Título: Agnelo cria Secretaria da Transparência
Autor: Ulhôa, Raquel
Fonte: Valor Econômico, 30/12/2010, Política, p. A10

O governador eleito do Distrito Federal, Agnelo Queiroz (PT), assume no dia 1º o comando de uma capital que ainda não se recuperou da grave crise política que levou à cadeia o então governador José Roberto Arruda (DEM), no início de 2010, e teve três governadores depois disso. Mato alto, lixo espalhado na rua e caos na rede pública de Saúde são apenas alguns reflexos do abandono da cidade. Agnelo deparou-se com um quadro pior do que imaginava. Só de déficit, herdará R$ 800 milhões.

Entre as ações para combater o esquema de corrupção instalado em Brasília, segundo Agnelo, há 14 anos, o governador eleito vai criar uma Secretaria da Transparência para fiscalizar toda a administração e instalar um serviço gratuito de atendimento telefônico (0800) para estimular empresários a denunciar eventuais cobranças de propina, mantendo o anonimato.

Agnelo defende que o Distrito Federal adote um planejamento que possibilite sua autonomia financeira a médio prazo. Em 2011, o governo do DF terá um orçamento de R$ 25 bilhões, dos quais R$ 8 bilhões serão repassados pela União, relativos ao Fundo Constitucional ao qual o GDF tem direito anualmente.

Um dos objetivos é instalar um parque de indústrias de tecnologia. Após a eleição, ele já obteve a promessa de uma indústria farmacêutica nacional de montar uma unidade na capital. O governador eleito vai criar nove novas secretarias, mas nenhum novo cargo. Haverá remanejamento entre os existentes.

Até 2008, quando foi para o PT, Agnelo foi filiado ao PCdoB, partido pelo foi ministro do Esporte do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Sua eleição significa a retomada do Distrito Federal pelo PT, que comandou a capital de 1995 a 99, com Cristovam Buarque (hoje PDT).

Na composição do seu secretariado, Agnelo manteve a infraestrutura sob o comando do PMDB, partido que participou do esquema dos ex-governadores Joaquim Roriz e Arruda. Seu vice é o deputado federal Tadeu Filippelli (PMDB), que vai coordenar a execução do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Agnelo diz que o PMDB está comprometido com o resgate da credibilidade e o combate à corrupção. A seguir, a entrevista ao Valor:

Valor: Cidade abandonada, mato alto, lixo nas ruas, caos na saúde. Como é que o senhor vai enfrentar tantos problemas de uma vez?

Agnelo Queiroz: A cidade está numa situação muito complicada. Passou por essa crise profunda e esse período tampão [o atual governador, Roberto Rosso, do PMDB, foi eleito indiretamente em abril] é um desastre. É juntar um desastre em cima de um desastre. A situação é um pouco pior do que eu imaginava: inadimplência numa quantidade enorme de órgãos, descontrole completo, não tem um serviço público funcionando, problema seriíssimo na Educação - vamos entrar faltando 80 salas de aula. O desemprego aumentou. Deve ser o único lugar (era 13% e agora 13,2%) do país em que isso aconteceu. Alguns Estados falam em pleno emprego. E estamos no limite da lei de responsabilidade fiscal com relação a ajuste de pessoal. Apesar de termos uma grande capacidade de endividamento (R$ 22 bilhões e dívida de apenas R$ 4 bilhões), nesse momento não podemos contrair empréstimo pela capacidade de pagamento.

Valor: Como o senhor vai reduzir despesas?

