Título: Ações do documento Ação de banco estatal limita impacto de aumento da Selic
Autor:
Fonte: Valor Econômico, 16/03/2010, Opinião, p. A10

O Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central começa hoje a segunda reunião do ano. Parte do mercado financeiro acredita que esta reunião marcará a interrupção da estabilidade da taxa básica (Selic) - que está fincada em 8,75% ao ano há praticamente oito meses -, e também decidirá pela primeira elevação do juro em 18 meses. Apesar de o crescimento econômico estar em ritmo moderado, setores mais conservadores argumentam que a expansão do consumo e o comportamento da inflação não deixam espaço para complacência e que é hora de começar a elevar os juros. O relatório Focus do Banco Central, que retrata as expectativas do mercado, mostrou ontem que já se projeta que a inflação pode superar a meta (4,5%) não só neste ano, mas também em 2011. O quanto antes as taxas subirem, o quanto antes a correção estará terminada, minimizando eventuais repercussões dessa medida impopular nas eleições presidenciais, acrescenta essa corrente. O objetivo de um aumento dos juros básicos é elevar o custo do dinheiro para frear o consumo e, portanto, os preços. Com a mesma intenção, o Banco Central (BC) já havia mudado as regras do recolhimento dos compulsório sobre depósitos bancários. No fim de fevereiro, o BC anunciou a recomposição de boa parte dos compulsórios que haviam sido liberados no auge da crise internacional. Dos R$ 99,8 bilhões em compulsórios anteriormente devolvidos, voltarão a ser recolhidos R$ 71 bilhões, em duas etapas, R$ 37 bilhões a partir de 22 de março e mais R$ 34 bilhões a partir de 9 de abril. Nem todos concordam com o diagnóstico de que já é necessária a elevação dos juros e a contenção do crédito. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, empresários da indústria e até mesmo alguns representantes do setor financeiro consideram que a economia ainda não dá suficientes sinais de vigor que demandam taxas mais altas. Alinhados com o ministro da Fazenda, os bancos federais anunciaram, porém, a disposição de não repassar para suas linhas de crédito o impacto de uma eventual elevação da taxa básica de juros. Conforme reportagem do Valor (15/03), a Caixa Econômica Federal não tem intenção de acompanhar uma elevação da Selic; e o Banco do Brasil (BB) afirmou estar preparado para resistir por algum tempo. A Caixa informou que pode segurar os repasses até que a Selic suba ao patamar de 9,5% ao ano. Os bancos federais contam com fundos baratos, como depósitos de estatais, de poupança e judiciais. Os dois bancos somados representam quase um terço do mercado de crédito. Foi a ação dessas duas instituições e mais a do também federal Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) que amenizou o aperto de liquidez causado pela crise internacional de 2008 a 2009. Enquanto os bancos privados puseram o pé no freio por cautela, no caso das grandes instituições, ou por falta de funding, no dos pequenos e médios, os bancos federais aceleraram as operações. No auge da crise, entre setembro de 2008 e julho de 2009, a oferta de crédito dos bancos estatais cresceu 33% diante de 9,1% dos bancos privados. Ao longo de 2009, a fatia do BB no mercado de crédito aumentou 3 pontos percentuais para 20,1%. A carteira de crédito do banco avançou 35,2%, somando-se o crescimento orgânico e o propiciado pelas aquisições da Nossa Caixa e de metade do capital do Banco Votorantim. Já a Caixa Econômica Federal aumentou sua participação em 2,3 pontos para 8,8%. Os dois bancos têm poder de fogo para influenciar os concorrentes privados e segurar um repasse dos juros, amenizando o impacto da elevação da Selic. Há dois outros motivos que podem amortecer a transmissão da elevação da taxa básica no mercado de crédito. Um deles é a queda da inadimplência, que permite aos bancos manter as taxas sem abrir mão dos ganhos. O outro motivo é o fato de os bancos já terem antecipado em parte a elevação, acompanhando a curva do mercado futuro de juros. A taxa de juros de longo prazo do mercado futuro já subiu quase meio ponto ao ano, nos últimos cinco meses, enquanto a Selic continuava pregada em 8,75%. Enquanto isso, a taxa média de juro subiu quase um ponto para 35% ao ano.