Título: Félix desmente Jobim no Congresso
Autor: Quadros, Vasconcelo
Fonte: Gazeta Mercantil, 10/09/2008, Política, p. A7

Brasília, 10 de Setembro de 2008 - Os depoimentos prestados ontem na Comissão Mista de Controle de Atividades de Inteligência do Congresso pelo general Jorge Félix, ministro-chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) e pelo diretor afastado da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) deixaram o ministro da Defesa, Nelson Jobim, numa saia justa. Por elegância, os dois preferiram não dizer que o ministro mentiu ao apresentar ao presidente Lula a lista de equipamentos que culminou no afastamento de Lacerda, mas afirmaram com todas as letras que os aparelhos em poder da Abin não servem para fazer grampo telefônico ou espionar. O general Félix chegou a citar um parecer do Exército apontando que o equipamento, sem adaptações, funciona como um rastreador anti-grampo. "Quero afirmar aqui que a Abin não possui o equipamento de grampo ¿ disse o delegado Paulo Lacerda em depoimento na primeira reunião da Comissão Mista de Controle de Órgãos de Inteligência do Congresso para discutir o grampo. O delegado sustenta que o equipamento comprado pela Abin é o mesmo que está em poder do Exército, do Supremo Tribunal Federal (STF) e do próprio Senado. O líder do PSDB, Artur Virgílio, quis saber se Jobim então teria mentido ao presidente Lula. Lacerda sugeriu que o senador fizesse essa pergunta ao ministro, mas o líder tucano acabou se irritando. "Não sou seu preso. Não estou pendurado num pau de arara", reagiu o senador, criando um clima de falso embate na comissão. Polido, Lacerda pediu desculpas e explicou que saiu do tom em decorrência do estado de indignação a que se encontra desde que passou a ser apontado como suspeito de ter mandado grampear autoridades. Virgílio queria saber se o presidente se precipitou em afastar Lacerda. O delegado e o general Félix se recusaram, no entanto, a avaliar a conduta de Jobim ou a decisão de Lula, que classificaram como um ato político para dar liberdade e transparência às investigações. O senador Romeu Tuma (PTB-SP) sugeriu que o erro de Jobim pode ter se baseado num simples pedido e não numa compra consumada. Criada há nove anos para fiscalizar as atividades de inteligência, a comissão deu ontem uma demonstração de negligência. De todos os integrantes, apenas o deputado Laerte Bessa (PMDB-DF) soube explicar a função do aparelho que Jobim tratou como grampo. "O ministro não mentiu, apenas se enganou. É um rastreador que serve para detectar escutas em determinados locais", ensinou o parlamentar que, delegado da Polícia Civil do Distrito Federal, foi primeira autoridade a implantar na Divisão Anti-Seqüestro de Brasília o sistema de grampo. Os demais parlamentares nem sabiam que equipamentos de grampo são tão corriqueiros no mercado quanto a vasta rede de espiões que ganha a vida bisbilhotando congressistas. A comissão não chegou a nenhuma conclusão sobre a origem e autor do grampo nos telefones do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, e do senador Demóstenes Torres (DEM-GO). Lacerda e Félix explicaram que ainda é cedo para jogar a responsabilidade sobre a Abin e deixaram claro aos parlamentares que o único fato concreto mostrado até agora é que as duas autoridades foram ouvidas clandestinamente por algum araponga. "É cedo para tirar conclusões apenas porque alguém diz alguma coisa", alertou o general. Ele explicou que o araponga que prestou depoimento à Polícia Federal, Francisco Ambrósio do Nascimento ao contrário do noticiário, foi agente do Serviço Nacional de Informações (SNI) no regime militar, mas nem chegou a integrar os quadros da Abin, criada em 1998. O diretor da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa alertou que o debate sobre a espionagem não pode descambar para um processo de refluxo no combate à corrupção. "Se jogar (as instituições) na generalidade corre-se o risco de restringir a capacidade do Estado de investigar", disse o delegado. Momentos antes, o deputado Marcondes Gadelha (PSB-PB) havia exortado a comissão a assumir o controle das atividades de inteligência nos órgãos federais. (Gazeta Mercantil/Caderno A - Pág. 7)(Vasconcelo Quadros)