, André de Souza, Flávio Ilha, Maria Lima, Isabel Braga e Cristiane Jungblut

Presidente vê no aceno do governador meio de barrar mudança radical da lei

- BRASÍLIA E PORTO ALEGRE- Contrário à redução da maioridade penal, o governo partiu ontem para a ofensiva, e a presidente Dilma Rousseff mandou dizer que deseja conversar sobre o tema com o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, do PSDB. Em entrevista ao GLOBO na semana passada, Alckmin — que é tido como um dos possíveis candidatos tucanos à Presidência em 2018 — propôs uma aliança entre seu partido e o PT para aprovar mudanças no Estatuto da Criança e do Adolescente ( ECA) e barrar a redução geral da maioridade. O governador prefere alterar o ECA, aumentando de três para oito anos o tempo máximo de internação para adolescentes que praticarem crimes hediondos.

Em entrevista ao jornal “O Estado de S. Paulo”, publicada ontem, Dilma se posicionou contra a redução da maioridade penal, mas defendeu medidas socioeducativas “prolongadas” para crimes hediondos, o que coincide com a posição de Alckmin. Ela voltou a defender o aumento da pena para adultos que aliciam menores para cometer crimes.

ENCONTRO PODE ACONTECER HOJE

Essa era a ideia original do governo como alternativa à proposta de emenda constitucional ( PEC) da redução da maioridade. Mas, diante do avanço da PEC no Congresso, o governo passou a admitir a elevação do tempo de internação. Na comissão especial que discute o tema, 21 dos 27 parlamentares são favoráveis à PEC, embora com algumas restrições: valeria apenas para os crimes mais graves, como os hediondos ou violentos, e os jovens encarcerados iriam para unidades separadas dos mais velhos.

Pela manhã, o ministro da Secretaria de Comunicação Social ( Secom), Edinho Silva, afirmou que Dilma quer conversar com Alckmin para construir uma proposta alternativa. Além de aumentar o tempo de internação, o governador quer separar os que completam 18 anos dos demais adolescentes internados. Segundo Edinho, a questão foi debatida na reunião de coordenação política com Dilma, da qual ele e mais 11 ministros participaram no Planalto.

— O governo da presidente Dilma quer dialogar com todas as agendas de interesse nacional, não interessa a liderança que a defenda, não interessa o partido que a defenda. E quer dialogar, sim, com o governador Geraldo Alckmin, que apresentou uma proposta ao país — disse Edinho.

Hoje Alckmin irá ao Planalto participar de um evento e poderá discutir a proposta com Dilma.

Ontem à tarde, mais dois ministros defenderam o diálogo com Alckmin para impedir a aprovação da PEC: José Eduardo Cardozo ( Justiça), em Brasília, e Pepe Vargas ( Secretaria de Direitos Humanos), em Porto Alegre. Ambos apresentaram argumentos parecidos: aumentar o tempo de internação não é a melhor proposta, mas é o possível diante da força dos defensores da redução da maioridade no Congresso. Pediram também a exclusão do tráfico de drogas da lista de crimes hediondos. Segundo Cardozo, é difícil diferenciar traficante de usuário. Vargas destacou que muitos menores são “cooptados” pelo tráfico e precisam de proteção do Estado para sair dessa condição.

— Nós achamos que é uma posição ( a proposta de Alckmin) menos nociva. Mas estamos aguardando esse debate no âmbito do Legislativo — disse Vargas.

— Tudo está aberto para diálogo. Há momentos em que você tem de buscar pactuações que apontem caminhos que tenham mais convergências, quando você tem em vista uma possibilidade desastrosa, que é essa questão da redução da maioridade — afirmou Cardozo.

O presidente da Câmara, Eduardo Cunha ( PMDB- RJ), quer votar a PEC ainda este mês. O relator na comissão especial, deputado Laerte Bessa ( PR- DF), deve apresentar seu relatório amanhã. Ambos são favoráveis à redução da maioridade penal e pretendem levar a proposta, caso aprovada, à consulta popular.

Alckmin também se reunirá com a bancada do PSDB e o presidente do partido, o senador Aécio Neves ( MG). Aécio vai defender que o PSDB concilie as propostas defendidas pelo governador de São Paulo, pelo senador Aloysio Nunes Ferreira e por ele próprio ( ver ao lado).

— Eu não busco aliança com o PT. Temos a nossa proposta, encampando a mudança do ECA e a PEC, que são complementares. Vou levá- la para fechar questão na bancada e votar contra as outras que propõem a redução linear da maioridade para 16 anos, para todos os crimes. Se amanhã outros partidos nos apoiarem, ótimo — disse Aécio.

O presidente do PSDB conversou ontem com Alckmin e com o ex- presidente Fernando Henrique Cardoso, e disse ter tido dos dois aval para o fechamento de questão no pacote com as três propostas. Na Câmara, a avaliação é que será difícil o entendimento entre as bancadas do PT e do PSDB. Boa parte dos deputados do PSDB tende a defender a redução da maioridade para crimes hediondos. Os petistas só admitem conversar sobre alterações no ECA. 

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Diálogo interessa aos dois lados

PAULO CELSO PEREIRA

Presidente cria ‘ ponte’, e governador se mostra como oposição ponderada

No momento em que o presidente da Câmara, Eduardo Cunha, mostrase decidido a pautar a redução da maioridade penal, o movimento da presidente Dilma Rousseff de apoiar a posição do governador Geraldo Alckmin surge como tentativa de evitar uma derrota dada como certa até por seus interlocutores mais próximos. A redução da maioridade penal, ao menos para alguns crimes, tem hoje amplo apoio no Congresso e também na sociedade.

Para Alckmin, a aproximação também tem efeitos positivos. Ainda que possa gerar incômodo em setores de seu partido, o governador ganha exposição nacional e se apresenta publicamente como uma voz “soft” da oposição. Historicamente visto por petistas como o nome mais conservador dos tucanos, o paulista tornou- se o interlocutor possível — após todas as pontes com Aécio Neves serem incineradas nos ataques da eleição passada.

Dilma tem na momentânea aliança com o paulista a oportunidade de evitar o cenário considerado trágico para o governo e o PT: a redução irrestrita para 16 anos. Para Alckmin, o acordo com Dilma lhe garante um espaço definido na oposição e na mídia. Em suma, um jogo de ganha- ganha. Mesmo que o Congresso os derrote.