Título: EUA buscam cooperação na área de energia
Autor: Balthazar , Ricardo
Fonte: Valor Econômico, 13/03/2009, Brasil, p. A6

Os Estados Unidos indicaram ontem que estão interessados em desenvolver novos mecanismos de cooperação na área energética para aprofundar suas relações com o Brasil e outros países da América Latina, um tema que tende a dominar boa parte da conversa que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá amanhã com o presidente Barack Obama, em Washington.

O interesse dos americanos pelo assunto poderá gerar oportunidades valiosas para o Brasil, que deseja ampliar as exportações de etanol para os EUA e deve aumentar de forma significativa a produção de petróleo nos próximos anos, com o início da exploração dos campos descobertos na área conhecida como pré-sal, na bacia de Santos.

Lula será recebido por Obama na Casa Branca por uma hora. Ele estará acompanhado na maior parte do tempo por uma comitiva que incluirá os ministros da Casa Civil, Dilma Rousseff, e Relações Exteriores, Celso Amorim. Lula terá 20 minutos a sós com Obama no fim do encontro. Será o primeiro contato pessoal dos dois presidentes, que falaram duas vezes por telefone nos últimos meses.

A busca de novos mecanismos de cooperação na área energética também está no topo da agenda da próxima Cúpula das Américas, reunião de líderes regionais que será realizada em abril, em Trinidad e Tobago. O encontro é visto no governo Obama como uma oportunidade para refazer as relações dos EUA com a América Latina, que esfriaram muito nos últimos anos.

"Estamos à procura do melhor meio de maximizar o uso dos recursos energéticos existentes na região, de forma cooperativa", disse ontem em Washington o ex-embaixador dos EUA no México e na Venezuela Jeffrey Davidow, que assessora a Casa Branca nos preparativos para a reunião de abril. "Podemos trocar experiências e tecnologia com os países que quiserem nos acompanhar."

Davidow indicou que a Casa Branca está mais interessada em acordos bilaterais com alguns países do que iniciativas mais ambiciosas de caráter regional. "Alguns governos estarão mais dispostos a trabalhar com outros países e outros estarão menos interessados", disse Davidow. Ele classificou como "excelente" a relação estabelecida entre o Brasil e os EUA nessa área e disse que ela pode ser ampliada.

O Brasil e os EUA assinaram há dois anos um acordo para promover o consumo de biocombustíveis como o etanol, mas os resultados até agora foram pífios. Os EUA mantiveram barreiras comerciais que impõem ao álcool importado do Brasil e nenhum investidor privado quis apostar nos países do Caribe em que os dois governos preferiram concentrar esforços.

Representantes das usinas de álcool brasileiras pediram a Lula que aproveite o encontro com Obama para propor a ampliação desse pacto, numa tentativa de abrir espaço no mercado americano e assegurar vantagens para os usineiros brasileiros no mercado de créditos de carbono que Obama pretende criar para combater as mudanças climáticas.

O senador Richard Lugar, um político influente que simpatiza com as aspirações do Brasil nessa área, apresentou ontem no Senado um projeto que amplia o acordo do Brasil com os EUA. "Nossos esforços para reduzir a dependência de petróleo poderiam ser auxiliados por parcerias vigorosas com nossos vizinhos", disse o senador, um republicano moderado, cujos conselhos Obama costuma ouvir com atenção.

O projeto de Lugar cria um mecanismo institucional formal para discussão de políticas energéticas entre o Brasil, os EUA e outros países da América Latina, sugere o estabelecimento de parcerias para a exploração de petróleo e outros recursos naturais e propõe a criação de um fórum para discussão de assuntos regulatórios, com participação de governos e setor privado.

O petróleo do pré-sal foi descoberto poucos meses após a assinatura do acordo sobre biocombustíveis. O achado despertou enorme interesse nos EUA, que importam mais da metade do petróleo que consomem e estão preocupados com o declínio da produção em dois dos seus maiores fornecedores, México e Venezuela. Analistas estimam que o pré-sal guarde mais de 50 bilhões de barris de petróleo, o equivalente a dez vezes o que os EUA importaram no ano passado.

O governo dos EUA não compra petróleo nem escolhe os fornecedores das refinarias do país. Mas as autoridades americanas têm expressado interesse em assegurar que a exploração dos novos campos seja feita com participação de grupos estrangeiros e mecanismos que ofereçam proteção a seus investimentos.

Uma das maiores companhias americanas de petróleo, a ExxonMobil, controla um bloco no pré-sal e anunciou neste ano duas descobertas na área. Ela tem como sócias no projeto a americana Hess e a Petrobras, que tem participação de 20%. Fornecedores americanos de equipamentos para exploração também estão de olho nos investimentos que serão realizados no Brasil.

Os EUA sabem que qualquer iniciativa que possa ser interpretada como uma interferência indevida será mal recebida. Num encontro com funcionários do Itamaraty há uma semana, diplomatas americanos manifestaram curiosidade sobre o novo modelo em estudos em Brasília para a exploração de petróleo no país, mas não insistiram depois de ouvir que o debate sobre a questão ainda não terminou.