DE ‘ VALE- VEREADOR’ A COMPRAS DO MÊS

2 jun 2015

ALESSANDRA DUARTE 

Mensalinhos nas cidades do país incluem cotas de remédio e mesada disfarçada de emenda

Nos estados e municípios, a corrupção entre Executivo e Legislativo também paga mesada. Guardados no cofre do prédio da prefeitura de Cassilândia, na tesouraria, papéis timbrados do governo municipal preenchidos a caneta, datados e assinados, indicavam: “Vale R$ 5.000. Retirei a quantia supra p/: Vereadores”. Às vezes, o valor anotado era maior, como em vales de R$ 9 mil em que o beneficiário era “Câmara”. Se no cofre havia alguns, na casa da tesoureira de Cassilândia — município do Mato Grosso do Sul com 21 mil habitantes — o Ministério Público encontrou muitas dezenas de “vales- vereador”. Os pagamentos do prefeito à Câmara Municipal em troca de apoio político, descobertos em 2007, são um dos casos de mensalinhos investigados país afora desde que o mensalão no Congresso veio à tona em 2005.

Em Cassilândia, prefeito e vice foram afastados em 2007. Assumiu o então presidente da Câmara — até se descobrir que ele também estava no esquema. A situação chegou a um ponto em que o juiz da comarca teve de virar prefeito temporariamente. Não havia mais ninguém antes dele, na linha de sucessão, que não estivesse envolvido na corrupção.

Alvo da chamada Operação Judas — pelo fato de a tesoureira, ao ser apanhada, ter entregado os outros participantes —, o esquema e todas as denúncias ligadas a ele resultaram em três ações penais e 11 civis públicas por improbidade.

— Do quase R$ 1 milhão desviado, parte ia para vereadores, mais de uma vez por mês. Eles chegaram a afirmar que a fonte do dinheiro eram presença em sessões extraordinárias da Câmara e diárias de viagem. Só que as sessões e viagens eram falsas. Já o Executivo dava como explicação para a saída do dinheiro a realização de licitações. Mas as notas fiscais também eram frias, de empresas participantes do esquema — conta Adriano Lobo, promotor de Justiça de Cassilândia.

Em outro município do MS, Santa Rita do Pardo, ação do MP apontou que, além de mesada, vereadores acertaram com a então prefeita, em 2006, um esquema de recebimento de cotas mensais de combustível, remédios em farmácias e compras em supermercado. Com pouco mais de sete mil moradores, Santa Rita do Pardo tem Índice de Desenvolvimento Humano ( IDH) de 0,642 — a cidade figurava, em 2013, no 3.254 º lugar num ranking com os cerca de 5,5 mil municípios brasileiros.

À Polícia Civil, a prefeita disse que estaria sendo extorquida e foi orientada a gravar as conversas. “Os réus ( vereadores) propuseram a aprovação de leis para falsa liberação de recursos à Saúde, contratação pelo município de falsa assessoria e prática de fraudes em licitações, para que fosse possível obter o dinheiro exigido”, diz trecho da condenação, em 2007, de 5 vereadores e um assessor jurídico da Câmara, por concussão e formação de quadrilha.

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DENÚNCIAS DE DESVIOS MILIONÁRIOS EM ESQUEMA EM SP

2 jun 2015

No Pará, no início do ano, outro suposto mensalinho foi denunciado, e de forma prosaica. Foram distribuídos, em vários pontos da cidade de Juruti, DVDs com uma gravação — supostamente de uma conversa entre o prefeito e vereadores acertando o pagamento de “vantagens indevidas” à Câmara, segundo o MP, que investiga a denúncia e pericia o áudio. Com 47 mil habitantes, Juruti tem IDH de 0,592 e domicílios urbanos com rendimento mediano per capita de R$ 260 mensais, segundo o IBGE.

Em Sorocaba ( SP), denúncia do MP mostrou que, em 2012, o então prefeito teria passado a pagar cotas à Câmara para que cada vereador distribuísse o dinheiro a uma entidade que lhe desse maior retorno eleitoral. As cotas estariam disfarçadas de emendas. Os que não quisessem participar tinham as emendas — as verdadeiras — rejeitadas, e o valor que seria daquele vereador era redistribuído entre os outros.

Segundo o promotor Orlando Bastos Filho, o prejuízo foi de quase R$ 10 milhões. Somado à multa para cada um dos 25 réus, dá R$ 509,5 milhões, valor da ação de improbidade, hoje na Vara de Fazenda de Sorocaba.

— É preciso haver atuação mais efetiva dos Tribunais de Contas estaduais, e mais transparência das prefeituras — diz o promotor Adriano Lobo. — O patrimônio público, nos órgãos de fiscalização e no Judiciário, deveria ser a prioridade. Não adianta falar em melhorar saúde e educação se a corrupção manda o dinheiro embora.