A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) tem baixado resoluções que visam a facilitar o uso do canabidiol (CBD) por portadores de doenças cujo tratamento comprovadamente responde bem a essa substância, extraída da Cannabis sativa . Na quinta-feira, o órgão divulgou novas regras que reduzem a burocracia na importação desse derivado da maconha. A partir de agora, a documentação apresentada pelos pacientes (ou responsáveis) tem validade de um ano. Com isso, a cada nova compra exige-se apenas a receita médica; demais documentos probatórios (formulário específico e laudo médico) terão de ser mostrados somente na primeira importação.

Um avanço, sem dúvida - mas ainda um passo tímido diante das demandas que chegam à Anvisa. Até o início deste mês, a agência recebera formalmente 297 pedidos de importação. Desses, 238 tinham sido autorizados, 17 estavam na fila de espera para a liberação, aguardando o cumprimento de formalidades pelos compradores, e 34 permaneciam em análise técnica. O afrouxamento dos procedimentos para aquisição desse medicamento é um reconhecimento, ainda enviesado, da sua importância para fins terapêuticos, mas a sua comercialização a partir de critérios generalizados, em lugar da atual fórmula de estudo caso a caso, se mantém como objeto de fortes resistências em pelo menos dois fronts.

Um deles se prende a aspectos formais. O canabidiol é classificado pela Anvisa como de uso proscrito. Daí as dificuldades burocráticas para a importação, que depende de autorização especial do diretor da Anvisa - ou seja, mais da penada de um burocrata que de um diagnóstico médico. Menos mal que a agência admite que há estudos para mudar esse processo. Dessa forma, o CBD deixaria o índex de substâncias proscritas e passaria a ser comercializado sob controle especial, como os remédios de tarja preta, com receita médica obrigatória.

Outro deriva do preconceito. Mesmo o canabidiol sendo uma substância de valor terapêutico, o uso e a comercialização dessa substância, por ser extraída da maconha, são contaminados por um debate exógeno - o da descriminalização das drogas, também marcado no país por prejulgamentos que desfocam a realidade da questão. O CBD é adotado no tratamento de diversas patologias, entre elas a epilepsia (estudos também apontam sua eficácia em pacientes com mal de Parkinson). Não é alucinógeno e tampouco causa dependência. Proibir seu emprego terapêutico equivale a proscrever a morfina, só porque o potente analgésico provém do mesmo bulbo da papoula de onde saem o ópio e a heroína.

É positiva, portanto, a decisão da Anvisa de simplificar o controle do CBD. Desburocratiza-se o processo, tira-se sua aplicação terapêutica da órbita equivocada da criminalização das drogas e confere-se ao uso da substância - condicionado a formalidades judiciais ou policiais - aspectos meramente médicos, como deve ser.