Produtividade e poupança baixas comprometem o crescimento

 

A baixa produtividade do trabalhador brasileiro é um dos fatores graves apontados por especialistas a ameaçar a capacidade do Brasil de aproveitar o que resta de seu bônus demográfico. Esse foi um dos pontos destacados pelo economista Ricardo Paes de Barros em aula magna proferida no mês passado, no Insper (Instituto de Ensino e Pesquisa). Para aproveitar o bônus, é preciso dar à atual geração de jovens e adultos empregos de qualidade. Porém, a produtividade do trabalhador brasileiro está estagnada desde os anos 80, enquanto a de outros países cresce.

Até mesmo nações africanas, argumentou Paes de Barros, aumentam suas taxas de produtividade em ritmo superior. Para Naércio Menezes Filho, do Insper e da USP, o problema da falta de produtividade no Brasil é estrutural, e não se resolve apenas com educação de mais qualidade.

— É um problema que tem a ver com fatores institucionais, como a taxa de inovação das empresas e o clima para negócios. Nos EUA, as empresas estão sempre inovando para sobreviver devido à concorrência. No Brasil, estamos muito atrasados em termos de práticas gerenciais e no investimento em pesquisa e desenvolvimento. Somos uma economia ainda muito fechada. As grandes firmas estabelecidas ficam acomodadas, e as pequenas não conseguem se expandir — diz Menezes.

Ele destaca ainda que, devido à alta rotatividade do emprego, as empresas investem pouco na capacitação de seus funcionários, dificultando que trabalhadores ganhem mais experiência na função e fiquem mais produtivos.

— A situação no futuro não é boa. Era para estarmos com a produtividade aumentando muito, porque o trabalhador mais jovem terá que sustentar uma população mais envelhecida. Não é o que está acontecendo — alerta o economista.

O Brasil ainda terá um desafio adicional em relação aos países que já fizeram a transição de uma população mais jovem para uma mais envelhecida: por aqui, esse processo acontece de forma muito mais rápida.Esta população cada vez mais envelhecida demandará mais recursos, principalmente para sua aposentadoria e sua saúde. O bônus demográfico pelo qual o Brasil passa no momento, porém, poderia ser aproveitado para transformar este futuro problema em solução. É o que os demógrafos chamam de segundo dividendo demográfico.

POUCO INCENTIVO PARA POUPAR

Ricardo dias Brito, também do Insper, é um dos brasileiros que têm estudado este fenômeno. Num cenário ideal, ele explica que, ao perceberem que viverão por mais tempo, as pessoas se conscientizam de que precisarão de uma poupança maior para manter seu padrão de vida. Se conseguirem fazer isso, ajudarão a formar um capital que será investido na economia, contribuindo para que a força de trabalho fique mais produtiva.

 O aproveitamento desse segundo dividendo depende do arranjo institucional vigente. Se houver incentivo à poupança, as pessoas acumularão capital para o futuro, e haverá um estoque permanente. Em caso contrário, não existirá esse segundo bônus — diz Brito.

Em estudo recentemente finalizado em parceria com Paulo Minari, Brito destaca que o problema do Brasil é justamente este. Considerando as regras atuais do Regime Geral de Previdência Social, eles estimam que, atualmente, “mais de 95% da população não necessitam poupar durante a vida ativa, pois desfrutarão de um aumento da renda ‘livre’ per capita na aposentadoria. Ou seja, surpreendentemente, uma baixa taxa de poupança voluntária é a reação correta da perspectiva do brasileiro médio que planeja um consumo estável, crente na manutenção do arranjo previdenciário vigente.

No estudo, Brito e Minari mostram que a taxa de reposição (o quanto a aposentadoria corresponde ao salário na ativa) é bastante alta no Brasil em comparação com países desenvolvidos. Aqui, em média, um trabalhador se aposenta com rendimentos que equivalem a 70% do que ganhava na ativa. Nos países membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), essa taxa é de 42%.

O problema, argumentam os autores, é que essas altas taxas de reposição são inviáveis num cenário de crescimento acelerado da população idosa.

— Se você sabe que conseguirá se aposentar com 70% de sua renda atual, qual incentivo têm para poupar? Por causa da estagnação econômica, não colhemos devidamente o primeiro bônus demográfico. Mas estamos deixando de colher o segundo também por causa do nosso arranjo previdenciário, que não incentiva a poupança.

VANTAGEM DO SETOR PÚBLICO

Brito explica que parte dessa alta taxa de reposição no país é explicada pelas aposentadorias do setor público. Outra parte se deve ao fato de a renda média do brasileiro ser menor em relação a nações desenvolvidas. Em alguns casos, admite ele, não faz sentido falar em poupança se a pessoa trabalha para sobreviver.

Também causam impacto nessa conta os benefícios pagos mesmo a quem nunca contribuiu para o sistema, caso dos trabalhadores rurais ou idosos de baixa renda contemplados pelo Benefício de Prestação Continuada. Esses são programas que têm papel relevante no alívio da miséria, mas que também correm risco num cenário em que haverá cada vez menos população adulta para sustentar um número crescente de idosos.