Título: Ações contra tentativa de cercear a imprensa
Autor: Farah, Tatiana
Fonte: O Globo, 19/03/2010, O País, p. 19

Para representantes de meios de comunicação, proposta do governo põe em risco a liberdade de expressão

SÃO PAULO. Em reunião ontem na Federação do Comércio de São Paulo(Fecomércio), dirigentes da Associação Nacional de Jornais (ANJ), daAssociação Brasileira de Emissoras de Rádio e TV (Abert) e daAssociação Nacional dos Editores de Revistas (Aner) discutiram comempresários a possibilidade de ingressar no Supremo Tribunal Federalcontra a terceira versão do Plano Nacional de Direitos Humanos(PNDH-3), considerado inconstitucional por elas.

Para osrepresentantes dos meios de comunicação, o plano colocaria em risco aliberdade de imprensa ao tentar impor mecanismos de controle à mídia. Apresidente da ANJ, Maria Judith Brito, chamou a proposta do governo deexcrescência.

Esse programa parece um samba do crioulo doido.Com o pano de fundo dos direitos humanos, tenta, praticamente, abarcartodos os setores, censurar todos os âmbitos da vida nacional disse apresidente da ANJ e diretora-superintendente da empresa Folha da Manhã.

Esteé o momento de acirrar nossas manifestações Judith Brito afirmou que oministro Paulo Vannuchi, da Secretaria Especial de Direitos Humanos, jámanifestou a possibilidade de modificar os artigos que dizem respeito àimprensa, além dos já anunciados, como a questão da descriminalizaçãodo aborto: Ele disse que não está fechado a fazer reparos, inclusive,em comunicações. Então este é o momento para acirrar ainda mais nossasmanifestações para que, de fato, essa excrescência não tenhaprosseguimento.

Segundo a presidente da ANJ, o termo controlesocial da mídia, que é destacado no plano do governo Lula, é uma teserecorrente na pauta governamental.

Ela citou a tentativa dogoverno, em 2004, de criar o Conselho Federal de Jornalismo, projetoque foi arquivado diante da reação da sociedade, e, em 2005, atentativa de criação da Ancinav para regular o setor de cinema eaudiovisual: Talvez a mídia tenha sido a instância mais agredida oumais sistematicamente agredida durante os dois governos do presidenteLula.

Para Judith Brito, isso ocorreria porque a imprensaincomoda o governo: A liberdade de imprensa é um bem maior que nãodeve ser limitado. A esse direito geral, o contraponto é sempre aquestão da responsabilidade dos meios de comunicação. E, obviamente,esses meios de comunicação estão fazendo, de fato, a posiçãooposicionista deste país, já que a oposição está profundamentefragilizada. E esse papel de oposição, de investigação, sem dúvidanenhuma incomoda sobremaneira o governo.

O assessor jurídico daAbert, Rodolfo Machado Moura, afirmou que a entidade não é contra todoo plano de direitos humanos, mas que há problemas no que tange à áreadas comunicações.

Moura admitiu que o termo controle social damídia já está publicado no decreto anterior, o PNDH-2, de 2002, dogoverno Fernando Henrique Cardoso (PSDB).

O plano atual, noentanto, preocupa mais (aos meios de comunicação) não só pelas ações dogoverno sobre a imprensa como pelo detalhamento do que seria essecontrole social disse o advogado, mostrando pontos em que o plano seconfrontaria com a legislação atual, principalmente na questão dasconcessões de rádio e TV.

Citando um artigo recente publicado emjornal, o presidente da Aner, Roberto Muylaert, brincou que o documentodeveria ser queimado.

É a maior inconsistência de um documento onde quem berra é imediatamente corrigido de acordo com o seu berro disse Muylaert.

Presidindoa reunião, o jurista Ives Gandra Martins, presidente do ConselhoSuperior de Direito da Fecomércio, comparou o PNDH-3 às constituiçõesbolivarianas em vigor na Venezuela, na Bolívia e na Nicarágua.

Temos a imprensa controlada de um lado e o empreendedorismo controladode outro disse o jurista, que completou: Saímos de um estadodemocrático de direito e fomos para um estado bolivariano.

Gandrapropôs que as entidades se organizassem para ingressar no STF contra odecreto, contestando ponto a ponto os termos do PNDH-3. Ele tambémsugeriu que as críticas sejam encaminhadas ao Conselho de DireitosHumanos da ONU, já que Vannuchi teria recorrido à instituição parapedir uma avaliação do plano e para saber se está em acordo com ospreceitos atuais das Nações Unidas.

Ives Gandra informou aindaque haverá debate no Senado, convocado pela senadora Kátia Abreu(DEM-TO), para questionar o ministro Vannuchi. Ele informou que todo omaterial do encontro de ontem será remetido à senadora e aos demaisparlamentares para servir de subsídio para as discussões