Título: Bancos colocam agência dentro do celular
Autor: Talita Moreira e Ricardo Cesar
Fonte: Valor Econômico, 11/11/2005, Empresas &, p. B3

Telefonia móvel Instituições financeiras fazem parceria com operadoras para oferecer serviços a seus clientes

Alguns anos atrás, as operadoras de telefonia alardearam o início da era dos serviços bancários pelo celular. O mercado cresceu bem menos do que se esperava - por limitações tecnológicas e pouca familiaridade dos clientes com os aparelhos. Agora, com 80 milhões de telefones móveis em uso no país, o setor ensaia o recomeço de uma história bem mais real. Operadoras de telefonia, bancos e empresas de software estão se aproximando para colocar na telinha dos aparelhos todos os serviços que hoje estão disponíveis nas páginas das instituições financeiras na internet. O Banco do Brasil (BB) está entre os pioneiros dessa nova geração de "mobile banking", como o serviço é chamado. O BB já tem acordos comerciais com a Vivo e a Brasil Telecom GSM e, segundo informação obtida pelo Valor, deve anunciar na próxima semana uma parceria com a Claro, em tecnologia mais avançada. O banco estatal tem hoje 117 mil clientes usando seus serviços por meio do celular. Até o fim deste ano, a TIM passará a oferecer acesso ao BankBoston - que desenvolveu no Brasil o primeiro sistema do gênero para o banco americano. Em seis meses, a expectativa da instituição financeira é atrair 10 mil clientes para o serviço. Inicialmente, o sistema estará disponível em dois modelos específicos de celulares da Nokia e será oferecido a quem gasta entre R$ 200 e R$ 250 por mês com o telefone móvel. Mas a idéia é ampliar esse escopo para outros aparelhos e operadoras. Empresas de telefonia e bancos apostam que esse mercado começará a ganhar relevância no próximo ano, por uma série de motivos. Um deles é tecnológico: os aparelhos estão com maior poder computacional e telas coloridas, que podem exibir uma interface gráfica mais complexa como à das páginas de internet. As redes das operadoras também estão mais potentes e os celulares experimentaram crescimento explosivo no país ao longo desta década. Mas talvez a palavra-chave seja segurança. Alguns anos atrás, os bancos fizeram uma tentativa de lançar seus serviços no celular, mas concluíram que ainda não havia garantias de que as transações seriam adequadamente realizadas. "Agora, a tecnologia está mais madura, existe mais segurança, e as pessoas estão mais dispostas a usar essas ferramentas", diz o superintendente-executivo de soluções eletrônicas do BankBoston, Angelo Fernandes. A evolução da tecnologia levou mais de uma década, lembra Marco Aurélio Garib, presidente da EverSystems, fornecedora brasileira de software e serviços de tecnologia. Em 1993 - quando mal havia telefonia móvel no Brasil -, a empresa desenvolveu um sistema que permitia ao banco enviar informações como extrato, saldo e cotações para "pagers". No entanto, o recurso não permitia fazer transações financeiras, como transferências e pagamentos. Com a disseminação dos celulares, as ferramentas foram melhorando gradativamente. Por volta de 1999, surgiram os serviços via Short Message Service (SMS), tecnologia que permite a troca de textos simples em aparelhos móveis. Ainda assim, o sistema ainda impunha muitas limitações, sobretudo na parte gráfica, que era pobre. Um ano depois começaram a aparecer os bancos móveis com Wireless Application Protocol (WAP), tecnologia que trouxe mais recursos visuais. A expectativa foi grande, mas os resultados mostraram-se bem aquém do que bancos e operadoras previam. Os aparelhos da época não tinham capacidade para navegar na internet e suas telas não permitiam exibir gráficos mais complexos. Além disso, o Wap tinha um grave problema no modelo de tarifação: o cliente era cobrado por tempo de uso, mas o próprio sistema era muito lento. Há cerca de dois anos, começaram a se popularizar aparelhos com tela colorida e maior poder computacional. Era o que faltava para o banco móvel tornar-se mais eficiente. "Em 2003, surgiram equipamentos móveis com o mesmo poder de processamento que um computador pessoal de primeira linha tinha em 1998, apenas cinco anos antes", diz Garib, da EverSystems. Agora, as teles utilizam programas de navegação com tecnologias que tornam o uso mais amigável: o Brew, no caso das operadoras que adotam a tecnologia CDMA, e a linguagem Java, para as empresas GSM. Para o gerente de serviços de pagamento da Vivo, Sergio Goldstein, as operadoras também foram, aos poucos, quebrando a resistência das instituições financeiras. "A gente está passando de ameaça a oportunidade. Operadora não quer ser banco", afirma. "O mercado está tomando corpo e vai dar dinheiro para todo mundo." A operadora começou a oferecer acesso ao Banco do Brasil em abril e deverá lançar os serviços de outra instituição até dezembro. No caso da parceria com o BB, a Vivo cobra uma mensalidade de R$ 2,50 de seus assinantes. O banco estatal criou uma equipe específica para cuidar dos projetos de telefonia móvel e aponta a expansão dos celulares - inclusive entre clientes de renda mais baixa - como um dos motivos para seu interesse nessa área. Como há mais aparelhos móveis do que computadores e agências bancárias, algumas instituições enxergam a oportunidade de atingir clientes que, de outra forma, seriam inacessíveis. Porém, ainda há obstáculos a enfrentar. Um deles é a resistência dos correntistas. Como convencê-los de que esse tipo de operação é seguro? O BB ainda não fez uma campanha ampla para divulgar os serviços, mas toda a comunicação feita até agora a seus clientes tem batido na tecla da segurança, afirma Gabriela Cantuária, gerente de sistemas do projeto móvel do banco. Paralelamente, o BB continua desenvolvendo meios de tornar as transações menos vulneráveis. "Hoje, é possível acessar os serviços móveis de qualquer telefone. Depois das mudanças, isso só poderá ser feito de celulares cadastrados", diz Gabriela, que participou nesta semana de um seminário dedicado ao assunto. Paulo Matos, diretor de novos negócios da Brasil Telecom GSM, explica que os bancos criptografam os aparelhos para garantir a segurança. A implantação da chave de criptografia nos telefones é feita em três etapas, em dias diferentes, e é acompanhada por diferentes funcionários do banco. Não à toa, é batizada de "cerimônia". Enquanto tateiam o segmento de banco móvel, as empresas também já olham para um mercado relacionado: o uso dos telefones como meio de pagamento. "No ano que vem já devem começar a aparecer serviços mais consistentes", diz Goldstein, da Vivo. Já começam a surgir empresas voltadas para esse tipo de negócio. Criada por dois jovens de vinte e poucos anos, a Wappa pretende entrar em operação no fim deste mês oferecendo benefícios como vale-refeição pelo celular. Segundo Luiz Peduti, presidente da Wappa, o telefone poderá ser utilizado pelos funcionários de uma empresa para pagar a conta em restaurantes cadastrados, no lugar dos tradicionais vales de papel ou eletrônicos.