Título: Aracruz negocia retirada de madeira no ES
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Fonte: Valor Econômico, 30/08/2007, Brasil, p. A5

Executivos da Aracruz Celulose reuniram-se ontem com o ministro da Justiça, Tarso Genro, em Brasília, para discutir como pode ter segurança jurídica de que não irão ocorrer novas ampliações de áreas indígenas em suas terras. Na terça-feira, o ministro declarou uma área de 11 mil hectares da empresa no Espírito Santo como posse permanente dos índios tupiniquim e guarani. Foi a segunda ampliação da terra indígena, criada em 1982.

A Aracruz não terá direito a qualquer indenização pelas terras, Mas, na reunião com o ministro, a empresa começou a discutir como poderá ser indenizada pelas benfeitorias na área - e a plantação de eucalipto é considerada uma benfeitoria. Em vez de dinheiro, uma opção em negociação é a retirada da madeira. "Pretendemos negociar como pode ser feita essa retirada e como algumas outras benfeitorias, como barragens, serão protegidas", afirmou Carlos Alberto Roxo, diretor de sustentabilidade da Aracruz. Segundo ele, embora exista espaço para que a companhia de papel e celulose conteste judicialmente a decisão do governo, essa não é a opção da Aracruz. "Queremos encerrar essa disputa, colocar um ponto final."

Os índios, que pretendem se reunir com o ministro Genro nas próximas semanas, aceitam entregar a madeira, mas querem saber como a retirada será feita e por quanto tempo, segundo o cacique Sizenando, da aldeia Caieiras Velha. "Queremos também ouvir a empresa. Se a gente fosse contar tudo o que ela tirou de lá nos últimos 40 anos, o que está plantado não compensa. Mas queremos resolver isso na paz", disse o cacique. Segundo ele, na reserva recém-declarada (e que ainda não está demarcada e homologada), os índios já reconstruíram a aldeia Olho D'Água, onde irão morar seis famílias, e a Areal, para sete famílias. Os índios tupiniquins e guaranis reivindicavam a área há 25 anos.

Dos 11 mil hectares, a Aracruz é proprietária de 98% e outros quatro fazendeiros, dos 2% restantes. Da área total, 66% está plantada com eucaliptos - cerca de 6,8% da área total plantada pela Aracruz no Estado do Espírito Santo. Embora a companhia informe que, no curto prazo, a transferência das terras para os índios não afetará a fábrica de celulose de Barra do Riacho (ES), a plantação de eucalipto daquela área era estratégica para a companhia porque estava perto da unidade de produção - o custo, portanto, era menor.

O presidente da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa), Horácio Lafer Piva, reagiu ontem com indignação à decisão do Ministério da Justiça. "Esse tipo de atitude induz a outras de igual calibre. Todo mundo se sente mais motivado a esticar a corda", disse Piva, ressaltando que alguns movimentos, ao perceber que as empresas não estão mais cedendo a chantagens, têm partido para pressionar o governo. "Esse tipo de atitude não atende ao interesse de ninguém. Só interessa aos concorrentes nos outros países."

Embora outras empresas do setor de papel e celulose tenham sofrido algum tipo de ameaça de invasão de sem-terra ou de disputas com quilombolas, a Aracruz acabou se tornando um ícone dos ataques, como admitiu Piva. "Para os movimentos sociais, é importante fazer um pouco de marketing do ativismo. E o nome da Aracruz é identificado no exterior rapidamente", afirmou. A preocupação com a imagem no exterior é um dos motivos, inclusive, que têm levado a Aracruz a insistir na explicação de que a empresa não expulsou índios de suas terras e que comprou legitimamente as áreas.

Além dos índios, a Aracruz enfrenta problemas com os quilombolas, descendentes de antigos escravos, que já chegaram a invadir suas terras. No Espírito Santo, essas comunidades pleiteiam uma área de 17 mil hectares da companhia. Em todo o Brasil, comunidades quilombolas já formalizaram processos reivindicando um total de 20 milhões de hectares - área equivalente ao Estado do Paraná.

No caso dos quilombolas, a disputa fundiária não está restrita à Aracruz. Afeta agricultores, outras empresas de celulose, como a Celulose Iguaçu e até a Marinha (um grupo requer a ilha de Marambaia, no Rio). O decreto do presidente Lula que determina a desapropriação de terras para comunidades quilombolas é de 2003 e, segundo Piva, da Bracelpa, sua constitucionalidade está sendo questionada no Supremo Tribunal Federal (STF). "Também estamos conversando com parlamentares no Congresso", diz.

Assim como a Aracruz, a Vale do Rio Doce tem enfrentado disputas com índios e quilombolas, embora nenhuma questão seja fundiária e, sim relativa a compensações.