Título: Avon, enxuta, investe em marketing para crescer
Autor: D'Ambrosio, Daniela
Fonte: Valor Econômico, 08/03/2007, Empresas, p. B1

O ano de 2005 foi duro para a Avon e as dificuldades mundiais reverberaram no Brasil, onde a marca centenária enfrenta um dos seus mais fortes concorrentes locais. A multinacional assistiu a um avanço importante da Natura, que a ultrapassou em volume de vendas. Se a situação estava difícil do lado de fora, dentro, o clima também não era de comemorações. No total, 200 pessoas, a maioria na área administrativa, foram demitidas no Brasil em meio a um amplo processo de reestruturação global que simplificou e reduziu em mais de sete os níveis hierárquicos da companhia.

A subsidiária brasileira da multinacional americana, porém, começou 2006 em uma situação diferente. Alcançou a cifra de US$ 1 bilhão em faturamento líquido e desbancou o México na vice-liderança das operações mundiais. Hoje, só perde para a matriz, nos Estados Unidos, que conta com o histórico e a tradição de uma empresa que nasceu em 1886.

Os números no Brasil são superlativos. O centro de Distribuição de Osasco é o maior de todas as unidades espalhadas pelo mundo. Também é no Brasil que a empresa reúne o maior exército de revendedoras do globo: 1 milhão de consultoras - e são consultoras ativas, que fazem pedidos regulares. Pela venda direta, a marca chega até comunidades do Pantanal e da Amazônia, onde é preciso caminhar quilômetros para se comprar um simples sabonete ou um batom.

Para um executivo do setor, a Avon começa, agora, a correr atrás do prejuízo. "Boa parte do que a Natura cresceu nos últimos cinco anos foi em cima da Avon", diz. Em 2003, a brasileira faturava R$ 1,9 bilhão. No ano passado, fechou com um faturamento bruto de R$ 3,89 bilhões.

Um deslize da Natura na estratégia do Natal do ano passado, que acabou por fazer seu lucro recuar pela primeira vez desde que estreou em bolsa, já foi interpretado por alguns analistas como uma janela de oportunidade para a Avon. A equação se inverteu. As vendas da empresa americana cresceram 30% no último trimestre. "Os avanços da Avon parecem estar vindo, pelo menos parcialmente, às custas da Natura", afirmam os analistas Robert Ford e Melissa Byun, em relatório da Merrill Lynch. A própria Natura reconheceu a Avon como uma forte competidora.

Criada como uma marca de produtos de beleza de preço justo e amiga da família, a Avon, nos últimos anos, acabou ficando para trás. Apesar de fortes investimentos em tecnologia, a gigante americana sofreu um desgaste e amargou o envelhecimento da marca, enquanto outras grifes, como Natura e O Boticário, conseguiram vender uma imagem mais jovial e moderna. Só os novos laboratórios da Avon consumiram mais de US$ 100 milhões.

A saída estratégica da Avon, que começou a ser implantada no ano passado, foi reforçar o investimento em marketing. Segundo o presidente da empresa no Brasil, Luis Felipe Miranda, no ano passado, o gasto nessa área cresceu 67%, a maior evolução dos últimos cinco anos. "Foram consumidos cerca de R$ 60 milhões", diz Miranda, um venezuelano nascido no Peru e que está no Brasil desde 2005.

Só o Avon Alternative, produto que combina tecnologia com ingredientes naturais, recebeu uma verba de R$ 21 milhões, o maior já investido pela empresa em um único produto. O Brasil foi um dos campeões de vendas, com mais de 3 milhões de unidades vendidas.

"Vamos investir cada vez mais no fortalecimento da marca", diz Miranda, sem falar nos números de 2007. A Avon tem escolhido celebridades locais, como a cantora Ivete Sangalo e as globais Daniela Escobar e Flávia Alessandra, para ajudar a promover as vendas.

Embora tenha lançado alguns produtos mais premium e aspiracionais, como perfumes, a Avon tem a certeza que deve continuar mirando nas classes C e D, onde sempre teve uma forte participação e de onde tirou a sua grandiosidade no Brasil. A companhia não só continua como marca de massa, como recentemente reforçou esse conceito. Acaba de lançar um produto antiidade, cujos preços na concorrência começam em R$ 45, por menos da metade do preço. O seu Ageless Results custa R$ 18,90 e é anunciado em horário nobre na televisão com o preço. "Quem não podia acessar esse mercado porque os produtos são caros, vai poder testar agora", diz Miranda.

Mas o temporário enfraquecimento da Avon no Brasil tem também um outro motivo. A Avon não admite claramente, mas fontes próximas à companhia afirmam que o Brasil ajudou a financiar a construção de uma nova fábrica na China. "Foram cinco anos drenando investimentos para lá, mas agora que acabou a empresa vai se tornar mais agressiva e recuperar o mercado perdido", diz a fonte.

Com o corte da gordura, a Avon ganhou eficiência. O modelo de gestão mais simples, porém mais ligado à poderosa Andrea Jung mudou o dia-a-dia da corporação. O próprio presidente Miranda, que antes tinha quatro intermediários até a CEO mundial, agora só se reporta ao executivo da América Latina e, então, à Andrea. "Encontro a CEO com muito mais frequência agora", afirma Miranda. Dentro da companhia, depois de passadas as demissões, os funcionários aplaudiram a estrutura menos burocrática.

A disputa entre Natura e Avon ainda deve ter muitos capítulos. Não só porque ambas tendem a reagir com mais rapidez e firmeza, como também pelo fato de o casamento entre vendas diretas e produtos de beleza ser duradouro e muito feliz. Isoladamente, são dois mercados que crescem acima de dois dígito, muito acima da economia brasileira.

O mercado de perfumaria, higiene e cosméticos registrou uma alta de 14% em faturamento em 2006, alcançando a cifra de R$ 17,53 bilhões. Segundo dados preliminares do Euromonitor, ultrapassou a França e já é o terceiro maior do mundo. A venda direta é um dos principais canais na venda desses produtos e não pára de crescer. De acordo com dados da Associação Brasileira da Indústria de Higiene, Perfumaria e Cosméticos (Abihpec), a perfumaria cresceu 15,5% em todos os canais e apenas na venda direta a alta foi de 21,63%. Do total do faturamento obtido com as vendas de perfume no Brasil, 75% vem desse canal. Na área de cosméticos, a venda porta a porta já representa 38,9% dos negócios e o canal teve alta de 21,4% em 2006. No segmento de higiene pessoal, que inclui a venda de xampus e sabonetes com vendas concentradas em supermercados, a penetração da venda direta ainda é baixa, de 11,2%. Mas evolui mais rápido do que nos demais canais. Em 2006, cresceu 12%, contra uma média geral de 10,5%. "A venda direta é muito importante no nosso setor", afirma João Carlos Basílio da Silva, presidente da Abihpec.

O setor de vendas diretas movimentou R$ 14,5 bilhões no ano passado, 18% acima do ano anterior. Em volume, o crescimento foi de 14,3%, totalizando 1,2 bilhão de unidades. O crescimento real foi de 14,3%, muito acima do varejo tradicional, que fechou o ano com expansão de 6,2% segundo o IBGE.