Título: Ações contra imprensa dividem ministros do TSE
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 19/06/2008, Política, p. A13

Os processos envolvendo acusações de favorecimento a candidatos pelos meios de comunicação serão julgados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) no limite da subjetividade. Primeiro porque os ministros reconhecem a liberdade de imprensa e não se cansam de fazer elogios a essa garantia da Constituição. Só que, por outro lado, a Lei das Eleições (nº 9.504) proíbe jornais e emissoras de fazer comentários favoráveis ou contrários aos candidatos. Assim, os ministros têm que verificar em cada caso se determinada reportagem emitiu ou não opinião, se fez ou não marketing pessoal do candidato.

Nas eleições de 2006, o TSE encarou o mesmo problema e dado o alto teor de subjetividade dos processos envolvendo a imprensa, o tribunal se dividiu em várias votações. O mesmo deve acontecer, agora, em que o TSE deve ser convocado para julgar condenações da Justiça Eleitoral de São Paulo à "Veja" e à "Folha de S.Paulo" pela publicação de entrevistas com a candidata à prefeitura paulistana, Marta Suplicy.

Numa votação polêmica, o TSE condenou a "CBN" a pagar R$ 20 mil por causa de um comentário do articulista Arnaldo Jabor feito entre o primeiro e o segundo turno das eleições de 2006. Após o primeiro debate para presidente, Jabor afirmou que Geraldo Alckmin simbolizava o "choque de capitalismo" enquanto Lula representaria um "socialismo deformado". "Houve uma avaliação ideológica de cada candidato, pintando de forma muito colorida um deles e denegrindo o outro", justificou, na época, o ministro Ari Pargendler. O então presidente do TSE, ministro Marco Aurélio Mello, disse ser "um defensor da liberdade de expressão", mas advertiu que "o comentarista extrapolou o âmbito da análise do debate para uma abordagem do aspecto ideológico dos candidatos" e também votou pela multa. Já os ministros Cesar Asfor Rocha e Carlos Ayres Britto entenderam que o caso deveria ser decidido pela Justiça comum, e não pela Eleitoral. Mas, foram vencidos e a "CBN" foi condenada por cinco votos a dois.

Em outro julgamento nas eleições de outubro de 2006, mais polêmica. O PT ingressou contra a revista "Veja" por causa de uma reportagem de capa sobre o suposto dossiê organizado por petistas contra a candidatura de José Serra ao governo paulista. Alguns ministros entenderam que a "Veja" estava engajada contra o PT e, portanto, merecia ser condenada a oferecer direito de resposta mas, a maioria entendeu que a revista colocou as acusações contra os petistas no tempo condicional e, portanto, não era possível presumir que a publicação estava contra o PT. "Não posso pressupor que esse ou aquele veículo de comunicação esteja engajado (contra uma candidatura)", declarou Mello. "Tudo foi colocado no modo condicional do verbo, sob forma de hipotetização", completou Ayres Britto. No fim, o direito de resposta foi negado por quatro votos a três.

Os casos envolvendo a imprensa costumam dividir o plenário justamente por serem subjetivos. Em 2006, o TSE condenou um outdoor da "Veja" que trazia a foto de Alckmin sob o título "O Desafiante". Ari Pargendler reconheceu que a revista usava outdoors todas as semanas para divulgar as suas capas, mas considerou que, no caso, a aparência daquele outdoor era de propaganda, "embora a finalidade seja a comercialização dos exemplares da revista". Novamente, o ministro Ayres Britto defendeu os meios de comunicação. Ele lembrou que a revista já havia estampado em sua capa o presidente Lula e, portanto, "tratou os dois candidatos isonomicamente".

Hoje presidente do TSE, Britto está mais cauteloso ao tratar do tema. Questionado se a imprensa pode publicar entrevistas exclusivas com candidatos durante a campanha, respondeu: "Depende do caso. É preciso ler a entrevista e fazer a aferição." Britto advertiu os jornalistas que eles devem evitar elogios e proselitismo em torno dos candidatos. O limite a que a imprensa pode chegar é não fazer marketing pessoal dos candidatos, explicou.

Mas, o presidente do TSE mantém a sua defesa enfática dos jornalistas. Foi ele que suspendeu todos os processos e as decisões judiciais dadas com base em dispositivos da Lei de Imprensa (nº 5.250, de 1967), em fevereiro, durante a avalanche de ações de fiéis da Igreja Universal do Reino de Deus contra a "Folha". Nas eleições de 2006, outro voto de Britto mostra bem a sua visão pró meios de comunicação. O TSE foi acionado pelo PT contra coluna do jornalista Clóvis Rossi que citava vários escândalos envolvendo o governo Lula. O título da coluna era "Pior que república bananeira" e num dos trechos o jornalista escreveu o seguinte: "Só em um país de seriedade zero, como o Brasil, o presidente da República pode continuar a pretender ser inocente quando os seus mais graduados assessores têm contas a prestar à polícia e à Justiça".

Britto entendeu que a ação sequer deveria ser recebida para julgamento porque, segundo ele, os jornais não são candidatos, partidos, nem coligações, e apenas retratam os debates. "A imprensa é a mais avançada sentinela das liberdades públicas, a mais natural representante da sociedade civil. E os jornalistas são os profissionais do comentário crítico, o desembaçado olho sobre o nosso cotidiano existencial e os mais recônditos recintos do Poder." O voto de Britto foi decisivo para livrar o jornal de ter que abrigar o direito de resposta. A "Folha" ganhou a causa por quatro votos a três.