Título: Começa o ano das ações de viúva
Autor: Filgueiras,Maria Luíza
Fonte: Gazeta Mercantil, 02/01/2009, Finanças, p. B1

São Paulo, 2 de Janeiro de 2009 - Este promete ser o ano das ações de viúva. Os investidores que não retiraram completamente suas aplicações da renda variável e continuam com um gostinho por risco em busca de maior retorno, caso dos gestores de fundos de ações, devem se voltar para papéis que rendem maiores dividendos e cuja atividade da companhia tem menor dependência de novos investimentos, com fluxo de caixa garantido. Justamente estas características renderam a esses papéis o apelido de ações de viúva - aquelas que ficam de herança, rendendo anos a fio.

Segundo a Economatica, 14 papéis da carteira teórica do Ibovespa apresentaram dividend yield (índice de retorno de dividendos sobre o preço da ação) ao final de 2008 superior a 6%, liderando as ações da Telemar, Transmissora Paulista e Eletropaulo.

"Aconselhamos aos investidores ir para as boas pagadoras de dividendos, o que também será a alternativa das gestoras", diz Clodoir Vieira, economista-chefe da corretora Souza Barros. Nesta lista, ele destaca AES Tietê, Bradesco, Redecard, Telesp e Tractebel. "As ações do Itaú também são boas opções para 2009, mas não pelos dividendos."

Para Vieira, os três primeiros meses do ano são decisivos para o ânimo do investidor. Até março, são publicados os balanços do quarto trimestre das companhias de capital aberto, e o prazo é considerado suficiente para o novo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, mostrar a que veio. "É um período decisivo para que a economia mundial mostre recuperação no segundo semestre", avalia.

A Souza Barros trabalha com três cenários para a bolsa brasileira ao final de 2009. No mais pessimista, o Ibovespa se manterá nos níveis atuais, em torno de 36 mil pontos. No cenário conservador, o índice encerra em 45 mil pontos e, no mais otimista, a 55 mil.

As corretoras estão mais cautelosas para traçar esse tipo de projeção, já que no ano de 2008 caíram por terra todas as estimativas traçadas por analistas no início do período. A Souza Barros, por exemplo, considerava o Ibovespa a 65 mil pontos em dezembro deste ano. A Ativa Corretora projeta o Ibovespa em 61 mil pontos ao final de 2009, também considerando uma melhoria no segundo semestre. "O mercado ficará ainda mais cauteloso no primeiro semestre, dado que os números de atividade econômica e emprego virão ainda mais fracos lá fora e aqui. Num cenário mais pessimista, em que a recuperação não acontece, trabalhamos com o Ibovespa em 55 mil pontos", diz Luciana Leocádio, chefe da área de análise da Ativa. Mesmo na projeção mais conservadora, representaria um ganho de 45% sobre o último pregão de 2008.

"Se os indicadores macroeconômicos vierem piores, o investidor foge da renda variável e, de forma geral, já aguarda uma definição melhor da profundidade da recessão na economia real. Por isso o segundo trimestre é crítico", completa a analista. Por isso ela também inclui nas recomendações ações defensivas, que são boas pagadoras de proventos e cujas empresas tem posição líquida de caixa e sem necessidade de financiamento no curto prazo. "São empresas menos relacionadas ao ciclo econômico, como o setor de telefonia, energia elétrica e, de alguma forma, alimentos e bancos também mantêm bom momento para investir em 2009."

Nesta lista, Andres Kikuchi, chefe da área de análise da Link Investimentos, inclui também as empresas de concessões rodoviárias. "Os setores que apresentam geração de caixa mais equilibrada e previsível farão a diferença em 2009", avalia. Por outro lado, mais surpresas negativas devem vir do setor de construção civil, mesmo já tendo registrado forte queda nas ações, e o setor petroquímico ainda deve mostrar resultados ruins com a queda nos pedidos."As ações relacionadas a commodities são as que mais sofreram em 2008 e continuarão assim em boa parte de 2009, com desequilíbrio de preço pela demanda e oferta, fruto inclusive da percepção de euforia anterior", afirma Kikuchi. "A demanda na bolsa ainda demora a se recuperar, principalmente o volume de pessoas físicas, que perderam muito com a desvalorização nos últimos meses do ano."

Matérias-primas

Felipe Casotti, gestor de renda variável da Máxima Asset, ressalta que o comportamento de demanda e preço das commodities é justamente um dos principais indicadores de recuperação ou não das economias do mundo. Ele lembra que, há três meses, alguns bancos e corretoras ainda projetavam uma nova ascensão do barril de petróleo a US$ 150 e hoje falam em US$ 30.

"A China está desacelerando em ritmo maior que o esperado, com o crescimento de 5,4% da produção industrial, quando a estimativa era de 7,5%. Pode mudar a dinâmica da economia", considera. "O mercado todo está de olho no pacote do Obama no início do ano, o que a equipe econômica está planejando, e como as montadoras vão se sair com as medidas de curto prazo."

O gestor avalia que ações de serviços são menos óbvias num momento de calmaria mas se destacam na crise, incluindo educação e telemarketing. "Não diria para fugir de commodities, mas acho que o preço ainda pode ser bem mais baixo que os patamar atual", ressalta. Para investidores mais arrojados e experientes, ainda trazem resultados no intraday - na última segunda-feira, por exemplo, a cotação do barril chegou a subir 8%.

Na opinião da analista da SLW Corretora, Kelly Trentin, novas medida do Federal Reserve (o Banco Central dos EUA) para adquirir mais títulos de agências hipotecárias e ativos de companhias de crédito para consumo deve contribuir para liquidez dos mercados. Todos os setores no País dependem deste cenário internacional, mas Kelly também avalia que energia elétrica, concessões rodoviárias, alimentos e bebidas compõem alternativa de investimento para este ano.

"Num curtíssimo prazo, mineração, setor automotivo e petrolífero sofrem com desaquecimento de consumo, mas apresentam preços atrativos numa perspectivas de recuperação econômica. Mas commodities entrariam num segundo momento, com a retomada mais forte das bolsas", diz. A corretora Spinelli inclui ainda na carteira de prioridades para o ano o setor de saneamento básico e varejo.(Gazeta Mercantil/Finanças & Mercados - Pág. 1)(Maria Luíza Filgueiras)