Título: Ajuste na indústria continua em janeiro
Autor: Lamucci , Sergio
Fonte: Valor Econômico, 04/02/2009, Brasil, p. A4

O processo de ajuste da produção industrial continuou em janeiro. Embora algumas empresas tenham registrado recuperação em relação a dezembro e alguns indicadores preliminares sugiram isso, como o consumo de energia, os relatos são praticamente unânimes em apontar um desempenho bem pior do que o de janeiro de 2008 e do período anterior ao agravamento da crise. Os níveis de estoques ainda seguem elevados em alguns setores, como o de distribuição de aços planos e eletroeletrônicos, e as encomendas, fracas. Raphael Gunther

Germano Costa, gerente comercial da Brandili: baixa reposição de estoques levou a uma queda nas vendas de janeiro

A distribuição de aços planos atingiu cerca de 210 mil toneladas em janeiro, mais que as 145,5 mil de dezembro, segundo Carlos Loureiro, presidente da Rio Negro. O resultado indica uma melhora em relação ao último mês de 2008, mas nem por isso Loureiro comemora. "Havia cinco bodes na sala e tiraram três. Melhorou, mas ficaram dois." Ele observa que a distribuição caiu 33,5% em relação a janeiro de 2007, e estima que a rede terminou janeiro com estoques equivalentes a quatro meses de vendas - o normal são 2,6 meses.

Loureiro conta que as encomendas diminuíram principalmente por parte da indústria automobilística e dos fabricantes de máquinas agrícolas e rodoviárias. Nesse cenário, nos dois primeiros meses de 2009 as empresas de distribuição devem reduzir em 10% o quadro de funcionários, hoje de 15 mil, afirma ele. Para este ano, Loureiro espera queda de 5% das vendas, na melhor hipótese. Em 2008, houve crescimento de 12,2%.

O presidente da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Humberto Barbato, diz que janeiro foi um mês que o setor gostaria de esquecer: o nível de produção ficou próximo do registrado em dezembro, mas abaixo de igual mês de 2008.

Uma pesquisa realizada com os associados da Abinee aponta para um quadro preocupante para os próximos meses: 72% dos entrevistados disseram que as encomendas ficaram abaixo do registrado em dezembro de 2008. "Além disso, 64% das empresas disseram que os novos pedidos foram inferiores às expectativas." Segundo Barbato, os fabricantes de telefones celulares e de bens de informática são os que mais sofrem no momento.

No Polo Industrial de Manaus (PIM), janeiro não foi um bom mês. O diretor-executivo da Federação das Indústrias do Estado do Amazonas (Fieam), Flávio Dutra, acredita que o desempenho foi pior do que em dezembro e muito mais fraco que no mesmo mês do ano passado. Os estoques de eletroeletrônicos, diz ele, seguem acima do desejado. Dutra diz que algumas empresas desse segmento ainda estão em férias coletivas, assim como algumas do setor de duas rodas, e demissões continuaram a ocorrer em janeiro.

Para a Brandili, fabricante catarinente de roupas para o segmento infantil, o ano não começou bem, conta o gerente-comercial, Germano Costa. Houve aumento dos estoques em janeiro pela baixa reposição de peças pelos varejistas, o que fez a empresa registrar vendas 15% menores em relação a janeiro do ano passado. "Programações de compras pelos lojistas foram canceladas porque o mercado parou."

A Brandili não deu férias coletivas no fim do ano. A empresa, segundo ele, também não realizou demissões em massa, mas reduzir as horas extras e paralisou um plano de expansão. Costa espera uma melhora das vendas nos próximos meses por uma estratégia de venda de produtos de menor valor agregado recém-adotada. Neste início de ano a empresa vende as peças da coleção de inverno. "Esta estratégia já deu alguns sinais de melhora nas vendas", diz ele, afirmando que em fevereiro a empresa deve crescer pelo menos 20% em vendas em relação a fevereiro de 2008.

A valorização do dólar em relação ao real garantiu a indústrias do setor têxtil, em dezembro e janeiro, resultados um pouco melhores que os de outros setores industriais. A Marisolregistrou crescimento entre 5% e 6% na produção em janeiro, em comparação com o mesmo mês de 2008, afirmou o diretor-financeiro do grupo, Devanir Danna. A Marisol concedeu férias coletivas de 15 dias, mesmo intervalo de anos anteriores

De acordo com o executivo, a carteira de pedidos para a coleção outono-inverno, que começou a ser produzida em janeiro, indica que a empresa terá crescimento no primeiro trimestre em relação a 2008. "O cenário tem mudado muito rapidamente, mas por enquanto os sinais são confortáveis", afirmou. Ele observa que a Marisol encerrou dezembro com estoques abaixo da média e não realizou demissões ou tomou qualquer medida para reduzir o ritmo de produção.

