Título: Nas universidades, diminui resistência a parcerias
Autor: João Luiz Rosa e Ricardo Cesar
Fonte: Valor Econômico, 08/08/2005, Empresas &, p. B2

Quando a Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) foi procurada por investidores para participar de negócios que envolvessem a venda de projetos nascidos no meio acadêmico para a iniciativa privada, a resposta foi um sonoro "não". Pouco depois, no entanto, um sistema de busca na internet desenvolvido por pesquisadores da instituição, o Miner, foi vendido para o Universo Online (UOL). Guilherme Emrich, co-fundador da gestora de fundos de investimento Fir Capital e responsável pelo negócio, voltou à universidade. Desta vez, não propôs nenhum negócio. Limitou-se a doar o montante que seria correspondente à participação da UFMG caso ela tivesse concordado com a proposta de participação. Filantropia? Não exatamente. "O meu ato despertou na universidade o interesse de fazer parcerias com a iniciativa privada", afirma Emrich. "Depois, ficou fácil fechar negócios." Um dos frutos das parcerias subseqüentes foi colhido recentemente, quando o Google comprou a Akwan, também ligada à UFMG, na qual a Fir Capital detinha participação. Hoje o fundo tem investimentos em mais cinco empresas - uma delas de biotecnologia - em parceria com a universidade. A parceria entre instituições de pesquisa e empresas ainda engatinha no Brasil, mas foi um dos pilares do desenvolvimento da indústria de biotecnologia nos EUA. "Há resistência a esse modelo no país, mas isso deve mudar à medida que aparecem mais casos de sucesso", diz Emrich. Em muitas universidades, essa mudança já está em andamento. Parte do meio acadêmico percebeu que pode obter uma importante fonte de recursos - que são reaplicados em pesquisa - quando caminha junto com a iniciativa privada. É o caso da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que há cerca de dois anos criou sua agência de inovação, a Inova. Trata-se de um órgão vinculado à reitoria que tem o objetivo de fazer a ponte entre a universidade e o mercado. A Inova trabalha para desenvolver o parque tecnológico em torno da universidade e fecha contratos de licenciamento de patentes e pesquisa com a iniciativa privada. No ano passado, foram 13 contratos de licenciamento e um total de 26 patentes transferidas para a indústria. Em toda a sua história antes da Inova, isso só tinha ocorrido com seis patentes da Unicamp. Nos seis primeiros meses de 2005, esse número já subiu para 40 - 10% do banco de 400 patentes da Inova, das quais 50 são de empresas de biotecnologia. Rosana Di Giorgio, diretora de propriedade intelectual e parcerias da Inova, explica que, para a Unicamp obter receitas, a empresa que paga pelo licenciamento tem que transformar a patente em produtos e explorá-los comercialmente. Só então os royalties começam a ser pagos. "Provavelmente precisaremos de mais três ou quatro anos para ser auto-sustentáveis", diz Rosana. Segundo a diretora, a Inova espera gerar para a Unicamp cerca de R$ 14 milhões em royalties dentro de cinco anos. A Embrapa também procura fazer parcerias com a iniciativa privada. José Manuel Cabral, chefe-geral da unidade de recursos genéticos e biotecnologia, informa que o orçamento de 2004, de R$ 30 milhões, recebeu um bem-vindo acréscimo de 10% decorrente da prestação de serviços para empresas e royalties. Um exemplo disso é o programa de seqüenciamento genético do eucalipto, feito em parceria com 11 companhias de papel e celulose e dez universidades. "Esse modelo de parceria com a iniciativa privada é cada vez mais freqüente na Embrapa", diz. Outro caso que ilustra essa aproximação é um acordo com a Monsanto. A Embrapa entra com o material genético e a multinacional com o gene que é colocado nesse material. Os agricultores pagam royalties à Embrapa pelo uso dos cultivares - a variedade híbrida -, além de uma taxa à Monsanto. Apesar de aprovar o modelo, Cabral diz que é preciso ser cauteloso. "Se a Embrapa tivesse como objetivo principal a geração de receita, começaria a trabalhar apenas com projetos encomendados", diz. "Teríamos a possibilidade de aumentar a receita, mas deixaríamos de atender a alguns segmentos da sociedades que não geram recursos. Temos que dosar as parcerias e as pesquisas sem fim lucrativo." (RC)