Título: Algodão deve retomar parte da área perdida
Autor: Scaramuzzo, Mônica
Fonte: Valor Econômico, 23/06/2006, Agronegócios, p. B12

Às vésperas do início da colheita de algodão no Mato Grosso, maior Estado produtor do país, os cotonicultores brasileiros já começam a traçar seus planos para o plantio da próxima safra. E os primeiros sinais indicam uma recuperação da ordem de 10% da área plantada em 2006/07, depois do tombo de quase 30% em 2005/06, quando o algodão cobriu 845,3 mil hectares em todo o Brasil.

Segundo analistas, entidades de classe, produtores e técnicos ouvidos pelo Valor, a provável retomada reflete as perspectivas de melhores preços e exportações mais aquecidas no ano que vem. Os produtores deverão investir na expansão apostando na atual tendência de alta de preços e nas exportações já comprometidas para 2007.

Outro fator fundamental é que, segundo cálculos da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), a pluma apresenta, hoje, rentabilidade superior à da soja. Sobretudo no Centro-Oeste, muitos produtores com áreas de algodão têm também lavouras de soja, o que facilita a migração de uma cultura para a outra - apesar dos custos de produção da pluma serem três vezes maiores que os do grão.

João Luiz Pessa, presidente da Associação dos Produtores de Algodão do Mato Grosso (Ampa), concorda que a rentabilidade está mais atraente e está entre os que acreditam no crescimento de 10% da área plantada no país em 2006/07, em um movimento de recuperação de parte das terras perdidas para a soja. Segundo ele, há movimentos concretos nesse sentido, e o principal deles é que 300 mil toneladas da pluma para entrega em 2007 já estão comprometidas com clientes no exterior. Em 2006, os embarques de algodão deverão totalizar 392 mil toneladas, de acordo com a Conab.

O presidente da Ampa admite que a migração da soja para o algodão não será maior porque os custos com insumos subiriam muito. "Quem sai do algodão para a soja pode reduzir os gastos com adubos e defensivos O movimento inverso sai mais caro".

Dados da Conab mostram que, neste momento, a rentabilidade do algodão no Mato Grosso chega a 38%, enquanto a da soja fica em 6,5%. O cálculo leva em conta um custo de produção de R$ 3.230 por hectare no caso do algodão, com produtividade média de 3.660 quilos por hectare e preço da arroba a R$ 44 no mercado mato-grossense. Para a soja, o desembolso alcança R$ 940 por hectare, com produtividade média de 50 sacas e preço da saca a R$ 20. "Se levarmos em conta os custos totais [incluindo depreciação de maquinários e terras], a rentabilidade do algodão cai para 18% e a da soja fica negativa em 18%", diz Djalma de Aquino, técnico da Conab.

"Quem ficou na atividade [algodão] está um pouco mais capitalizado. Mas as poucas linhas para financiamento, o alto endividamento e o câmbio não dão espaço para grandes investimentos em expansão", ressalva Christopher Barry Ward, produtor de algodão e soja em Rondonópolis (MT). Nos últimos cinco anos, Ward reduziu em 5 mil hectares sua área com algodão e soja. "Me desfiz das áreas que eu tinha arrendado nesses últimos anos e tenho mantido somente as [áreas] próprias", afirmou. Ward trabalha com 2,3 mil hectares de algodão e 500 de soja, e pelo menos por enquanto ainda não tem planos de ampliá-las em 2006/07.

Na Bahia e em Goiás, segundo e terceiro maiores Estados produtores do país, respectivamente, também há sinais de reaquecimento na produção da pluma. Na Bahia, onde as áreas de plantio estão concentradas no oeste, a colheita está prevista em 300 mil toneladas em 2005/06, em uma área de 211 mil hectares. Em 2004/05, foram 207 mil hectares e 290 mil hectares, segundo Valter Horita, presidente da Associação de Agricultores e Irrigantes da Bahia (Aiba). A entidade não calculou em quanto a área poderá aumentar em 2006/07.

Mesmo sem cálculos precisos, Horita confirma o avanço do algodão sobre a soja também no oeste baiano. "Estamos com 40% da produção de algodão já contratada para exportação em 2007", disse. Para este ano, as exportações do Estado estão estimadas em 120 mil toneladas.

Em Goiás, os produtores estão dispostos a aumentar a área em 2006/07, mas no máximo em 10%. "Muitos produtores abandonaram a cultura. Os que ficaram não deverão tomar uma decisão mais agressiva para a expansão", disse Adriano Vendeth, analista da All Cotton, cooperativa de produtores goianos.

Em grande parte, a maior rentabilidade do algodão na comparação com a soja no país decorre de fatores internacionais. Conforme Hélio Tollini, diretor da Associação Brasileira dos Produtores de Algodão (Abrapa), há boa demanda por parte da China e, com isso, as cotações já reagiram no exterior. Segundo cálculos do Valor Data, os contratos futuros de segunda posição de entrega registraram valorização de 4,5% nos últimos 12 meses

Aquino, da Conab, lembrou que outra notícia altista para os preços veio do último relatório do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA), que sinalizou queda de quase 1 milhão de toneladas nos estoques globais de algodão em 2006/07 em razão da estagnação da produção mundial e do aumento do consumo.