Título: Energia menos cara, PIB mais robusto
Autor: Spalding, Eduardo Carlos
Fonte: Valor Econômico, 02/03/2011, Opinião, p. A14

O Brasil poderia agregar uma "Argentina" inteira a sua economia, consolidar o crescimento industrial e ampliar a atratividade de novos investimentos nesta década se melhorasse as condições de fornecimento da energia e diminuísse o custo do insumo. As medidas para se alcançar esse objetivo referem-se principalmente ao tratamento a ser dado à energia de usinas cujas concessões vencem nos próximos anos e à redução de encargos setoriais; e permitiriam o acréscimo de R$ 695 bilhões ao Produto Interno Bruto (PIB) nacional até 2020. A cifra, equivalente à produção de bens e serviços do país vizinho, faria com que o PIB brasileiro superasse os R$ 6 trilhões no fim desta década.

Esses são os principais resultados de análise feita pela Fundação Getulio Vargas Projetos por meio de uma matriz brasileira insumo-produto. O modelo possibilita a estimativa das condições macroeconômicas para esta década, considerando projeções de crescimento doméstico e mundial e do consumo de energia. As simulações, baseadas em pesquisa da consultoria Andrade & Canellas, levam em conta dois cenários: a manutenção das condições do setor e um cenário com a adoção de aperfeiçoamentos.

Um dos principais aperfeiçoamentos propostos diz respeito ao tratamento da energia das usinas cujas concessões estão por vencer. O correto seria a sua alocação para todos os consumidores do país, cativos ou livres, a preços que reflitam a depreciação das usinas já pagas pelos consumidores.

Outra medida que promoveria a redução do valor da energia é a diminuição dos encargos setoriais, que, em 2010, representaram um custo adicional da ordem de R$ 17 bilhões para os consumidores de energia. Como exemplo, dois deles - a Conta de Desenvolvimento Energético (CDE) e a Conta de Consumo de Combustíveis (CCC) - não deveriam ser cobrados nas contas de luz. Esses encargos subsidiam o fornecimento de energia elétrica em regiões isoladas, o atendimento a consumidores de baixa renda e programas de universalização de redes de atendimento. É inquestionável o mérito de tais subvenções, entretanto, não cabe aos consumidores de energia elétrica financiar tais custos, mas ao Tesouro Nacional.

O cenário de aperfeiçoamento também considera a extinção da Reserva Global de Reversão (RGR) ao fim de 2010, como previsto na legislação. Para tanto é preciso que seja barrada no Congresso Nacional uma medida provisória que prevê sua prorrogação até 2035.

Os aperfeiçoamentos propostos permitiriam que o crescimento da economia passasse de 4,9% para 5,9% ao ano

Além disso, seria necessário e possível retornar as alíquotas do PIS e da Cofins ao regime não cumulativo e extinguir o programa de pesquisa e desenvolvimento, o que representaria uma redução do custo estimada entre R$ 3,00 a R$ 4,00 por MWh.

Recomenda-se ainda reduzir o montante pago pelos agentes a título de Taxa de Fiscalização de Serviços de Energia Elétrica (TFSEE) para 43% do valor médio arrecadado. Esse percentual é a média do que efetivamente foi arrecadado para cobrir os custos da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) nos últimos anos. O restante tem sido utilizado para formação de superávit primário.

Essas sugestões fazem parte do Projeto Energia Competitiva (PEC), promovido por seis associações setoriais de consumidores lideradas pela Abrace. O PEC consiste em um conjunto de estudos que demonstram o impacto negativo do excessivo custo da energia para a economia nacional e apresentam soluções para reverter esse quadro, potencializando o crescimento econômico com reflexos positivos sobre todos os indicadores sociais.

O PEC considera um cenário de continuidade, no qual é mantida a atual trajetória de custos excessivos da energia, prejudicial à economia do país e à indústria, e um de aperfeiçoamento, com a adoção de melhorias em favor do aumento da competitividade. A comparação entre os dois panoramas mostra que os aperfeiçoamentos favorecem a sociedade como um todo, inclusive o governo, que seria beneficiado pelo aumento de arrecadação de impostos.

Os aperfeiçoamentos propostos pelo PEC no setor elétrico permitiriam uma aceleração do crescimento da economia de uma previsão de 4,99% ao ano para 5,91%, com efeitos positivos em todos os indicadores econômicos e sociais. O nível de emprego, por exemplo, teria uma aceleração da ordem de 25%, atingindo uma taxa média anual de 3,67%.

Tudo isso seria possível com a reversão do contexto atual, no qual o custo elevado dos insumos energéticos passou a ser um fator de inibição de investimentos e desindustrialização, principalmente para a indústria energointensiva, onde o custo da energia chega a representar mais de 30% do custo dos produtos. Restaurado o acesso à energia em condições mais competitivas, nossas fábricas poderiam voltar a investir e competir num mundo globalizado, com aumento na contratação de mão de obra, aquisição de matérias-primas e aquecimento de todas as cadeias produtivas.

É preciso dar esse importante passo para garantir que o Brasil deixe de ter uma das energias mais caras do mundo e aproveite esse insumo vital para a preservação da indústria de base já implantada e para seu próprio desenvolvimento. Com energia mais competitiva, podemos crescer mais e melhor. Basta querermos.

Eduardo Carlos Spalding é vice-presidente do Conselho Diretor da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace).