Título: Múltis reajustam sem perder vendas
Autor: Mattos , Adriana
Fonte: Valor Econômico, 18/05/2011, Empresas, p. B4

As principais multinacionais de consumo do mundo conseguiram repassar este ano aumentos de preços de até 6% em países como Brasil, China, Indonésia e México, sem que isso afetasse de forma considerável o volume de vendas. Havia um risco de que, na tentativa de defender a rentabilidade - na berlinda com a escalada no preço das commodities no mundo - fossem feitos ajustes além da conta, e com isso esses megagrupos acabariam perdendo consumidores em regiões estratégicas, como o Brasil.

Foram analisados balancetes das companhias Unilever, Procter & Gamble, Kimberly-Clark, Colgate-Palmolive, Reckitt-Benckiser e Avon. Todas promoveram reajustes nos primeiros meses do ano em países emergentes. Mas foi registrado um crescimento de receita nesses mercados até duas vezes maior do que em economias maduras.

O restrito impacto dos reajustes no volume vendido ajuda a explicar esse desempenho. Foi o caso, por exemplo, da Unilever, dona de marcas, como Omo, Seda e Knorr, em que 56% da receita global vem de países em desenvolvimento. "Isso [os resultados de vendas] é um reflexo claro da nossa capacidade de aumentar os preços nos mercados emergentes e continuar a crescer fortemente em volumes", disse semanas atrás para analistas Jean-Marc Huet, o chefe da área financeira da Unilever. Huet disse que 75% das vendas da fabricante virão de mercados emergentes a longo prazo.

De janeiro a março, as vendas da Unilever nesses locais se ampliaram 9,9% versus 4,3% na média da empresa no mundo. "Estamos progredindo bem em um cenário de custos de commodities elevados", reforçou Paul Polman, presidente mundial do grupo.

Na mesma linha da concorrente, o comando da Procter & Gamble relatou há três semanas que "a habilidade em lidar com sucesso com os aumentos de preço foi uma das razões da elevação nas vendas", informou o balancete. Em produtos para barbear, a redução de promoções e o reajuste de preços em mercados como Brasil e México ampliaram em 5% a receita na categoria de janeiro a março.

Na Kimberly-Clark, fabricante das marcas Intimus e Scott, houve uma alta de 2% nos preços ao varejo no primeiro trimestre nos países da área internacional do grupo - sendo que Brasil e México puxaram o reajuste, esclarece o balanço. No período, o volume de itens vendidos cresceu também na mesma velocidade (2%), e quem sustentou essa alta foi novamente o Brasil - além de China, Vietnã e Coreia do Sul.

Esses ajustes finos entre volume e valor precisam ser feitos levando-se em conta uma relação específica entre preço e demanda para cada produto, diz Nelson de Souza, professor de finanças corporativas do Ibmec/RJ. A procura por certos itens, como alimentos, itens de limpeza e higiene, é considerada inelástica, ou seja, ela pouco se move porque o bem é considerado uma necessidade. O consumidor aceita pagar mais por ele.

"Apesar disso, o fato de essas multinacionais estarem em mercados com alta concorrência poderia limitar esse aumentos, pois há muitas marcas à venda", diz ele. "Mas há uma questão que pesa a favor dessas companhias na hora de fazer os reajustes, o aquecimento da demanda. Períodos de bonança abrem espaços maiores para aumentos".

Os reajustes da Avon, fabricante de itens de beleza, exemplificam bem esse cenário. A empresa tem se favorecido dos ganhos de renda da população no Brasil, que ajudam a sustentar a demanda por cosméticos em alta. Nessa boa fase, semanas atrás, a companhia informou em balanço que promoveu uma alta de 6% nos preços de suas mercadorias na América Latina (o Brasil responderia por 60% das vendas na região). No período, o volume comprado cresceu 5%.

Para efeito de comparação, na média mundial, a alta nos preços foi de 5%, mas houve perda de 1% na quantidade vendida. A América Latina é a segunda região geográfica com a margem operacional mais alta dentro do grupo.

Entre as empresas com balanços analisados, a Colgate-Palmolive merece destaque. A empresa fez aumentos de 4,5% nos preços de produtos nos países da América Latina, e a quantidade de itens vendidos subiu magros 0,5% na região. Inclusive, chegaram a acontecer perdas. Na Venezuela e Argentina o volume vendido registrou alta, mas no Brasil, Colômbia e República Dominicana foi verificada retração na quantidade comercializada de janeiro a março. "A margem bruta cresceu por causa dos aumentos de preço e das economias de custos", informa o relatório de resultados.

Acertar nessa calibragem entre preço e demanda tende a ficar mais difícil daqui para frente. "Se a economia der sinais de crescimento mais tímido no país, com as limitações de crédito, as empresas podem perder parte dessa gás e aí, remarcações ficam mais complicadas". As empresas não informam em seus balanços se a temporada de reajustes se limitou ao primeiro trimestre.