Título: Aumenta debate sobre poupança externa
Autor: Lamucci , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 27/05/2008, Especial, p. A16

Com o déficit em conta corrente beirando os US$ 15 bilhões nos 12 meses até abril, ganha força o debate sobre a estratégia de crescimento com o auxílio da poupança externa. Crítico ferrenho dessa política, o ex-ministro Luiz Carlos Bresser Pereira diz que tentar crescer com rombo na conta corrente - que equivale à poupança externa - costuma resultar num desempenho econômico fraco: em vez de financiar investimento, o que aumenta é o consumo, e a expansão do Produto Interno Bruto (PIB) é decepcionante. "É um modo de se endividar crescendo muito pouco", diz ele, acrescentando que o saldo externo negativo pode também levar a uma crise de balanço de pagamentos. "Mas não deve acontecer nos próximos dois ou três anos", ressalva Bresser, ao lembrar que o Brasil tem quase US$ 200 bilhões de reservas.

O professor Samuel Pessôa, da Escola de Pós-Graduação em Economia (EPGE) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), tem uma visão menos negativa. Para ele, o déficit nas transações de bens, serviços e rendas do país com o exterior preocupa se for a contrapartida de uma piora das contas públicas - o que, segundo ele, não é o que ocorre atualmente. Ainda que os gastos públicos cresçam a um ritmo superior ao do PIB, o superávit primário (o resultado fiscal sem considerar despesas com juros) segue robusto. "Havendo equilíbrio fiscal, o saldo em conta corrente não deve ser objeto da política econômica."

Bresser vê o Brasil numa armadilha formada pelos juros altos, o câmbio valorizado e o ajuste fiscal frouxo. Para colocar fim a esse quadro, o ex-ministro defende uma mudança no mix da política econômica, que precisa envolver todo o governo e contar com apoio da sociedade: com uma política fiscal austera e redução forte dos juros, auxiliada por retenção de exportações de produtos primários e medidas para acabar com o que resta de indexação na economia, a taxa de câmbio se depreciaria, estimulando investimentos nos setores exportadores. Nesse cenário, a poupança doméstica se eleva, e o país pode crescer 9% a 10%, e não os atuais 5%, avalia Bresser.

Pessôa diz que a evidência empírica de fato mostra que países que poupam mais crescem a taxas mais elevadas. O problema, segundo ele, é como elevar a taxa de poupança do Brasil. Uma reforma da Previdência que induza a um aumento da poupança privada é um caminho, mas de pouca viabilidade política. A saída então é elevar a poupança do setor público, o que pode ser feito por meio de cortes de gastos ou elevações de impostos. "Nós somos uma economia estruturalmente de baixa poupança. É muito difícil que cresçamos a taxas chinesas poupando menos de 20% do PIB. A China poupa por volta de 45%." Pessôa diz, porém, que é possível crescer a taxas mais altas que as atuais, desde que o país também aprofunde "reformas microeconômicas e melhore o marco institucional para receber mais investimento externo".

A seguir, os principais trechos das duas entrevistas.