Já a Teka encerrou janeiro com produção 10% abaixo do planejado, segundo o diretor de comércio exterior e marketing, Marcello Stewers. "A empresa já trabalhava com a perspectiva de produzir menos que no ano passado." Em dezembro, a Teka produziu 12% abaixo do planejado.

Stewers afirmou, no entanto, que a indústria têxtil teve bastante dificuldade de exportar em 2007 e 2008, mas que, após a alta do dólar a partir de setembro, houve uma melhora nas encomendas para o mercado externo. "O setor têxtil está voltando a exportar, mesmo com a crise", disse.

Na Igasa, do Paraná, que faz tanques de combustível, cárteres e outras peças para veículos, as últimas semanas foram de poucos negócios. Seu maior mercado é o de reposição, mas a empresa também atende montadoras e exporta. "Temos representantes espalhados por todo o país, mas janeiro foi terrível", conta o diretor-industrial, Edgard Gonçalves Júnior, que tenta conseguir capital de giro no BNDES. "Não demitimos. Fizemos sacrifício e queimamos gordura."

O presidente do Sindimetal Paraná, Roberto Karam, diz que, para as fabricantes de peças para automóveis e eletrodomésticos do Estado, janeiro não foi bom. Na comparação com 2008, a queda nas vendas é estimada em 14%.

Ivan Oliveira, diretor-administrativo da Moval Móveis, de Arapongas (PR), informa que vendeu 8% mais (em volume) em janeiro, na comparação com o mesmo mês do ano passado. "Está dentro da expectativa." O executivo explicou que o último quadrimestre do ano costuma ser o melhor para o segmento. Em janeiro, há o movimento de reposição de estoques do varejo. Agora vem a preocupação com o que vai acontecer nos próximos meses. "Se 2009 empatar com 2008 em volume, está bom." No fim do ano passado a Moval, que opera com dois turnos, chegou a criar um terceiro, mas recuou na estratégia e dispensou 80 pessoas.

No polo têxtil de Caruaru, no agreste pernambucano, os fabricantes de roupas começam a ficar preocupados com o desempenho das empresas ao longo de 2009. A demanda em janeiro ficou cerca de 10% inferior à registrada no mesmo mês do ano passado, segundo informações do Sindicato das Indústrias do Vestuário de Pernambuco. "O mercado está bastante parado. Com as notícias de crise, parece que todo mundo se retraiu", diz Maria José da Silva, sócia da Tavernit, lavanderia e fabricante de jeans. Em dezembro, diante da menor demanda, a empresa demitiu 20% dos funcionários, o que equivaleu a 24 pessoas.

De acordo com Fredi Maia, presidente do Sindivest, diversas outras empresas do polo caruaruense deram férias coletivas a seus empregados por causa da retração nas vendas. A Rota do Mar, que fabrica 150 mil peças de roupas por mês, viu as vendas encolherem 15% no primeiro mês do ano em relação janeiro de 2008, depois de terem crescido 25% em dezembro. Apesar disso, para o ano, o empresário Arnaldo Xavier, dono da empresa, espera um crescimento de 18% no faturamento.

Depois do tombo ocorrido no quarto trimestre de 2008, a expectativa dos economistas é de uma alta da produção industrial em janeiro na comparação com dezembro, na série com ajuste sazonal. A LCA Consultores nota que, no mês passado, os licenciamentos de automóveis e comerciais leves avançaram 5,9%, o consumo de energia elétrica cresceu 0,6%, e o indicador de produção prevista da sondagem da Fundação Getúlio Vargas (FGV), 8,1%. Isso pode garantir uma expansão em janeiro de 10% para a produção em relação a dezembro, diz o economista-chefe da LCA, Bráulio Borges. Sobre janeiro de 2008, porém, ele espera uma queda de 10%, por causa da elevada base de comparação. O BNP Paribas acredita em alta de 4,5% em relação a dezembro, mas recuo de 15% sobre janeiro do ano passado.