Concorrente da gasolina C nos tanques dos carros flex fuel que rodam no país, o etanol hidratado tende a tornar essa disputa ainda mais acirrada em 2015. O aumento dos preços do combustível fóssil desde 1º de fevereiro começou a provocar uma reação perceptível por parte dos motoristas, que já recorrem mais ao biocombustível para "completar" o tanque de seus veículos.

O mercado estima que, até o fim de março, o "market share" do hidratado no Estado de São Paulo, maior consumidor de combustíveis do país, deverá atingir 50%, ante os 41% estimados para 2014. O recorde histórico foi em 2009, quando o etanol representou 56% do mercado do Ciclo Otto (que inclui gasolina e hidratado).

Ainda não há ainda dados oficiais sobre essa divisão no mês de fevereiro. Mas, conforme Luciano Libório, diretor de abastecimento e regulamentação do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de Combustíveis (Sindicom), a volta da incidência da Cide sobre a gasolina – que significou um acréscimo de R$ 0,22 por litro no preço na refinaria – já provocou uma migração da demanda para o hidratado. "A percepção é que ela ocorreu, mas ainda não fechamos os números".

Ainda que o etanol também tenha ficado mais caro ao consumidor final na esteira da alta da gasolina, o impacto dos reajustes do derivado fóssil falou mais alto ao consumidor, dizem especialistas. Nos postos de combustíveis de São Paulo, o preço médio do litro da gasolina C, que estava em R$ 2,908 em meados de janeiro (antes do anúncio da volta da Cide) ficou em R$ 3,177 entre 1º e 7 de março, segundo pesquisa da ANP. Um aumento, portanto, de R$ 0,27 por litro. Mas a ANP identificou o teto de R$ 3,499 em alguns postos.

Nas estimativas da comercializadora de etanol SCA Trading, no mês de fevereiro esse deslocamento de demanda causada pela alta da gasolina significou de 4 a 5 pontos percentuais de "market share" a favor do etanol – o que significa um aumento de consumo mensal de 260 milhões a 300 milhões de litros, considerando como base o consumo de etanol registrado em janeiro deste ano em todo o país, que foi de 1,251 bilhão de litros, segundo a ANP.

Responsável por 60% da demanda nacional por etanol hidratado, o Estado de São Paulo deverá liderar, mais uma vez, o avanço do etanol sobre a gasolina. Após o recorde de 2009, a participação do biocombustível no mercado paulista declinou até 2012, quando chegou a 36%. Desde então vem esboçando alguma recuperação. Em 2013, subiu para 39%, e em 2014 bateu em 41%, nas contas do diretor da trading de etanol Bioagência, Tarcilo Rodrigues.

"Em janeiro, esse percentual já foi a 45% em São Paulo. Em fevereiro ou março, essa participação vai a 50%", estima o especialista.

Em linhas gerais, o consumidor opta por abastecer com etanol hidratado quando seu preço equivale, nos postos, a menos de 70% do preço da gasolina. Esse parâmetro, atualmente o mais aceito pelo mercado, foi estabelecido com base na eficiência energética do biocombustível, que é equivalente a 70% do desempenho do concorrente fóssil.

Nos últimos 12 meses, essa vantagem deu o tom em quatro Estados brasileiros – além de São Paulo, em Goiás, Mato Grosso e Paraná. Deverá fazer parte do grupo o Estado de Minas Gerais, onde entra em vigor neste mês a redução da alíquota de ICMS do etanol hidratado de 19% para 14%, além da elevação da alíquota da gasolina de 27% para 29%.

"Com o diferencial tributário de 15 pontos, o consumo de hidratado no Estado tem potencial para dobrar dos atuais 750 milhões de litros para 1,5 bilhão de litros por ano", calcula o presidente do Sindicato das Indústrias Sucroenergéticas de Minas, Mário Campos.

Em 2014, o mercado de combustíveis do Ciclo Otto cresceu 7,7%. O mercado estima que, mesmo com a desaceleração da economia brasileira em 2015, a demanda por esses combustíveis vá aumentar ao menos 4% neste ano. "A previsão é que a frota flex cresça 8%. Menos que em 2014, mas ainda um aumento expressivo. Assim, se o etanol tiver a mesma paridade com a gasolina que teve em 2014, o mercado será 8% maior", diz o sócio da consultoria FG Agro, Willian Hernandes.

A velocidade do repasse da queda dos preços na usina ao consumidor final também pesará na conta. "Os preços na usina em São Paulo caíram de R$ 1,30 para R$ 1,210 por litro. Se esse recuo tivesse sido repassado ao consumidor final, a paridade com a gasolina, atualmente em 66%, seria de 61%, o que potencialmente poderia dobrar o consumo do biocombustível", afirma Hernandes.