Título: Argentina debate redução da idade de voto para 16 anos
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 05/09/2012, Mundo, p. 28

Para oposição, projeto visa à mudança para permitir reeleger Cristina

BUENOS AIRES O Senado argentino começa a debater hoje um novo projeto do kirchnerismo que já provoca polêmica no país: reduzir de 18 para 16 anos a idade mínima para o voto. A proposta, de um grupo de senadores da Frente para a Vitória (sublegenda do peronismo fundada pelo ex-presidente Néstor Kirchner), surgiu entre denúncias sobre atividades partidárias em escolas organizadas pelo grupo de jovens La Cámpora - partidário dos Kirchner- e, também, diante do debate cada vez mais intenso sobre uma possível reforma constitucional que permita a reeleição presidencial indefinida.

Segundo a oposição, o principal objetivo dessa nova ofensiva da Casa Rosada no Parlamento é obter uma vitória esmagadora nas eleições legislativas de 2013 e, com o controle absoluto de ambas as câmaras, dar sinal verde às mudanças constitucionais necessárias para permitir uma terceira candidatura da presidente Cristina Kirchner, em 2015.

O documento que a Comissão de Assuntos Constitucionais do Senado analisa hoje foi redigido pelo senador Anibal Fernández, ex-chefe de gabinete de Cristina. O texto propõe, ainda, que estrangeiros com mais de dois anos de residência na Argentina também possam votar em eleições nacionais.

Igreja denuncia doutrinaçãO

Setores da oposição estimam que somente os jovens entre 16 e 18 anos representariam em torno de 700 mil votos. A participação eleitoral dos menores de 18 anos seria voluntária, mas o kirchnerismo e os jovens de La Cámpora - grupo liderado pelo filho da presidente, Máximo Kirchner - apostam no entusiasmo de seus eventuais novos seguidores.

- Este governo se caracteriza por ampliar fronteiras; neste caso, estamos ampliando a fronteira dos direitos dos mais jovens - disse o ministro do Interior, Florencio Randazzo.

O argumento não convenceu a oposição, que denunciou uma suposta manobra do governo para avançar no caminho da "eternização de Cristina no poder" - embora os opositores estejam de acordo com a essência do projeto.

- O único interesse do kirchnerismo é obter os votos necessários para a reforma constitucional - disse o deputado radical Juan Tunessi.

Para a deputada Patricia Bullrich, "o projeto governista busca envolver os jovens numa disputa política em torno da reeleição". A iniciativa também foi questionada por juristas como Daniel Sabsay, que relacionou a proposta à presença de La Cámpora nas escolas. As atividades do grupo foram criticadas pela Igreja, que acusou-o de tentar "doutrinar" jovens até em colégios católicos.

Longe de mostrar-se preocupada pelo escândalo desencadeado por eventos organizados pelos jovens K em escolas do interior do país, como Tandil, na província de Buenos Aires, Cristina defendeu a cada vez mais poderosa tropa liderada por seu filho mais velho:

- Somos um país democrático que gosta de discutir política em casa, na rua, nas escolas e nas universidades.

No entanto, estudantes de Tandil contaram que o grupo La Cámpora suspendeu um debate sobre a situação escolar e o transporte público para impor uma atividade partidária - que incluiu a distribuição de livros com frases de Néstor e Cristina Kirchner.

A presidente, que no ano passado conquistou seu segundo mandato (o terceiro consecutivo da família Kirchner), evita falar numa nova releição. Em 1994, ela participou do processo de elaboração da atual Constituição, que permite apenas dois mandatos seguidos. Mas há quem defenda uma mudança constitucional.

- Cristina deixará de ser nossa líder quando o povo o decidir, não a Constituição - opinou Julio Pereyra, prefeito de Florencio Varela, na província de Buenos Aires.