Valor econômico, v. 16, n. 3764, 27/05/2015. Política, p. A10

 

Déficit na balança de serviços entra no foco do governo

 

O governo parece ter finalmente acordado para a importância da correção dos rumos do comércio internacional de serviços para a melhoria das contas externas. O elevado e crescente saldo negativo do comércio de serviços é responsável por aproximadamente metade do déficit em conta corrente, que atingiu US$ 104,8 bilhões em 2014, o equivalente a 4,47% do Produto Interno Bruto (PIB), de acordo com o Banco Central (BC).

O déficit de serviços representou 46% do déficit em conta corrente do ano passado, segundo o BC. O percentual chegou a ser maior no início da década, beirando os 70%, e diminuiu não por um motivo animador, mas sim porque a balança comercial se deteriorou e passou a ter também influência importante no déficit em conta corrente.

Mas o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic) está disposto a mudar esse quadro e está aperfeiçoando as estatísticas a respeito do comércio internacional brasileiro de serviços, com o objetivo de reunir informações detalhadas para municiar o planejamento de ações na área e construir uma agenda para alavancar os negócios em conjunto com o setor privado.

O setor de serviços já representa cerca de 70% do PIB e 78% dos empregos formais, mas não tem uma importância proporcional no comércio internacional do país. Nos últimos seis anos, as exportações brasileiras de serviços mantiveram uma posição equivalente a 1,7% do PIB; e as importações cresceram um ponto, para 3,7%. Na balança externa do país, as exportações de serviços representam apenas 15% para 85% de bens; nas importações, os serviços pesam mais, 27,5%, com 72,5% para bens.

Ainda assim, há espaço a ocupar em um mercado crescente. Estimativas da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) indicam que o comércio de serviços diretos e indiretos representam entre 50% e 60% do valor total do comércio exterior entre os países desenvolvidos; e, segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC) a corrente de comércio de serviços no mundo gira em torno de US$ 9 trilhões.

A participação brasileira é acanhada, apesar do impacto nas contas externas. No ano passado, o fluxo de corrente do comércio exterior de serviços do Brasil foi de US$ 126,9 bilhões, 5% acima dos US$ 120,7 bilhões de 2013. As exportações de serviços cresceram 6,3% para US$ 39,8 bilhões, colocando o país na 31ª. posição no ranking mundial, liderado pelos Estados Unidos e Reino Unido. Já as importações aumentaram 4,6% para US$ 87 bilhões, com o Brasil na 17ª posição de uma lista também encabeçada pelos Estados Unidos, seguidos pela China.

O governo começou a se movimentar em julho de 2012, com o lançamento do Sistema Integrado de Comércio Exterior de Serviços, Intangíveis e Outras Operações que Produzam Variações no Patrimônio Líquido (Siscoserv), desenvolvido pelo Mdic em conjunto com a Secretaria da Receita Federal. É o equivalente para serviços ao Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex), lançado 20 anos antes. As informações recolhidas e sistematizadas foram divulgadas neste mês para municiar as discussões a respeito de como ampliar a competitividade do Brasil na área e devem compor também o Plano Nacional de Exportação, em elaboração pelo governo.

Nos dados de 2014 do BC se sobressaem entre as despesas da balança de serviços os crescentes gastos dos brasileiros com viagens ao exterior. Já no Siscoserv, o principal item na importação de serviços é o arrendamento mercantil ou locação de máquinas e equipamentos, com US$ 20,2 bilhões em 2014, principalmente para a cadeia de petróleo e gás, seguido pelo transporte aquaviário de cargas (US$ 5,4 bilhões) e pelo licenciamento de direitos autorais (US$ 3,6 bilhões). Já nas exportações se destacam os serviços gerenciais, de consultoria gerencial, relações públicas e comunicação social, com US$ 2,2 bilhões; e outros serviços profissionais, técnicos e gerenciais não classificados, com US$ 2,1 bilhões.

Neste ano, o déficit no setor de serviços deve arrefecer com a desaceleração econômica. Mas isso não é motivo para o projeto marcar passo. Se as fontes de despesas parecem bem detalhadas, as de receita precisam ser aperfeiçoadas, ainda mais porque será nessa frente que o governo terá que atuar mais. Um exemplo é a exportação de serviços de engenharia pelas empreiteiras brasileiras que operam no exterior, que ainda não foram devidamente contabilizadas.