Título: Por temor de recessão, bolsas despencam
Autor: Neder, Vinicius
Fonte: O Globo, 23/09/2011, Economia, p. 27

Programa do BC americano não estimula mercados. Bovespa tem queda de 4,82%

RIO, NOVA YORK e LONDRES. Os mercados se renderam ontem aos temores de que uma recessão global será incontornável. As bolsas despencaram em todo o mundo, com o movimento de vendas começando na Ásia, se acelerando na Europa e levando Wall Street ao seu pior encerramento do ano. No Brasil, o Ibovespa, índice de referência da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa), recuou ontem 4,82%, a 53.280 pontos, maior queda desde o rebaixamento da nota de crédito da dívida dos EUA pela agência Standard & Poor"s (S&P), em 5 de agosto, quando o Ibovespa caiu 8,08%.

O Dow Jones, principal indicador de Wall Street, perdeu 3,5%, a 10.733 pontos. A avaliação de muitos investidores é que o Comitê de Política Monetária (Fomc, da sigla em inglês) do Federal Reserve (Fed, o banco central americano) esgotou todas as suas armas para estimular a economia. Anunciado na última quarta-feira, o programa de estímulo da autoridade monetária americana, chamado Twist, para injetar US$400 bilhões na economia americana, não foi suficiente para estimular os mercados. Também pesou o informe sobre o setor industrial chinês, medido pelo banco HSBC, que apresentou queda pelo terceiro mês seguido.

Segundo especialistas no Brasil, a Bovespa seguiu o pânico generalizado em todos os mercados, ainda repercutindo o resultado da reunião do Fomc anteontem. Nenhuma das 68 ações do Ibovespa subiu. As ações preferenciais (PN, sem direito a voto) da Petrobras e da Vale, as mais líquidas do mercado, recuaram, respectivamente, 5,34%, a R$19,50, e 4,30%, a R$41,58.

Na avaliação do economista-chefe da corretora Gradual Investimentos, André Perfeito, a operação de recompra de títulos dos EUA pelo Fed já era esperada, mas o problema, para o mercado, são os sinais enviados pela autoridade monetária americana.

- A mensagem do Fed foi que a economia mundial não tem onde se apoiar - analisa Perfeito, completando que não há muito mais o que o Fed poderia fazer e que as soluções dependem de liderança política - Mas a situação só está assim por falta de liderança política.

Investidores correm para papéis do Tesouro dos EUA e para o dólar

Um outro informe sobre a zona do euro, intensificou as apostas de que a região está caminhando para uma recessão.

- Os mercados se apoiam em confiança e certeza. Nesse momento não há nenhum desses dois no horizonte - afirmou John Canally, estrategista econômico da LPL Financial, uma firma de investimento em Boston.

Ontem foi o segundo dia seguido de queda em Wall Street, após o anúncio do plano do Fed, que representou uma mudança de estratégia do banco central americano na luta contra a desaceleração econômica do país - uma aposta em juros baixos a longo prazo e programas de estímulos ao consumo de pessoas e empresas. O mercado, porém, não vê os bancos aumentando o volume de concessão de empréstimos.

- A probabilidade de voltar à recessão é maior agora do que em qualquer outro momento desde a recuperação (da crise de 2008) - disse Tim Quinlan, economista do banco Wells Fargo, para quem há 35% de chance de os EUA mergulharem em nova recessão.

Nos EUA, os investidores colocaram dinheiro em papéis do Tesouro americano, que são vistos como menos arriscados do que as ações, mesmo com o país lutando contra um déficit fiscal monumental. O rendimento sobre o título de dez anos alcançou 1,71%, o menor desde que o Federal Reserve de Saint Louis começou a registrar a variação desses papéis há 50 anos. Em fevereiro, quando o panorama não parecia tão sombrio, o rendimento estava em 3,66%. Os investidores também correram para o dólar americano, empurrando a cotação da moeda para cima em todo o mundo.

O S&P"s 500, índice mais amplo da economia americana, e o Nasdaq, do setor de tecnologia, caíram 3%. Os preços do petróleo recuaram 4,4%, em Londres, e 6,3%, em Nova York. Na Europa, Frankfurt caiu 4,96%; Londres, 4,67%; e Paris, 5,25%.

- As preocupações com a economia global hoje são ainda mais fortes do que a crise de dívida soberana, e não é porque o risco da crise de dívida soberana diminuiu, mas porque as preocupações com o crescimento global aumentaram - disse estrategista de ações da ING Investment Management, Patrick Moonen. (Vinicius Neder, com agências internacionais)