Título: AES Sul obtém na Justiça direito a receber R$ 370 mi
Autor: Leila Coimbra
Fonte: Valor Econômico, 19/04/2006, Empresas, p. B8

A distribuidora de energia gaúcha AES Sul ganhou na Justiça o direito de receber pelo menos R$ 370 milhões do antigo Mercado Atacadista de Energia Elétrica (MAE), rebatizado de Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE) pelo novo modelo do setor. A decisão diz respeito a uma transação feita entre a AES Sul e outras empresas de energia do Sudeste no período do racionamento, em 2001.

Na época, a distribuidora gaúcha revendeu sobras da energia de Itaipu - da qual tem obrigação de comprar por ser cotista- , no mercado atacadista, para empresas do Sudeste.

Apesar do país viver o risco do apagão, naquele período, na região Sul não havia racionamento de energia e os preços do MAE estavam em R$ 4 o megawatt-hora (MWh). Mas, no Sudeste, onde havia escassez de eletricidade, o MWh chegou a ser vendido a R$ 684. Então, a AES Sul revendeu suas sobras de Itaipu no mercado onde os preços eram bem mais atrativos.

Mas a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) considerou a operação irregular e, no dia 16 de maio de 2002, publicou o despacho nº 288, que anulou retroativamente os ganhos da AES e de outras empresas da região Sul como Copel (PR), Celesc (SC) e RGE (RS) , que também haviam comprado energia de Itaipu e vendido para consumidores livres no Sudeste durante o período de racionamento.

A discussão judicial então começou. A AES Sul conseguiu por três vezes liminares que derrubaram o despacho da Aneel, e a agência sempre recorreu da decisão. A última delas, favorável à concessionária, saiu no último dia 31 de março. O Tribunal Regional Federal da 1ª Região de Brasília deu antecipação de tutela ao agravo de instrumento solicitado pela AES Sul. Traduzindo: significa que a concessionária obteve decisão favorável a uma nova liquidação no MAE e o direito de receber o dinheiro resultante das operações que realizou durante o racionamento.

A Aneel informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que entrou com recurso no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ainda aguarda a sua apreciação.

Essa nova contabilização será uma dor-de-cabeça para a CCEE, pois ainda não se sabe ao certo de onde virá o dinheiro para pagar essas transações. O presidente do conselho da instituição, Antônio Carlos Fraga Machado, disse que os integrantes da CCEE se reunirão com técnicos da Aneel para esclarecer o que deverá ser feito. "Uma série de pontos ainda não estão claros. Temos que verificar se esses valores foram depositados em juízo, coisas assim", disse Machado.

Se todas essas operações do MAE no racionamento tivessem que ser refeitas, a conta poderia atingir mais de R$ 920 milhões . O impasse em torno dessa questão chegou a atrasar a publicação dos balanços das companhias elétricas referentes ao exercício de 2001 e também a assinatura do Acordo Geral de Reposição das Perdas do Racionamento, que deu às empresas financiamento de R$ 7 bilhões e aumentos de até 7,9% nas tarifas

Por ingressar na Justiça para garantir a venda de energia no MAE como receita, a AES Sul ficou fora do Acordo Geral do Setor Elétrico.

Quando iniciou a disputa na Justiça, a AES Sul alegou que os negócios foram realizados com base nos regulamentos vigentes e concretizados antes do início do racionamento de energia. "O despacho 288 é uma demonstração concreta da falta estabilidade do sistema regulatório brasileiro" , informou a companhia na época.