Título: Entidades criam movimento pró-ensino
Autor: Stela Campos
Fonte: Valor Econômico, 26/06/2006, Brasil, p. A4

A constatação de que a cada 28 segundos um aluno deixa a escola em algum país da América Latina causou indignação entre os 250 participantes da conferência "Ações de responsabilidade social em educação" que terminou no fim de semana, na Praia do Forte , na Bahia. Durante três dias, um cronômetro marcou quantas crianças e jovens deixaram os estudos naquele período, chegando ao final, a um desconfortável número de 5,4 mil estudantes. Pior para os brasileiros foi saber que, pela mesma estimativa, a cada hora, 31 alunos abandonam a sala de aula.

Durante o encontro, que reuniu cerca de cem empresários, além de ministros e especialistas de vários países, o quadro apresentado foi sombrio. Muitos tomaram conhecimento, pela primeira vez, que a região teve os piores resultados em todos os exames globais de avaliação sobre aproveitamento de alunos, e que os trabalhadores da América Latina têm quase 1,5 ano a menos de escolaridade que os de países com renda semelhante. Segundo as estatísticas, cerca de 50% dos estudantes do Brasil saem da quarta série como analfabetos funcionais, quase dois milhões de jovens estão fora da escola e a escolaridade média da população é de 4,9 anos.

O resultado da comoção pela situação da educação para os representantes brasileiros resultou em uma carta de intenções no fim da conferência com a decisão dos empresários de realizar ações em favor de um movimento chamado "Compromisso Todos pela Educação". O objetivo do grupo, que começou a atuar informalmente há oito meses e reúne nomes conhecidos - Ana Maria Diniz, Viviane Senna, Luiz Roberto Marinho, Milú Vilela, entre outros - é mobilizar a sociedade para ajudar a colocar todas as crianças e jovens brasileiros na escola até 2022.

Mas não foram só os líderes brasileiros que se animaram a colaborar com a melhoria do ensino na América Latina após três dias de discussão. Os ministros da Educação da Nicaragua e da Guatemala e representantes da Costa Rica, El Salvador e Honduras decidiram propor ao México a criação de uma rede conjunta de televisão educativa para ser veiculada nas escolas da América Central.

Cuidar da educação para os países latino-americanos significa aumentar a competitividade econômica. Segundo relatório apresentado pelo Programa de Promoção da Reforma Educativa na América Latina e Caribe (Preal), os trabalhadores da América Latina possuem escolaridade mais baixa que no Leste Asiático e Europa Oriental. "Assim vamos perder a corrida no mundo globalizado", disse Jorge Paulo Lemann, da Fundação Lemann, um dos organizadores da conferência junto com a Fundação Jacobs e o grupo Gerdau.

"É preciso desenvolver competências em gestão e este é o melhor elo de relação entre as empresas e a educação", disse Jorge Gerdau Johannpeter, do grupo Gerdau. Marcel Granier, presidente do Conselho de Empresários da América Latina (Ceal), da Venezuela, acredita que as falhas no sistema educacional latino-americano estão resultando na falta de formação de empreendedores.

O relatório do Preal indica que o problema da região não está concentrado na falta de investimentos. Na última década, o número de crianças que ingressaram e concluíram o ensino fundamental e médio na região aumentou mais rapidamente do que em qualquer outra parte do mundo em desenvolvimento. "A grande questão é a qualidade", diz Jeffrey Puryear, representante do Preal.

"O desastre gerencial é uma das questões centrais e nisso nós empresários podemos contribuir transferindo conhecimento de gestão", diz Paulo Cunha, do grupo Ultra. Para Gerdau, a transferência pode ser feita " inserindo a educação na pauta de investimentos, agindo de forma integrada com o governo, outras empresas e organismos sociais e focando em programas que favoreçam a melhoria da gestão dos sistemas de ensino e capacitação de educadores".

"Os empresários recebem o produto bichado das nossas escolas, por que não ajudar a consertar?", provoca Cláudio de Moura e Castro, da Faculdades Pitágoras.