Título: Mais conhecimento pode reduzir déficit
Autor: Mattos, Adriana
Fonte: Valor Econômico, 17/04/2007, Caderno Especial, p. F2

Conhecimento. Eis o que falta para que o Brasil supere os entraves que têm levado a repetidos déficits na balança comercial com a China, desde outubro do ano passado. "A principal dificuldade no relacionamento entre os dois países é o grande desconhecimento que o Brasil, principalmente sua comunidade empresarial, tem em relação à China. Isso é uma barreira muito grande. Para aumentar suas exportações, os empresários brasileiros precisam conhecer o mercado chinês e as características culturais desse mercado e do próprio país", avalia Rodrigo Tavares Maciel, secretário-executivo do Conselho Empresarial Brasil-China.

Não é que o atual cenário de déficit comercial do Brasil em relação à China vá se manter durante o ano todo, indica Maciel. É uma trajetória que sofre influências conjunturais de alguns produtos básicos, como soja e minério de ferro, que, junto com o petróleo, responde por 74% das exportações brasileiras para a China.

"O saldo final não vai ser de superávit comercial, como nos anos anteriores, mas também não será de déficit", afirma Maciel. Contudo, urge providências para expandir a pauta de produtos a serem exportados. Só assim esse quadro será alterado. "O Brasil precisa entender como funciona o mercado chinês como um todo e partir agressivamente para identificar na pauta de importações da China onde pode apresentar mercadorias alternativas que possam ser adquiridas pelos chineses".

É um desafio e tanto. A pauta de importações globais da China gira em torno de US$ 800 bilhões, mas apenas 0,9% corresponde às vendas brasileiras para aquele país. A maior parte é de commodities, como soja, minério de ferro e petróleo. E a questão toda se resume em um único passo, de acordo com o executivo: o Brasil precisa fazer o caminho inverso do realizado pelos chineses há cinco anos.

"A China veio ao Brasil, em 2002, comprar produtos brasileiros, mas também procurou conhecer nosso mercado, buscou explorar as características do nosso mercado. O comércio bilateral entre Brasil e China cresceu a partir de 2002, quando foram exportados US$ 2,5 bilhões e importados US$ 1,5 bilhão. Em 2006, as exportações brasileiras para a China atingiram US$ 8,3 bilhões e as importações chegaram a US$ 7,9 bilhões. Ou seja, houve um salto comercial gigantesco em apenas quatro anos", relata Maciel, que trabalhou no escritório Lehman, Lee & Xu em Pequim, a capital chinesa.

A China tornou-se o terceiro maior parceiro comercial do Brasil, ficando atrás somente dos Estados Unidos e da Argentina, mas os chineses passaram a demonstrar novas pretensões a partir de 2005, quando suas exportações para o Brasil começaram, também, a crescer - e de forma acelerada. Em 2006, enquanto as exportações brasileiras cresceram 22,9%, as importações aumentaram 49,2%. "Não é que as exportações brasileiras diminuíram, mas o fato é que as importações à China aumentaram mais rapidamente", observa o secretário-executivo da entidade.

Para superar esses novos obstáculos, conforme Maciel, o Brasil deve buscar novas alternativas para sua pauta de exportações à China, como apontou o estudo "Produtos manufaturados com potencial de incremento nas exportações para a China", realizado pelo Conselho Empresarial Brasil-China, sob coordenação do Banco Itaú BBA. Maciel conhece bem as características do mercado chinês, segundo conta. Foi advogado responsável pela área China e coordenador regional da área de comércio internacional do escritório Veirano Advogados, e participou da elaboração do estudo, junto com representantes do Bradesco, Bolsa de Mercadorias & Futuro, Companhia Vale do Rio Doce, Embraco, Pinheiro Neto Advogados, Tozzini, Freire, Teixeira e Silva Advogados e Trench, Rossi e Watanabe Advogados.

"O estudo identificou 100 produtos com potencial de incremento nas exportações para a China. São produtos químicos, plásticos, borracha e seus derivados, máquinas, aparelhos e instrumentos mecânicos, veículos automotores e material para transporte ferroviário, em que o Brasil é altamente competitivo no mercado internacional", informa ele. O estudo não é exaustivo, nem um receituário de soluções para acesso ao mercado chinês, adverte ele. Mas mostra que a China não é apenas uma importadora de commodities (em 2005, em sua pauta de importações, pelo menos US$ 137 bilhões foram de maquinário).

Há, portanto, um enorme potencial exportador de produtos alternativos brasileiro, dependendo de um maior conhecimento do empresariado e de sua capacidade produtiva para alavancar as vendas para a China. Mas, além de maior conhecimento sobre o mercado chinês para superar as barreiras encontradas e concretizar o potencial exportador das manufaturas brasileiras para a China, faltam também, de acordo com Maciel, experiência e cultura exportadora das pequenas e médias empresas brasileiras.

"Incrementar os negócios com os chineses não pode ser um projeto eventual, tem que ser algo mais consistente", explicita. "A China tem um mercado culturalmente muito diferente do brasileiro, e os empresários locais precisam fazer um esforço para adaptarem seus produtos ao mercado chinês, elaborar manuais e documentação técnica. É necessário investir, se levantar da cadeira", insiste.

O governo brasileiro também pode fazer sua parte, de acordo com Maciel. Por exemplo: deveria fomentar mais a competitividade da indústria, desonerar impostos e diminuir os problemas de burocracia - como os que impediram a concretização da joint-venture entre a Bao Steel, empresa do setor siderúrgico chinesa e a Companhia Vale do Rio Doce, no Maranhão. Por outro lado, os empresários brasileiros não precisam temer uma possível opção dos chineses pelos países africanos. "Até agora, a África tem sido um grande fornecedor de matérias-primas para a China, em troca de investimentos de infra-estrutura, o que não é nosso caminho", observa Maciel.