Título: Finanças em dia favorece reeleição de governadores
Autor: Felício, César
Fonte: Valor Econômico, 29/09/2006, Política, p. A12

O bom desempenho financeiro da maioria dos atuais governos estaduais pode ser a mais forte explicação para a onda de reeleições que deve marcar a disputa deste ano. Dos vinte governadores eleitos em 2002 que concorrem a novo mandato este ano, nada menos que dezessete lideravam a última pesquisa de opinião disponível. Permanecem em segundo lugar apenas Alcides Rodrigues (PP) de Goiás, Lúcio Alcântara (PSDB) do Ceará e Maria de Lourdes Abadia (PSDB) do Distrito Federal . Na eleição de 1998, quando todos os governadores estavam juridicamente desimpedidos para concorrer a um novo mandato, 21 tentaram a reeleição e quinze conseguiram. Na eleição de 2002, quinze concorreram e nove foram reeleitos.

A safra dos governadores eleita em 1994 enfrentou a renegociação das dívidas estaduais e a estabilização da moeda. Até o fim do quadriênio, 25 dos 27 governadores assinaram a renegociação. "Antes do acordo das dívidas, os governadores podiam administrar o seu fluxo de caixa e ainda emitiam títulos para se financiar. O fim da inflação e a obrigação de remeterem 13% da receita líquida real liquidaram estas possibilidades", comenta o economista Amir Khair, ex-secretário municipal de Finanças em São Paulo.

Como alternativa para investir, os governadores de então lançaram mão de privatizações impopulares. Entre 1995 e 1998, as receitas de capital dos Estados , decorrente da venda de ativos ou de operações de crédito, teve um crescimento onze vezes superior a da arrecadação do ICMS: 294% ante 26,1%. O resultado político foi a derrota de governadores em estados populosos, como Rio Grande do Sul, Pernambuco, Minas Gerais e Santa Catarina.

Os eleitos no período seguinte tiveram que se ajustar à lei de responsabilidade fiscal (LRF), que entrou em vigor em fevereiro de 2000. Os administradores atuais assumiram máquinas relativamente ajustadas e tiveram maior folga para administrar. A relação dívida consolidada líquida/receita , o principal indicador da LRFmelhorou em 21 dos 27 Estados no período de 2001 a 2005.

"No caso de São Paulo, o ajuste foi todo feito no governo de Mário Covas e o governo seguinte, de Geraldo Alckmin, manteve a situação. Mas nos outros casos, a melhora financeira está centrada na administração financeira dos governadores atuais", afirma o economista Raul Velloso, especialista em contas públicas.

Velloso cita dois casos bem sucedidos: Minas Gerais e Rio de Janeiro. No primeiro, o governador Aécio Neves (PSDB) deve se reeleger no primeiro turno com a maior votação proporcional do Brasil. No segundo, o candidato situacionista, Sérgio Cabral Filho (PMDB), deve enfrentar um segundo turno contra Denise Frossard (PPS) ou Marcelo Crivella (PRB), mas em primeiro lugar.

"No caso do Rio, houve uma saída criativa do ex-governador Anthony Garotinho ao antecipar royalties do petróleo como receita, enquadrando o Estado dentro dos limites legais", comenta Velloso. Já no caso de Minas, de acordo com o economista, houve sucesso em se ampliar a receita e a despesa, ainda que a relação dívida/receita permaneça elevada: entre 2001 e 2005, caiu de 2,34 para 2,03.

O economista aponta problemas financeiros em dois Estados onde os governadores que concorrem à reeleição deverão enfrentar um segundo turno: Rio Grande do Sul e Pernambuco. No caso gaúcho, o governador Germano Rigotto teve seu governo prejudicado pela crise que afeta o agronegócio exportador, "mas decepcionou um pouco ao não investir em um ajuste pelo lado da despesa", opina. Rigotto é um dos raros governadores que disputam segundo mandato abaixo da faixa de 30% de intenção de voto. Deve disputar segundo turno contra Olivio Dutra (PT) ou Teda Crusius (PSDB). A relação dívida/receita gaúcha passou de 2,51 para 2,58 entre 2001 e 2005.

Em Pernambuco, Mendonça Filho (PFL) era vice e herdou o mandato de Jarbas Vasconcelos, que renunciou para disputar o Senado e teve sucesso ao reduzir a relação dívida/receita de 1,10 para 0,83. Mas deve ter um duro segundo turno pela frente contra Humberto Costa (PT) ou Eduardo Campos (PSB). "Lá não souberam manter a receita em ritmo ascendente depois de usados os recursos da privatização da empresa elétrica do Estado", disse Velloso.

Os próprios economistas admitem, contudo, que a situação financeira dos Estados está longe de ser a explicação única para a reeleição de 90% dos governadores que concorrem a mais quatro anos. "O favoritismo de Lula na eleição presidencial gera uma satisfação difusa no eleitorado com os administradores em geral. A população tem dificuldade em diferenciar o que é responsabilidade do governo federal e o que é o do governo estadual. Os próprios governadores às vezes incentivam esta confusão", disse Khair.

As pesquisas divulgadas esta semana mostram que a chance de segundo turno aumentou na reta final. Pelos resultados disponíveis, haveria segundo turno em cinco Estados: Rio de Janeiro, Alagoas, Goiás, Pernambuco e Rio Grande do Sul. Há dez dias, apenas os dois últimos realizariam uma segunda rodada. Existe uma situação indefinida em relação a um segundo turno no Paraná, Sergipe, Paraíba e Tocantins. Ainda assim, é a disputa entre candidatos a governador menos competitiva desde que o instituto da reeleição foi introduzido. Em 1998, o segundo turno ocorreu em onze estados. Em 2002, em quinze.

A evolução dos candidatos na reta final de campanha reforçou a tendência de continuidade. Em Sergipe, um dos raros governadores em desvantagem nas pesquisas, João Alves (PFL) está hoje em empate técnico , com um ponto percentual de vantagem. contra Marcelo Deda (PT). Em Alagoas, o candidato situacionista, o senador Teotônio Vilella Filho (PSDB), está agora um ponto percentual a frente de João Lyra (PTB). Candidatos que representam a oposição em termos locais só estão na dianteira em Goiás, Maranhão, Distrito Federal e Mato Grosso do Sul. Ainda assim, o conceito de renovação só pode ser usado em termos relativos. No Maranhão, a candidata pefelista Roseana Sarney está rompida com o governador José Reinaldo Tavares, mas ambos pertenciam ao grupo político do ex-presidente e senador José Sarney (PMDB-AP) até 2004. No Distrito Federal, o pefelista José Roberto Arruda , que venceria no primeiro turno, nunca fez oposição ao grupo político do ex-governador Joaquim Roriz, eleito em 2002.