Título: Arrecadação vai pagar impacto do mínimo
Autor: Raquel Salgado
Fonte: Valor Econômico, 29/04/2005, Brasil, p. A6

O impacto do aumento do salário mínimo para R$ 300 sobre os gastos da Previdência será menor do que a arrecadação gerada com esse reajuste. Os custos para o governo serão, mensalmente, da ordem de R$ 389 milhões. No entanto, a massa de contribuições decorrente dessa elevação ficará em torno de R$ 481 milhões mensais, 23,6% a mais do que os gastos, segundo cálculos que incluem somente as contribuições diretas estimadas por Claudio Dedecca, professor do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), da Universidade de Campinas (Unicamp). Ao mesmo tempo, a massa total de rendimentos da população brasileira terá um incremento de 6,45% ao ano, sendo que só para os trabalhadores formais, a valorização a massa ficaria em 6,3%. Com isso, argumento de que o governo não pode conceder aumentos maiores para o piso salarial por causa do impacto sobre os gastos com a Previdência fica fragilizado, na avaliação de Dedecca. "Se é verdade que a política de valorização do mínimo aumentaria o gasto, é certo que ela também aumentaria as receitas" diz ele. Para Milko Matijascic, economista e ex-assessor especial do Ministério da Previdência Social, os efeitos financeiros da elevação dos benefícios até um salário mínimo sobre a tributação são mais modestos do que sobre o Produto Interno Bruto (PIB) e não exercem uma pressão insuportável sobre as finanças públicas. Segundo ele, ao longo dos últimos anos, a participação anual dos benefícios pagos pelo INSS sobre a carga tributária da União "sofreu poucas mudanças". Ela era de 44,6% em 1993 e ficou em 45,8% no ano passado. A maior restrição a reajustes maiores para o mínimo está na política econômica ortodoxa adotada pelo governo e não pelo impacto nas contas públicas, avalia Dedecca. O professor enfatiza que o governo precisa encarar a política para o salário mínimo com uma "estratégia de elevação do rendimento básico da economia", que irá contribuir para o crescimento econômico e estimular o nível de atividade e o emprego. Mesmo no cenário de orçamento restrito, o movimento sindical vê no atual momento de progresso econômico do país uma janela de oportunidade para o estabelecimento de políticas de recomposição do poder de compra do salário mínimo a médio e longo prazos. Luiz Marinho, presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), calcula que um aumento real de 8,7% no mínimo durante os próximos vinte anos, levaria o salário a um patamar de R$ 1,4 mil, considerado o necessário para o sustento de uma família com dois adultos e duas crianças, de acordo com o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Sócio-Econômicos (Dieese). "Vinte anos é muita coisa? É. Mas se tivéssemos estabelecido diretrizes para a recomposição do mínimo há vinte anos, os trabalhadores não estariam nessa situação hoje", explica. Paula Montagner, coordenadora do Observatório do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), vê o salário mínimo como um instrumento eficaz e fundamental para a redução da desigualdade no país, uma vez que seu aumento se dissemina ao longo do mercado de trabalho e impulsiona a massa de rendimentos. Considerando os assalariados, aposentados e beneficiários do seguro desemprego com uma única fonte de renda (um salário mínimo) e uma família com três integrantes, a coordenadora calcula que 37% da população brasileira é diretamente beneficiada com o reajuste do piso nacional. "Sem contar que ele funciona como indexador de salários, pois é o principal farol para o reajuste dos informais, empregadas domésticas e profissionais liberais", argumenta.