Título: BC demite Torós e contrata Aldo Luiz
Autor: Nunes, Vicente
Fonte: Correio Braziliense, 17/11/2009, Economia, p. 13

A fim de evitar interferência de Mantega, Meirelles age rápido, consulta Palocci e escolhe um funcionário de carreira do BB para ocupar Diretoria de Política Monetária. O rearranjo inclui compromisso de Mesquita e de Matos do Vale de não saírem até abril

Aldo Luiz não se incomoda em ficar pouco tempo na diretoria do órgão

O presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, demitiu ontem Mário Torós, 46 anos, da Diretoria de Política Monetária da instituição. Ele será substituído por Aldo Luiz Mendes, 51, funcionário de carreira do Banco do Brasil (BB), que terá o nome submetido ao presidente Lula ainda na manhã de hoje, no Palácio da Alvorada. A demissão de Torós, cuja permanência no cargo estava insustentável, foi definida na sexta-feira, depois da publicação da entrevista que ele deu ao jornal Valor Econômico. Torós não só revelou detalhes sigilosos da ação do BC no auge da crise mundial, como divulgou os nomes de bancos que foram vítimas de saques maciços e insinuou que um diretor da instituição teria usado informação privilegiada para favorecer o BB na compra do

Banco Votorantim, que estava à beira do colapso. As revelações criaram um constrangimento enorme dentro do governo.

Diante da necessidade de demitir Torós, Meirelles conseguiu tirar o compromisso de outros dois diretores do BC, Mário Mesquita (Política Econômica) e Gustavo Matos do Vale (Liquidações), de permanecerem nos cargos até o início de abril. É quando se espera que Meirelles se desligue do banco para concorrer a um cargo político pelo PMDB de Goiás. Tanto Mesquita quanto Vale estão demissionários e tinham a intenção de se desligarem do BC até o fim do ano. Meirelles argumentou que a saída dos dois, depois do desastre provocado por Torós, seria vista pelo mercado como um sinal de debandada e de mudança imediata na postura do banco na condução da política de juros.

Meirelles definiu o nome de Aldo Luiz Mendes no fim de semana, depois de uma longa conversa com o ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci. A estratégia pela rápida substituição de Torós, que havia tomado posse em 26 de abril de 2007, foi a de não dar espaço para que o ministro Guido Mantega interferisse numa decisão que cabe exclusivamente ao presidente do BC. Palocci ficou muito próximo de Aldo Mendes quando esteve na Fazenda, a ponto de, em 2005, nomeá-lo para vice-presidente de Finanças do BB. A carreira de executivo no BB começou, porém, em 2001, quando ascendeu ao cargo de diretor de Finanças sob a tutela do então ministro da Fazenda, Pedro Malan.

Trânsito com Tombini Como funcionário de carreira do Banco do Brasil ¿ atualmente, ele preside a Companhia de Seguros Aliança do Brasil, controlada pela instituição, para onde seguiu depois de ser exonerado da Vice-Presidência do BB por Mantega ¿, Aldo não se intimidou com o fato de, a princípio, ficar no cargo por pouco mais de um ano. Nem mesmo a disposição de Meirelles de ir para a política o perturbou, pois tem trânsito livre com o provável sucessor do presidente do BC, Alexandre Tombini, hoje diretor de Normas. Mendes ¿ um maratonista e torcedor do Fluminense ¿ também tem trânsito livre com Gustavo do Vale, que já foi diretor do BB.

¿A indicação do Aldo foi vista como um alívio dentro do BC, devido ao constrangimento criado por Torós. Há muito tempo não se via um clima tão ruim dentro do banco¿, disse ao Correio um dos mais respeitados técnicos da instituição. Ele ressaltou que, nos últimos dois anos, tentou-se, de todas as formas, contornar as dificuldades de convivência entre Torós e Tombini. ¿Mas, agora, com as declarações ao Valor, a situação desandou de vez. Primeiro, porque Torós se mostrou como um super-homem, o salvador da pátria no auge da crise. Segundo, porque citou todos os diretores do BC, menos Tombini. Isso foi mortal. Por isso, Torós ficou sem espaço dentro do BC¿, acrescentou.

O mesmo técnico lembrou que Torós já havia pedido para deixar o BC há pelo menos três meses, alegando motivos pessoais, o que, oficialmente, foi apresentado ontem pelo banco como a real razão de seu desligamento. ¿Simplesmente, com a entrevista, ele antecipou o processo e está deixando a instituição de uma forma muito ruim, totalmente queimado no governo e no mercado¿, afirmou um dos mais próximos assessores do presidente Lula. Ele ressaltou que, apesar de a demissão estar concretizada, o presidente Lula convocou Meirelles para uma conversa hoje no Alvorada. Quer saber os reais motivos que levaram Torós a fazer o que fez.

Lula também quer acertar com Meirelles a estratégia para acelerar a sabatina de Aldo Mendes na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Ninguém quer que Torós permaneça no banco por muito mais tempo. Muito menos que ele participe da próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom). Torós, por sinal, representou ontem o BC em um seminário no Rio, mesmo já sabendo de sua substituição. Por isso, fugiu da imprensa. A ordem era deixar a assessoria do banco anunciar oficialmente a demissão.

Vítima Ao lado do Banco Safra, o Votorantim foi uma das instituições financeiras que mais sofreram saques durante o auge da crise financeira, em outubro de 2008. A suspeita é de que a instituição foi atingida em razão de investimentos em derivativos. Dois meses depois, em 9 de janeiro, o Banco do Brasil anunciou a compra de 50% do Votorantim por R$ 4,2 bilhões, o que aumentou sua participação no setor de financiamento de veículos.