Título: Dilma manda fazer pente-fino em processos
Autor: Damé, Luiza; Krakovics, Fernanda
Fonte: O Globo, 27/11/2012, País, p. 6

Órgãos abrirão sindicâncias; Adams, da AGU, defende adjunto afastado, mas diz que perdeu confiança.

Depois de demitir ou afastar todos os indiciados pela Polícia Federal na Operação Porto Seguro por envolvimento num esquema de corrupção, a presidente Dilma Rousseff determinou ontem a realização de um pente-fino nos órgãos federais e agências reguladoras que tiveram servidores envolvidos no escândalo. Pareceres da Advogacia Geral da União (AGU), da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Agência Nacional de Tranportes Aquaviários (Antaq) e Agência Nacional de Águas (ANA) serão revistos. Três comissões de sindicância foram designadas para apurar irregularidades.

À noite, em entrevista ao GLOBO, o ministro-chefe da AGU, Luís Inácio Adams, defendeu o ex-advogado-geral adjunto da União José Weber de Holanda Alves, que até sábado era seu braço direito, mas reconheceu que perdeu a confiança profissional no assessor, que é suspeito de receber propina em troca de um parecer.

Adams disse que conhece Weber há 10 anos, frequenta a casa dele, mas concordou com a decisão da presidente Dilma de exonerá-lo. A AGU anunciou a suspensão dos efeitos jurídicos de parecer que teria sido usado pelo ex-senador Gilberto Miranda (PMDB-AM) para permanecer na Ilha das Cabras, em Ilhabela, litoral paulista. Miranda construiu uma mansão e um heliporto na ilha, que é um bem da União. Ele teria sido beneficiado por um parecer de Weber, que foi também afastado da suplência do conselho deliberativo do fundo da previdência complementar do funcionalismo, o Funpresp.

- Temos uma relação de amizade. Eu frequento a casa dele, ele frequenta a minha casa. Mas não tenho mais confiança profissional (em Weber). A pessoa que conhece o ser humano Weber, como eu, acredita que ele vai esclarecer tudo, mas a relação profissional não se sustenta mais. As pessoas muitas vezes fazem opções erradas, e a vida traz esses percalços - disse Adams, explicando que os dois se conheceram quando o ministro do Supremo Gilmar Mendes era o chefe da AGU, no governo Fernando Henrique Cardoso.

Segundo o ministro, o processo de 2003 envolvendo Weber em irregularidades em contratos do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) foi arquivado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Adams disse que só convidou Weber para o cargo na AGU após o arquivamento do processo. Servidor de carreira da AGU, assim como Adams, Weber será alocado em alguma unidade da instituição, segundo o ministro.

Adams afirmou ainda que Weber não participou das discussões sobre o modelo do setor elétrico, de portos e de aeroportos, todos em debate no governo com a participação da AGU. O ministro disse que dessas reuniões, além dele próprio, participam o vice-advogado-geral, Fernando Faria, e o procurador-geral Federal, Marcelo Siqueira.

Ontem, Adams esteve duas vezes com a presidente, no Palácio do Planalto, mas desconversou sobre as avaliações de que é - ou era - o novo homem de confiança de Dilma.

- A presidente tem me chamado e continua me chamando. A confiança foi conquistada com o meu trabalho. Se sou mais ou não, não vou ficar falando. Eu posso dizer que vou prestigiar essa confiança da presidente. O que posso oferecer é uma opinião jurídica, que só vale se for aceita. Eu acho que a presidente mantém a confiança - disse Adams.

Na Agência Nacional de Águas (ANA), apesar de ressaltar que a operação da Polícia Federal não envolve a instituição, o comando decidiu analisar todas as decisões tomadas por Paulo Vieira, afastado do cargo de diretor de Hidrologia, após ser indiciado e preso.

- Na reunião de hoje (ontem), decidimos fazer um levantamento dos votos ou dos assuntos originários da área dele. Vamos fazer um acompanhamento. A princípio, não há nada, mas vamos olhar caso a caso. Nenhuma das ações (ilegais) dele envolveu a ANA, de acordo com a própria Polícia Federal - disse o diretor-presidente da agência, Vicente Andreu.

Os servidores que compunham o gabinete de Paulo Vieira também foram demitidos ontem. O dirigente da ANA afirmou que a demissão de Vieira não terá implicações na queda de braço travada entre os consórcios que operam as usinas de Jirau e Santo Antônio. Em 26 de outubro, o consórcio Energia Sustentável do Brasil (ESBR) - que opera Jirau - entrou com representação junto à ANA questionando o parecer que a entidade havia dado ao consórcio Santo Antônio Energia (SAE), favorável à ampliação da cota do seu reservatório de 70,5m para 71,3m, para a instalação de seis turbinas adicionais.

O diretor-presidente da ANA afirmou que o assunto não estava vinculado a Paulo Vieira, e que o litígio é mais da alçada da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel:)

- A área dele (Vieira) não tem vinculação direta com a parte relativa à outorga.

MEC também fará sindicância

Além das demissões e afastamentos, a presidente Dilma determinou que a Casa Civil e os ministérios do Planejamento e da Educação criem comissões de sindicância para apurar, em 30 dias, irregularidades apontadas pela operação da PF. As exonerações e os afastamento de servidores indiciados pela Polícia Federal foram publicadas ontem no Diário Oficial da União.

A decisão do governo de estender o pente fino para a Antaq se justifica pelo fato de Paulo Vieira ter sido, antes de chegar à ANA, ouvidor da Agência de Transportes Aquaviários. Vem daí a sua suposta relação com o setor portuário. O objetivo também é analisar a eventual participação de Vieira em decisões da Antaq.

- Os procuradores das agências reguladoras farão novas análises de todos os processos administrativos envolvidos no inquérito para reenviá-los às diretorias, se necessário - afirmou o procurador-geral, Marcelo Siqueira.