Título: Retomada do diálogo com UE
Autor: Roberto Teixeira da Costa
Fonte: Gazeta Mercantil, 23/09/2004, Opinião, p. A-3

A viabilização desse acordo pode fortalecer o Mercosul. A surpreendente visita do comissário Pascal Lamy da União Européia a Brasília foi sem dúvida fato auspicioso. A retomada de negociações para acordo comercial entre Mercosul e União Européia é importante sob mais diferentes aspectos.

Em primeiro lugar, são mais de cinco anos em que a possibilidade de transformar uma tratativa de maior abertura para facilitação de negociações em acordo comercial vem sendo perseguida. São muitas horas de trabalhos que corriam o risco de serem perdidas. Com a mudança de comando na União Européia ao final de outubro, todo esse acervo poderia não ser usado pelo sucessor de Pascal Lamy.

Em segundo, a viabilização desse acordo certamente fortalecerá o Mercosul, que, por razões amplamente conhecidas, passa por uma fase difícil devido às exigências argentinas no comércio bilateral com o Brasil. Não esquecer também que, recentemente, os jornais noticiaram que o Uruguai celebrou um acordo de investimentos com os EUA.

Em terceiro, caso essas negociações cheguem a bom termo poderão ter como conseqüência uma diferença de atitude dos Estados Unidos vis-à-vis Brasil nas negociações da Alca, que estão emperradas. Essa possibilidade será ainda maior caso George W. Bush seja reeleito (não é uma questão de preferência pessoal), pois John Kerry não tem dado indicações de que os democratas, de volta ao poder, e com forte apoio dos sindicatos, estariam dispostos a fazer concessões em temas de nosso interesse.

Finalmente, um acordo Mercosul-União Européia poderia trazer ganhos bastante expressivos na área do agronegócio. Segundo o ministro da Agricultura, o acordo poderá significar ganho anual superior a US$ 2 bilhões para o setor.

Logo, o destravamento das negociações, independentemente de aspectos anteriormente indicados, trará vantagens econômicas substanciais e poderá no futuro nos abrir oportunidades mais amplas de negociações para aumentar a participação no comércio internacional.

Não esquecer que, na visita que recentemente efetuou ao Brasil, o primeiro-ministro Junichiro Koizumi também expressou a possibilidade de ampliar os laços comerciais com o Japão, que vem perdendo sua posição na Ásia - no comércio com o Brasil - para a China.

É realista esperar que até 31/10 o acordo Mercosul-União Européia esteja assinado? Anteriormente, só estavam sendo discutidos os assuntos em pauta caso a caso, ou seja, por exemplo, na negociação para maior abertura do mercado europeu à carne brasileira, questionar o que receberia em troca na área de serviços e, na questão do açúcar, o que em termos de propriedade intelectual. Agora, as negociações serão pelo conjunto, não caso a caso.

Os coordenadores dos dois blocos sentaram-se à mesa para começar a configurar suas respectivas ofertas melhoradas, que serão apresentadas por e-mail, de maneira simultânea.

"Desta vez, os dois lados apresentarão oferta completa", explicou o secretário-executivo da Câmara de Comércio Exterior, Mário Mugnaini Jr.

De acordo com Mugnaini, a oferta do Mercosul será, na verdade, um conjunto do que já foi apresentado em negociações anteriores. "A diferença é que agora a proposta virá escrita e poderemos esclarecer melhor pontos específicos."

Essa disposição parece existir, embora haja dúvidas se, mesmo com boa vontade, haverá possibilidade de concluir as negociações até o final do mês de outubro. Certamente o esforço vale a pena e vamos torcer para que dê certo.

kicker: Agora, as negociações comerciais serão pelo conjunto, não caso a caso