O senador Eduardo Braga (PMDB-AM) assume uma das cadeiras mais espinhosas da Esplanada dos Ministérios com a promessa de retomar o diálogo com a iniciativa privada e ligar imediatamente um cronômetro: o novo ministro de Minas e Energia pretende ter, em três meses, um diagnóstico completo da teia de problemas que aflige o setor elétrico. Ele planeja visitar, uma a uma, as principais obras de grandes usinas e linhas de transmissão para entender os motivos de tantos descumprimentos de cronograma. As hidrelétricas de Belo Monte, no Pará, e do rio Madeira, em Rondônia, estão na lista. Graduado em engenharia elétrica e ex-governador do Amazonas, Braga quer saber nos detalhes o que tem motivado a cascata de atrasos na entrada em operação dos empreendimentos, como questões ligadas à área ambiental ou à própria engenharia financeira dos projetos. "Não quero especular nada. O plano é identificar os problemas e apresentar propostas de solução em 90 dias. Vamos visitar in loco vários sistemas para poder entender os gargalos", disse. Os atrasos são constatados nos próprios boletins de fiscalização da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Cerca de 25% dos 10.126 megawatts (MW) que estavam previstos em janeiro para entrar em operação, ao longo de 2014, não se concretizaram. Disposto a acalmar os ânimos dos empresários, que reclamam da falta de diálogo com o governo, Braga estende a mão e promete agendar reuniões com as associações setoriais já nos próximos dias. "Creio que o diálogo e a construção de um ambiente confiável no setor são imprescindíveis para enfrentarmos os desafios. Quero tê-los como aliados para encontrar soluções inteligentes, racionais e econômicas para os problemas que precisamos vencer", afirma o ministro. Mesmo sem ter conversado ainda com o colega da Fazenda, Joaquim Levy, ele enfatiza o conceito de aplicar um choque de realidade nas tarifas. "O subsídio não pode ser aleatório", diz. Apesar disso, Braga saiu em defesa da presidente Dilma Rousseff, que fez valer suas convicções ao editar a MP 579, medida provisória responsável por renovar antecipadamente as concessões de geração e transmissão - e objeto de forte polêmica. "Encaro com bastante correção o que a presidenta fez.", diz Braga. Não podíamos continuar carregando na tarifa o ônus de pagar por investimentos já amortizados. O que houve foram reações de segmentos e Estados, além de uma questão climática, que atrapalhou e fez com que a transição fosse mais pesada." Logo de cara, no início de sua gestão, Braga precisará enfrentar respingos da MP 579. Até julho, a União retomará usinas que somam quase 5 mil megawatts de capacidade instalada e não tiveram suas concessões prorrogadas, por opção dos atuais controladores. A retomada das concessões pode suavizar um pouco os reajustes das contas de luz, ao despejar energia barata no sistema, mas ainda depende do resultado de contestações judiciais. No primeiro semestre, o ministro terá que se debruçar sobre a renovação das concessões de 44 distribuidoras. O segmento ficou de fora do pacote anunciado em 2012 e o modelo ainda não está fechado. "Teremos que discutir com clareza essas questões e fazer tudo de forma transparente." Outro ponto sensível é o projeto de lei que trata do novo código de mineração. Enviado há um ano e meio ao Congresso Nacional, a reforma da lei atual - em vigênciaespecial criada para discutir o assunto. O texto do relator, deputado reeleito Leonardo Quintão (PMDB-MG), contraria pontos básicos da proposta original. Entre as mudanças está a fixação em lei da alíquota dos royalties minerais e a prioridade dada, na exploração das reservas, por empresas que fizeram os trabalhos de pesquisa nas jazidas. "O código de mineração terá que ser atualizado", frisa Braga, lembrando que o projeto atual só não foi aprovado por causa da decisão, tomada pelo Palácio do Planalto, de retirar o pedido de urgência na tramitação. "Acabou dando certo", reconhece o ministro, ao apontar a queda nas cotações das commodities metálicas como um ponto de reflexão. A tonelada do minério de ferro, que começou o ano passado acima de US$ 130, recuou para menos de US$ 70. Antes de estimular avanços na tramitação do código, na Câmara dos Deputados, o governo fará uma revisão geral do texto. "Há uma nova conjuntura e precisamos promover uma atualização do marco regulatório." Braga ainda não anunciou quem será o secretário-executivo do ministério, cargo de muita importância nos últimos anos, nem o segundo escalão da pasta. "Não tenho dificuldade para trabalhar com ninguém", afirma o ministro, conhecido pelos assessores por valorizar as equipes que encontra em atividade, sem descartar a permanência de Márcio Zimmermann, atual secretárioexecutivo.

