Título: Falta de lei emperra plano da Varig
Autor: Vanessa Adachi
Fonte: Valor Econômico, 24/02/2005, Empresas &, p. B1

O plano de recuperação da Varig, que se apoiará na nova Lei de Falências, tem um obstáculo importante à frente. Embora as novas regras tenham sido sancionadas pelo presidente da República no início do mês, falta ainda a aprovação de uma lei complementar que definirá as condições para o parcelamento das dívidas tributárias das empresas que aderirem à recuperação judicial. Sem esse texto, que está na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, não só a Varig, mas todas as candidatas à recuperação judicial terão problemas para colocar seus planos em prática. Como se sabe, mais da metade das dívidas da Varig - cerca de R$ 3 bilhões - são com o Fisco e a Previdência. Atualmente, esses débitos estão parcelados em 15 anos no Paes (programa de parcelamento especial) e representam um desembolso mensal para a companhia de mais de R$ 20 milhões. Pela nova Lei de Falências, as dívidas com o Fisco não entram na recuperação judicial. Ou seja, o Fisco não participa do comitê e da assembléia de credores das companhias. Daí a necessidade da lei complementar. A interpretação da equipe que trabalha no projeto da Varig é que, sem a aprovação da lei complementar, o plano fica comprometido. Esse é uma das principais dificuldades encontrada até agora. O Valor procurou o senador Fernando Bezerra (PTB-RN), autor do projeto de lei complementar (245/2004) que tratará do parcelamento dos débitos tributários e recebeu dele a informação de que a Varig tenta alterar o texto do projeto de lei. "Fui procurado por um grupo da Varig que foi encaminhado a mim pelo vice-presidente José Alencar", disse Bezerra. O senador citou os dois pontos que a Varig gostaria de ver no texto. O primeiro seria o parcelamento dos débitos por 420 meses, o que equivaleria a 35 anos. Hoje, o projeto prevê prazo muito inferior: 72 meses (seis anos) ou 84 meses (sete anos), dependendo do caso. Vale notar que esses prazos são inferiores também aos 15 anos que a Varig tem hoje no Paes. Além disso, a companhia teria proposto também a inclusão de um artigo para eliminar o imposto de renda sobre o lucro auferido com a venda de ações de empresas em recuperação judicial. "Como as ações da Varig valem muito pouco hoje, caso elas sejam vendidas em condições melhores, haveria um lucro tributável", disse o senador. Bezerra disse que procurou o secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Marcos Lisboa, para fazer consultas sobre as propostas da aérea. "Ele disse que as modificações pedidas são muito profundas e que a Fazenda não concorda", afirmou o senador. "Vamos encaminhar a lei para aprovação da forma como foi feita." Como o texto está em tramitação, no entanto, modificações podem ser feitas pelo relator, o senador Tasso Jereissati, ou ainda por outros parlamentares. Bezerra estima que, "com muito otimismo", a lei complementar poderá ser aprovada no Senado e na Câmara dos Deputados no prazo de 120 dias, quando entra em vigor a nova Lei de Falências. Mas o risco de isso não acontecer é grande. Bezerra acredita que empresas que, como a Varig, estão no Paes, poderão optar por continuar com esse parcelamento se considerarem que as condições da lei complementar são menos vantajosas. Não é o mesmo parecer jurídico que a equipe do Unibanco, que assessora a Varig, obteve. O Valor procurou dois especialistas em direito falimentar que não quiseram falar especificamente do caso Varig, mas apenas da lei de forma genérica. Luiz Fernando Valente de Paiva, do Pinheiro Neto, disse que, sem a lei complementar, a empresa que pedir recuperação judicial ficará numa espécie de "limbo". "Mesmo que os credores aprovem o plano de reestruturação, o juiz não poderá aprovar a recuperação porque não terá a negativa de débito fiscal, que é um pré-requisito." Paiva acredita, no entanto, que o devedor pode optar por manter-se no Paes. O advogado Renato Mange é mais radical. "Sem a negativa de débito fiscal, melou a recuperação judicial." Os consultores contratados pela Varig vêm trabalhando em uma estrutura para separar o negócio da Varig, que é interessante, de sua situação patrimonial caótica. Uma das possibilidades avaliadas, segundo fontes qualificadas, é criar uma subsidiária que absorveria os ativos e parte do passivo e poderia ser vendida a novo controlador, o que a Lei de Falências permite. Essa seria uma forma eficiente de garantir a blindagem para que o novo controlador não seja responsabilizado por dívidas fiscais e previdenciárias do passado. No entanto, segundo uma fonte, esse formato tem ao menos um inconveniente: o alto custo trabalhista para demitir os funcionários e readmiti-los na nova empresa.