O Brasil atingiu o pleno emprego, uma situação na qual a desocupação é tão baixa que faltam profissionais no mercado para desempenhar funções básicas. Porém, o que deveria ser motivo de comemoração acabou descortinando um problema antigo e ainda sem solução: a baixa produtividade do trabalhador brasileiro, sobretudo no setor de serviços, que mais gera emprego no país. Isso porque, com a falta de mão de obra, as empresas precisam gastar mais e aumentar salários, sem, com isso, ganhar em produção, perdendo competitividade no mercado. Para especialistas, o baixo nível da educação oferecida no Brasil está por trás desse quadro desolador.

Ontem, durante o seu discurso de posse, Dilma Rousseff procurou mostrar disposição em encarar o desafio de ajustar a educação às necessidades de melhorar a qualidade da mão de obra. Sob o novo lema para o segundo mandato, “Pátria educadora”, a presidente prometeu que a educação será “a prioridade das prioridades”. É uma tarefa espinhosa, considerando que 54% dos alunos pobres entre 13 e 16 anos mostram evidente atraso escolar.

Segundo a presidente, o seu novo mandato será marcado pela aplicação de expressivos recursos dos royalties do petróleo e do fundo social do pré-sal no setor educacional, com os quais será possível universalizar, até 2016, o acesso à pré-escola de todas as crianças de 4 e 5 anos. A necessidade de investir mais evidencia, contudo, problemas de gestão no setor, considerando que o Brasil destina 6,1% do Produto Interno Bruto (PIB), maior que a média dos países da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), de 5,6%.

Dilma prometeu também mudanças curriculares e reforço na formação dos professores, “uma área frágil no nosso sistema educacional”. A presidente citou ainda alvos como o programa de ensino técnico Pronatec, que podem “contribuir ainda mais para o aumento da competitividade da economia”, e o Ciência Sem Fronteiras, programa que oferece bolsas em universidades no exterior. 

Estudos do Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Ipea) aponta que, até os anos 1980, os índices de produtividade do país cresceram relativamente rápido em função de uma mudança estrutural da economia, com a migração da população para as cidades e o aumento de trabalhadores na indústria e nos serviços — setores cuja produtividade costuma ser maior que a do setor rural. Ao longo de 1992 a 2007, contudo, a produtividade teve um crescimento de apenas 11,3%, conforme pesquisa do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da Fundação Getulio Vargas (FGV). Desde então, só desacelera.

Fernando de Holanda Barbosa Filho, professor do Ibre, explica que medir a produtividade só é possível a partir do resíduo. Ou seja, quando um mesmo processo, utilizando as mesmas ferramentas e o mesmo capital humano, dá um resultado maior do que o anterior, esse ganho foi de produtividade. “Mas isso só é possível com qualificação, quando o profissional usa melhores técnicas para fazer o seu trabalho. Infelizmente, nossa produtividade é muito pequena, sobretudo, em serviços, pela baixa escolaridade dos profissionais”, atesta.

Escolaridade também não significa qualidade na educação. Os índices que monitoram a qualidade de ensino não mostram grandes evoluções. Pelo contrário: há indicadores que apontam piora. Pouco mais de um terço dos colégios do Brasil (33,87%) tiveram nota inferior a 500 pontos na média de redação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2013. São 4,9 mil entre 14,7 mil instituições. Com a nota inferior a 500 na dissertação, elas são classificadas no nível baixo pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep).

A professora de português e escritora Lucília Garcez especula que um dos motivos do fraco desempenho dos jovens nas prova escrita seja a deficiência do ensino de redação. “O ensino da disciplina ainda é inadequado. O processo de escrita envolve releituras, reestruturações e revisões, pois ninguém entrega um texto sem ler. Esse é o processo normal de escrita, mas nas escolas não é assim. Os professores mandam escrever, o aluno entrega a primeira versão, o texto é corrigido e fim”, critica.

Cada brasileiro lê, em média, quatro livros por ano. Tirando os livros didáticos, o número cai para um. Em países desenvolvidos, a média chega a 15. Segundo a ex-professora da Universidade de Brasília (UnB), isso prejudica fortemente o domínio do português. “Para dominar a língua, é preciso usá-la na fala, na leitura e na escrita. No quesito leitura, estamos mal, e é na leitura que se adquire o domínio da escrita”, observa.

A falta de estímulo também aparece. “Com raras exceções, os professores também não são leitores. A sociedade não é leitora e não gera um ambiente favorável. Para completar, os livros são caros e 75% dos brasileiros nunca entraram numa biblioteca. Somos um país novo, e a era da imagem chegou antes de o Brasil ter se tornado uma nação leitora. Tudo isso contribui para um baixo desempenho na redação.”

Mas não é só no português que os índices preocupam. Levantamento feito pela ONG Todos Pela Educação (TPE), com base na proficiência dos alunos nas avaliações da Prova Brasil e do Saeb realizadas em 2013, mostra que apenas 9,3% dos alunos do 3º ano do ensino médio aprenderam o considerado adequado em matemática, e 27,2% em português. Os números são inferiores aos de 2011, respectivamente 10,3% e 29,2%.

Evasão

Outro problema é a evasão de jovens. O TPE aponta que só 54,3% dos jovens brasileiros concluem o ensino médio até os 19 anos, idade considerada adequada. No fundamental, a conclusão até os 16 anos foi alcançada por 71,7% dos jovens. Os alvos definidos pelo movimento para 2013 eram de, respectivamente, 63,7% e 84%.

O Brasil atingiu a meta de 2007 a 2009, mas após esse período tem mostrado um crescimento tímido em ambos os indicadores, descolando-se gradualmente dos objetivos. Para especialistas, a taxa de conclusão do ensino fundamental vem apresentando crescimento, embora numa velocidade menor do que a necessária para alcançar a meta. Já a trajetória da taxa de conclusão do ensino médio assusta, uma vez que apresenta uma tendência de estagnação.

Para a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), grande parcela dos alunos de diferentes níveis educacionais apresenta deficiências de aprendizagem em disciplinas críticas, atestadas em pesquisas. “A proporção de jovens que se encontra no ensino médio na idade própria é mais que o dobro da existente em 1995, o que mostra expressivo avanço, mas é necessário evoluir mais”, orienta.

A entidade tem procurado sensibilizar o governo brasileiro sobre a necessidade de diversificar estruturas e expandir a oferta do ensino médio por meio de uso das tecnologias de comunicação e informação (TICs), valorização dos professores e formação de profissionais de educação competentes e atualizados.