Queiroz: Na parte pessoal, tem um quadro muito inchado. Tem 18 mil cargos comissionados e vou cortar pela metade. E vou rever os contratos. Percebo claramente, pelos que já analisamos na transição, que há problemas sérios e graves de superfaturamento. Com certeza vamos conseguir reduzir valores de contratos. Vou analisar os restos a pagar e só vou fazer isso lá pelo meio do ano, de maneira que tenha condições de botar a economia em dia. Farei todo o ajuste junto com o governo federal. Com uma economia ajustada, vamos atrás de investimentos. Já temos reuniões marcadas com o Bird e o BID. Há também empréstimos favoráveis oferecidos pelo BNDES, por exemplo, para expansão da área de hotéis, construção de arenas esportivas e recursos para mobilidade urbana. Há um déficit em torno de R$ 800 milhões, mas tem um grande orçamento no DF. Sou bastante otimista que vamos dar conta de rapidamente colocar nossa economia em dia em um ano.

Valor: Qual sua prioridade?

Queiroz: Vamos ter uma ação imediata junto a área da Saúde. Por ser médico, conhecer com profundidade a área, vamos dar um tratamento emergencial nos primeiros cem dias. Além de medidas emergenciais, colocando em funcionamento minimamente a saúde pública, que hoje está um caos, vamos tomar medidas estruturais. Vamos dar prioridade à atenção básica, instalando as equipes de saúde da família. Umas de nossas ideias é construir um hospital de UTI aqui [atualmente, faltam leitos e pacientes recorrem à Justiça para obter uma vaga].

Valor: E o lixo que está tomando conta da cidade?

Queiroz: Nos primeiros dias vamos fazer uma campanha, mobilizar todos os órgãos de governo, as administrações, os serviços de limpeza urbana, a secretaria de Obras, a companhia de água e esgoto - porque precisa também desentupir os esgotos - e fazer um mutirão. Vamos sair já limpando a cidade, todo mundo.

Valor: Como combater esse esquema de corrupção?

Queiroz: Profissionalização da gestão será palavra de ordem nossa. Vamos informatizar, ter controle absoluto de todos os gastos. Na Saúde, por exemplo, controlar o gasto com tudo: de uma lâmina a um exame de tomografia computadorizada, ressonância, enfim. Controle absoluto e profissionalização da gestão, com planejamento. O planejamento acabou aqui há tempo, desde o governo Roriz.

Valor: Vai investigar administrações passadas?

Queiroz: Vamos auditar porque, se não fizermos isso, a responsabilidade termina ficando para o novo governo que não tem nenhuma responsabilidade com isso.

Valor: Manter o PMDB, que esteve no governo desde Roriz, numa área estratégica como a de infraestrutura, não compromete?

Queiroz Em absoluto. O PMDB participou da nossa aliança e vai ajudar a governar. E está comprometido com esse novo caminho que estamos estabelecendo para o DF de resgate da credibilidade. E não serei solidário com nenhum tipo de indignidade. O secretário vai responder e será punido com rigor. Estou criando uma Secretaria de Transparência, que é uma coisa inédita no Brasil. Vai aglutinar corregedoria, controladoria e ouvidoria, de tal maneira que vai pegar todos esses órgãos com o objetivo de assegurar total transparência na administração pública. Teremos um portal da transparência, simplificado, para que o cidadão comum tenha acesso.

Valor: E a corrupção entre empresas que prestam serviço ao GDF?

Queiroz: Vamos introduzir coisas novas nos contratos. Por exemplo: vamos botar um 0800 nos contratos para que, se algum contratante do governo for abordado com qualquer proposta indecorosa, ele pode denunciar mantendo sua privacidade. Nenhum empresário poderá vir com o discurso de que, se não pagar, a empresa vai ser perseguida. De forma nenhuma: não tem que aceitar. Agora não vou punir só o cara do poder público que a gente pegar fazendo coisa errada. O empresário que for pego dando qualquer tipo de benefício a qualquer agente público não faz nunca mais uma obra aqui, não faz nunca mais um contrato no DF, enquanto eu tiver aqui, claro. Precisamos tratar das duas pontas para combater esse câncer.

Valor: Como pretende gerar novos empregos?

Queiroz: Temos de desenvolver nossa indústria aqui, uma vocação mais para indústria limpa, de tecnologia. Vou instalar polos de tecnologia.