Título: Avanço de apenas 1,8% gera dúvidas sobre a recuperação americana
Autor: Harding , Robin
Fonte: Valor Econômico, 29/04/2011, Internacional, p. A15

Dúvidas foram lançadas sobre a vitalidade da recuperação econômica americana, depois que o PIB cresceu à taxa anualizada de apenas 1,8% no primeiro trimestre.

O aumento nos preços do petróleo impediu o crescimento do consumo, enquanto as despesas públicas caíram em todos os níveis.

A maioria dos analistas acredita que o esfriamento econômico será temporário, mas o apoio governamental à economia começará a diminuir mais à frente neste ano, e a ausência de uma aceleração do crescimento sinaliza, portanto, anos de mais dificuldades para a maior economia do mundo.

Nesta fase da recuperação econômica, o crescimento costuma registrar uma retomada entre 4% e 5%. Uma expansão inferior a 2% não criará empregos suficientes para acompanhar o crescimento da população e para reduzir a taxa de desemprego nos EUA, de 8,8%.

O dólar se desvalorizou ainda mais após a divulgação dos números de crescimento, tendo os investidores considerado que o fraco crescimento fará com que os juros americanos permaneçam mais baixos por mais tempo.

Embora ofuscada pelas estatísticas do crescimento, houve outra divulgação de dados econômicos preocupantes na quinta-feira. Os pedidos iniciais de seguro-desemprego subiram para 429 mil e a média em quatro semanas subiu de volta para mais de 400 mil.

Os pedidos de auxílio-desemprego traçavam uma tendência de melhoria, e a inversão sugere que o ímpeto do mercado de trabalho pode ter perdido gás.

Economistas atribuíram parte da debilidade do crescimento a um declínio temporário nos gastos com a defesa e a uma desaceleração, relacionada com as condições climáticas, na produção da construção civil.

"Após uma breve pausa, o crescimento real do PIB se reacelerará", afirmou Nariman Behravesh, da IHS Global Insight.

Mas o crescimento também foi freado pelo encarecimento da gasolina, que manteve o crescimento dos gastos de consumo pessoal real num percentual anualizado de 2,7%, contra 4% no quarto trimestre de 2010.

Os preços subiram 3,8%, porém mesmo excluindo os custos com alimentos e energia, eles cresceram a uma taxa de 1,5% - a mais rápida desde 2008.

"Embora a alta dos preços da gasolina esteja minando a confiança dos consumidores, uma melhoria do mercado de trabalho está dando sustentação aos seus gastos. Por sua vez, as empresas continuam otimistas e estão gastando mais à vontade tanto em novas tecnologias como em novas contratações", disse Behravesh.

O Fed (Federal Reserve, o banco central dos EUA) reviu na quarta-feira suas perspectivas para o resto do ano. As autoridades agora acreditam que a economia americana crescerá a uma taxa entre 3,1% e 3,3%, em 2011, em comparação com uma previsão anterior de 3,4% a 3,9%.

Os consumidores americanos tiveram muito mais dinheiro no bolsos no primeiro trimestre, por causa de um corte temporário de dois pontos percentuais nos impostos sobre as folhas de pagamento negociado entre o governo do presidente Barack Obama e os republicanos no Congresso no ano passado. Mas grande parte desse dinheiro foi gasto para comprar a mesma quantidade de gasolina. Do aumento total em dólares nas despesas do consumidor no primeiro trimestre, cerca de um terço destinou-se à compra de energia.

"A renda disponível, em termos nominais, subiu 6,9% - um aumento impressionantemente grande -, mas em termos reais a renda cresceu apenas 2,9%", disse Paul Ashworth, economista-chefe para os EUA na Capital Economics, em Toronto. "Essencialmente, isso eliminou todo o impacto positivo do corte de impostos incidente nas folhas de pagamento."

O crescimento mundial teria sido razoável se os gastos do governo não tivessem arrastado os números para baixo. A redução dos gastos com defesa eliminou 0,7 ponto percentual do crescimento - um declínio quase certamente temporário.

Porém menores gastos estaduais e municipais reduziram o crescimento em outros 0,4 ponto percentual e o declínio nos gastos federais decorrentes das recentes batalhas orçamentárias ainda não foram sentidos.

Na coletiva de imprensa do Fed na quarta-feira, Ben Bernanke, o presidente do banco, fez coro ao consenso da maioria dos economistas, ao dizer que "a maior parte da desaceleração no primeiro trimestre" foi "transitória". O Fed continua acreditando num crescimento total, para este ano, de 3,1% a 3,3%.

Esse seria um resultado razoável, pouco superior à tendência de longo prazo da economia, mas ainda profundamente decepcionante em comparação com esperanças, manifestadas no início do ano, de que 2011 seria quando a economia iria deslanchar.

O que acontecerá depende bastante dos preços do petróleo. Caso não subam ainda mais, os consumidores terão mais poder de fogo no próximo trimestre. Caso recuem, serão possíveis um ou dois trimestres de crescimento superaquecido. Mas se o petróleo ficar ainda mais caro, isso derrubará todas as apostas. A média de preços da gasolina nos EUA é, agora, de US$ 3,88 por galão.

Rex Tillerson, executivo-chefe da ExxonMobil, maior companhia petrolífera mundial, disse que a última vez em que o preço da gasolina nos EUA atingiu US$ 4 por galão, isso produziu um efeito econômico e psicológico. As pessoas começaram a usar os transportes públicos com maior frequência, organizar esquemas de carona e suprimir viagens não essenciais.

"Não sei se esse ponto de inflexão (de comportamentos) permanece nos mesmos US$ 4, ou não. Sei apenas que quando passamos por isso da última vez, US$ 4 foi um evento emocionalmente significativo para as pessoas".

Para o governo Obama, o preço dos combustíveis está se tornando uma importante questão política. O presidente exortou o Congresso a eliminar US$ 4 bilhões em subsídios concedidos a produtores de petróleo e gás e criou uma força-tarefa para investigar fraudes e manipulações nos mercados de energia.

A ExxonMobil reagiu acusando o governo de "demonizar" a indústria petrolífera e defendendo, em vez disso, ações no sentido de "liberar os recursos energéticos embargados, neste país, permitindo a abertura de mais poços.