A morte de Peterson Ricardo de Oliveira, 14 anos, após ter sido agredido na escola em que estudava por ser filho adotivo de um casal homoafetivo, evidencia a homofobia nas instituições e as falhas do sistema educacional em lidar com questões de gênero e de orientação sexual. O adolescente morreu na segunda-feira, após ser internado no dia 5 com parada cardiorrespiratória no Hospital Regional de Ferraz de Vasconcelos, na Grande São Paulo.

Apesar de existirem iniciativas pontuais de conscientização tanto de alunos quanto de educadores, não há políticas públicas efetivas para coibir a homofobia e a violência de gênero. Em 2011, o projeto Escola sem Homofobia, feito em parceria com o Ministério da Educação e conhecido como “kit gay”, perdeu força após críticas e pressão de bancadas religiosas no Congresso. A iniciativa foi suspensa pela presidente Dilma Rousseff naquele ano.

Atualmente, o projeto atende a demandas específicas, quando pedidos por escolas, explica Guilhermina Cunha Aires, vice-presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) e integrante do Escola sem Homofobia. Ela afirma que, na maioria das vezes, as agressões são negadas por professores e diretores. “Mais de 90% da violência que acontece na escola não é noticiada”, diz. Em relatório publicado em 2012, a entidade detectou que diversos professores não se sentiam preparados para lidar com essas questões e temiam que as famílias se opusessem à discussão desses temas no ambiente escolar.

Tais barreiras fazem com que a história de Peterson não seja rara. Em 2014, foram registradas 1.013 denúncias de homofobia pelo Disque 100. São Paulo é o estado com maior número de casos. Foram 150, o equivalente a 24,68% do total no país. Rio de Janeiro e Minas Gerais aparecem em seguida, com 7,60% e 7,21% das denúncias, respectivamente.

Para a deputada Erika Kokay (PT-DF), é preciso retomar e ampliar com urgência o combate à homofobia nas escolas. “O Estado tem que se posicionar. Não pode encarar isso com naturalidade”, afirma. Ela alerta que projetos em tramitação no Legislativo, como o Estatuto da Família, recentemente desarquivado, reforçam o “discurso homofóbio e preparam terreno para violências como essa”. Na avaliação da parlamentar, ao instituir um modelo único de família, se discrimina outros arranjos, estimulando o preconceito.

Investigações
De acordo com a Secretaria de Segurança do Estado de São Paulo, o caso está sendo investigado e “nenhuma hipótese está descartada”, afirmou o delegado Eduardo Boigues Queroz, titular da Delegacia de Homicídios de Itaquaquecetuba. A Secretaria de Educação de São Paulo lamentou a morte e disse estar disponível para contribuir com a apuração. No boletim médico divulgado no dia seguinte à internação, consta que Peterson sofreu uma hemorragia cerebral, mas que não apresentava “sinais externos de violência física”, como hematomas, por exemplo. Ele permaneceu internado em estado gravíssimo de saúde até morrer, no início da tarde de segunda-feira.

Thales Coimba, advogado do Centro de Combate à Homofobia (CCH) de São Paulo, alerta que as vítimas devem procurar um órgão de proteção de direitos humanos da população LGBT para que o contato com a escola seja feito de forma preparada. “Muitas vezes, as pessoas fazem a denúncia no colégio só verbalmente, não tem registro e ninguém toma providências”, explica. As queixas podem ser feitas anonimamente pelo Disque 100, 24 horas por dia. Os casos são encaminhados às autoridades locais competentes.