Título: Brasil revê projetos de cooperação com Quito
Autor: Rittner , Daniel
Fonte: Valor Econômico, 26/11/2008, Internacional, p. A8

Cerca de 30 projetos de cooperação técnica entre o Brasil e o Equador - em áreas como tecnologia da informação, saúde e ambiente - estão sendo reavaliados pelo governo brasileiro. O processo sugere uma retaliação contra a decisão do governo equatoriano de contestar uma dívida com o Brasil.

O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) já recebeu notificação da Câmara de Comércio Internacional informando que as autoridades equatorianas recorreram contra o contrato de financiamento da usina hidrelétrica de San Francisco, construída pela brasileira Odebrecht.

O contrato é de US$ 242,9 milhões, mas subiu para US$ 462 milhões, em valores atuais, devido à correção e aos juros. Ele prevê pagamento em dez anos, em parcelas semestrais. O teste de fogo virá no dia 29 de dezembro, quando vence uma parcela de US$ 28 milhões, informou ontem o embaixador do Brasil em Quito, Antonino Marques Porto e Santos, em audiência pública no Senado. Ontem o Equador indicou que deve pagar essa parcela.

Santos disse ter visto sinais positivos em declarações dadas pelo ministro de Setores Estratégicos equatoriano, Galo Borja, de que o Equador fará os próximos pagamentos até que haja um posicionamento da arbitragem internacional. "Isso já é uma maneira mais positiva de encaminhar a questão", observou o embaixador brasileiro.

"Fomos prudentes e firmes", afirmou Santos, a respeito da atitude do Itamaraty de convocá-lo para consultas, em meio a senadores que criticaram uma suposta passividade do governo brasileiro em relação a medidas tomadas por países vizinhos.

"O Brasil está errado porque aceita tudo passivamente", criticou o senador Gerson Camata (PMDB-ES).

Santos disse que não há contestações pelo Equador de outros financiados realizados pelo BNDES. Ele esclareceu também que a venda de 24 aeronaves militares Super Tucano da Embraer não envolve operações de crédito do banco brasileiro e que o negócios foi feito com recursos próprios do Equador.

No entanto, o diplomata reconheceu que, além de prejudicar o CCR (sistema de compensação para o pagamento de exportações de bens e serviços), a medida equatoriana pesará contra novos empréstimos do BNDES. "É evidente que [isso] vai entrar em consideração antes de qualquer novo [financiamento]", admitiu.

De acordo com o embaixador, não há "sentimento antibrasileiro" nem "clima de guerra" contra o Brasil, mas "o tipo de reação tomada pelo governo e pelo Itamaraty foi muito adequado à situação e manifestou o nosso desconforto com a natureza e o fato como o fato foi anunciado".

Santos citou, como exemplo de projetos em fase de revisão, a ligação rodoviária Manta-Manaus. O empreendimento, além de unir os oceanos Atlântico e Pacífico, visava aumentar o fluxo de comércio na fronteira, principalmente com o fornecimento de material sanitário e de cimento equatorianos para o Brasil, na tentativa de diminuir o crescente desequilíbrio nas relações comerciais entre os dois países. Há grande expectativa de empresários equatorianos em relação a esse projeto rodoviário.

Segundo Santos, são aproximadamente 30 projetos bilaterais em fase de execução. Um deles, por exemplo, envolve a capacitação de funcionários equatorianos na área de governo eletrônico. No setor agrícola, há projetos de organização da fruticultura tropical no litoral do país vizinho e de manejo e processamento para a cultura de cacau.