 

Leilões de concessões vão testar autonomia de Barbosa

 

Escolhido pela presidente Dilma Rousseff como o novo "maestro" do programa de concessões em infraestrutura, o economista Nelson Barbosa terá rapidamente uma prova de fogo para testar sua verdadeira autonomia no assunto. Ao assumir o Ministério do Planejamento, que tem como principal foco questões orçamentárias, Barbosa ganhou de "brinde" a tarefa de capitanear a continuidade dos leilões de rodovias, ferrovias, portos e aeroportos. A dúvida no entorno do próprio ministro é se suas decisões vão seguir diretamente para o crivo presidencial ou se ainda farão uma escala na Casa Civil - como quase tudo no governo - antes de entrar no gabinete da presidente. Uma resposta pode ser dada logo nas primeiras semanas do ano. Depois de uma pausa nos leilões, o governo precisará tomar uma série de decisões para dar sequência ao programa. Até o fim de janeiro ficam prontos os estudos de mais quatro lotes de concessão de rodovias federais, que somam 2,6 mil quilômetros de extensão. Essa foi a área em que os leilões mais avançaram no primeiro mandato de Dilma. No caso dos novos trechos, conforme o Valor apurou com as empresas responsáveis pelos estudos, o alto volume de investimentos necessários e a menor demanda de veículos dificultam muito a viabilidade de uma concessão "pura". Para manter as tarifas de pedágio em níveis minimamente aceitáveis, seria necessário fazer aportes anuais do Tesouro Nacional às futuras concessionárias, por meio de parcerias público-privadas (PPPs). Desde 2004, quando aprovou uma nova lei para esse tipo de parceria, o governo nunca usou as PPPs em projetos de relevância. Estrear ou não o mecanismo nem será o dilema mais complicado. O governo terá de decidir se lança novos editais de concessão em um momento no qual grande parte das figurinhas carimbadas nos últimos leilões enfrenta investigações no âmbito da Operação Lava-Jato. De toda a lista de grupos que entraram nas disputas mais recentes, só um punhado não teve seus controladores envolvidos em suspeitas de propina nos contratos com a Petrobras: Ecorodovias, Triunfo, Arteris e Consórcio Planalto - que reúne um "pool" de pequenas empreiteiras e faturou a BR-050, entre Goiás e Minas Gerais. Para piorar: a TJLP, que serviu de base para até 70% dos financiamentos às concessionárias, está em alta. Com isso, fica mais difícil baratear as tarifas de pedágio sem abrir mão da atratividade dos novos projetos, o que vinha sendo garantido até agora pela fartura de crédito subsidiado do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). "Nada autoriza previsões otimistas para 2015 nessa área", lamenta um executivo de uma das gigantes nacionais da infraestrutura. Discretamente, ele torce para que o chefe da Casa Civil, Aloizio Mercadante, não dê pitacos nas concessões. "Se houver uma queda de braço entre os dois, o Mercadante tem amparo político para falar mais alto do que o Nelson Barbosa. E a visão dele sobre o capital privado é bem mais contaminada", avalia esse executivo. Entre os colegas de Esplanada dos Ministérios, em vez de ciúme pelas novas funções de Barbosa, a torcida pelo fortalecimento do economista é grande. Para um ministro da área de infraestrutura que deixa o cargo no segundo mandato de Dilma, o programa de concessões ficou "órfão" desde a saída da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR) da Casa Civil. Gleisi coordenava pessoalmente todo o trabalho dos ministérios setoriais - como Transportes, Aviação Civil e Portos - que lidavam com as concessões. "O Mercadante nunca chamou uma reunião para tratar disso", observa esse ministro, que deposita confiança na autonomia de Barbosa para reavivar o programa. Além das decisões sobre o futuro das rodovias federais, uma sucessão de pendências coloca a continuidade dos leilões em xeque. Na área de portos, o Tribunal de Contas da União (TCU) trava há mais de um ano as licitações de novos contratos de arrendamento dos terminais localizados em Santos (SP) e no Pará. Sem clareza sobre quando - e se - haverá aprovação do tribunal, algumas pessoas já defendem no governo a elaboração de um "plano B" para destravar essas licitações. Em ferrovias, depois de exaustivas conversas com investidores para conter o receio do "risco Valec" nas novas concessões, surgiu um candidato firme a entrar na disputa pela Ferrovia de Integração do Centro-Oeste (Fico) - o projeto mais avançado até agora. A espanhola OHL já deu sinais concretos de que entraria no certame caso o edital seja publicado. O cenário mais tranquilo está nos aeroportos. Pelo menos três terminais já têm preferência da área técnica para uma eventual transferência à iniciativa privada: Salvador, Manaus e Porto Alegre. A questão é se, com as grandes empreiteiras em evidência, este seria o melhor momento para preparar os novos leilões.