Título: Cai o número de votos para legenda
Autor: Souza, André de
Fonte: O Globo, 16/10/2010, O País, p. 18

Cientista político diz que votos nominais mostram sistema político frágil

BRASÍLIA. O Brasil tem uma profusão de partidos políticos ¿ são mais de 20 representados no Congresso ¿, mas o brasileiro não tem a tradição de votar na legenda. Nesta eleição foram 96,5 milhões de votos válidos para deputado federal, dos quais apenas 9,35% (pouco mais de 9 milhões) foram para a legenda, uma proporção menor que os 9,84% registrados em 2002 e os 9,83% de 2006. Em geral, os partidos com fortes candidatos a presidente conseguem se sair melhor, ajudando o legenda a eleger mais nomes.

Se, no total, o percentual do voto de legenda continua baixo, a quantidade de votos que cada partido recebeu variou muito, reflexo em muitos casos das campanhas majoritárias. O PV foi o partido que mais cresceu na votação em legenda desde 2002, passando de 127 mil para 824 mil votos: um aumento de 547,65%. Nesse caso, no entanto, a candidatura de Marina Silva e a onda verde não explicam tudo: em 2006, os verdes já tinham alcançado a marca de 572 mil votos de legenda.

Outros partidos seguiram o caminho inverso. O PSOL, por exemplo, que em 2006 tinha Heloísa Helena, terceira colocada na disputa presidencial, alcançou 319 mil votos de legenda.

Em 2010, com Plínio de Arruda Sampaio, a votação despencou para 174 mil, uma redução de 45,34%. O PSB, por sua vez, cresceu de 2006 para 2010, mas ainda não recuperou o índice de 2002, quando seu candidato a presidente, Anthony Garotinho, ficou em terceiro lugar.

Já o PDT, que em 2006 lançou o senador Cristovam Buarque (DF) e em 2010 apoia a petista Dilma Rousseff, viu seus 810 mil votos de legenda na eleição passada se transformarem em 367 mil este ano. O próprio Cristovam lembra que ter um candidato a presidente serve para aumentar a exposição do partido: ¿Quem tem candidato próprio, tem dois, três minutos no horário eleitoral. Sem candidato próprio, o PDT não tem esse horário. Nós jogamos fora uns 170 minutos (de TV).

Cientista político, Murilo Aragão concorda com o senador: ¿ Há exposição maior por causa do candidato. Como, normalmente, temos poucos candidatos competitivos, os que são levam vantagem. Eles lançam candidatos para reforçar base partidária. É uma estratégia.

O fato de a maioria dos votos ser nominal, na opinião de Aragão, mostra uma fragilidade do sistema político brasileiro.

¿ É um traço de fragilidade na instituição parlamentar. Revela um certo personalismo.

Se um presidenciável ajuda, os escândalos, segundo o cientista político Ricardo Caldas, da Universidade de Brasília (UnB), podem prejudicar, levando o eleitor a pensar melhor se deve votar novamente naquele partido.

O PT, por exemplo, um dos protagonistas do escândalo do mensalão, baixou sua votação de 2,35 milhões de votos em legenda em 2002 para 2,22 milhões em 2006.

Em 2010 voltou a subir 5,22%, taxa, no entanto, abaixo do crescimento de 7,77% verificado no eleitorado apto para votar para deputado federal. Envolto no escândalo do mensalão do Distrito Federal, o DEM, que havia caído 13,92% de 2002 para 2006, despencou outros 35,79% em 2010.

¿ O voto de legenda reflete a identificação partidária. Se a identificação entra em crise, o voto em legenda, também ¿ diz Caldas.

O PSDB, principal rival do PT e maior aliado do DEM, seguiu a direção contrária. Se em 2002, para cada dois votos em legenda do PT havia um para os tucanos (2,35 milhões contra 1,17 milhão), a diferença se estreitou em 2010. Agora os votos em legenda do partido equivalem a 84,85% dos conferidos ao PT (2,33 milhões contra 1,98 milhão).

Para Murilo Aragão, o sucesso do PSDB e o fracasso do DEM estão associados: ¿ O PSDB de certa forma lucra com o fracasso do Democratas, capturando o voto oposicionista.