Título: Ameaça de rombo no FAT
Autor: Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 20/04/2008, Economia, p. 29

Com explosão do seguro-desemprego, déficit atingirá R$1 bi, afetando investimentos.

Oaumento das despesas do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), em decorrência dos gastos explosivos com seguro-desemprego e abono salarial, já está comprometendo os investimentos no setor produtivo e pode colocar em risco o patrimônio do fundo. O alerta consta de um documento enviado pelo Ministério do Trabalho à Secretaria de Orçamento Federal (SOF), do Ministério do Planejamento, há cerca de duas semanas. Com projeções para os exercícios de 2008 a 2011, a nota informa que o FAT registrará seu primeiro déficit operacional, de R$967,6 milhões, em 2010, atingindo R$3,7 bilhões em 2011, e pede a realização de estudos urgentes para tentar conter o desequilíbrio das contas. A estimativa considera que a economia crescerá 5% ao ano, com inflação de 4,5% no período.

Entre 2000 e 2007, a despesa total do FAT cresceu 90,3%, enquanto as receitas subiram apenas 43%. Com o ganho real do salário mínimo, a participação das despesas com abono salarial - que corresponde a um piso pago a todos os trabalhadores que ganham em média dois salários mínimos por ano (R$830) - subiu de 17,2% do valor desembolsado pelo fundo para 29,5%. E a alta rotatividade do mercado formal de trabalho fez com que a participação do seguro-desemprego nos gastos do FAT saltasse de 1% para 4% nos últimos sete anos.

Em termos nominais, as despesas com seguro-desemprego e abono salarial saíram de R$11,4 bilhões, em 2002, para R$18,7 bilhões em 2007. Das receitas de 2007, R$30,5 bilhões, 61,3% foram consumidos no ano passado com apenas essas duas rubricas. Os valores estão corrigidos pelo IGP-DI, índice de inflação da FGV.

Dinheiro do Fundo para o BNDES é menor este ano

Segundo o documento, as receitas do FAT passarão de R$29,1 bilhões em 2008 para R$41,2 bilhões nos próximos três anos, enquanto as despesas saltarão de R$26,1 bilhões para R$44,9 bilhões no período. A nota alerta ainda que a arrecadação já não é suficiente para fazer frente aos compromissos, o que está levando o Fundo a tomar de volta dinheiro repassado aos bancos oficiais (BB, Caixa Econômica Federal, BNDES, Banco do Nordeste e Basa).

Esses recursos constituíam excedentes e formavam as linhas especiais, usadas em programas de geração de emprego e renda, agricultura familiar e inclusão digital, financiamento de capital de giro e apoio a pequenos exportadores. Em 2007, pela primeira vez, as instituições tiveram de devolver R$2,4 bilhões ao FAT. Os repasses às linhas especiais caíram de R$16 bilhões em 2006 para a metade no ano passado. Em 2008, foram liberados apenas R$4 bilhões e, no próximo ano, a previsão é de R$2,5 bilhões.

Além disso, o BNDES, constitucionalmente, recebe 40% da arrecadação anual do FAT para financiar projetos de infra-estrutura. Hoje, o banco tem R$105,6 bilhões do FAT incorporados a seus ativos, que somam no total R$201 bilhões. Caso não seja encontrada uma alternativa, o FAT pode começar a pedir esse dinheiro de volta também, como está fazendo com as linhas especiais. Mas, se esses recursos forem solicitados de uma só vez, "o banco quebra", afirmou o diretor financeiro do BNDES, Maurício Borges, que não acredita numa situação extrema como essa.

Este ano, o BNDES receberá R$9,9 bilhões obrigatórios e pediu ao FAT R$5 bilhões da linha especial, mas foi informado de que só receberia R$1,4 bilhão neste último caso. E, mesmo assim, essa quantia não poderá ser aplicada na infra-estrutura (projetos de longo prazo), só nos programas de financiamento a micro e pequenas empresas, de maior liquidez.

Não por acaso, o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, e o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, ficaram preocupados após tomarem conhecimento da situação do FAT.

- Temos que fazer um esforço no sentido de neutralizar os fatores negativos no funding (fonte de recursos) do FAT para sustentar o fluxo de desembolso crescente do banco - afirmou Borges.

A instituição está buscando alternativas, pois precisa obter R$10 bilhões extras para atender à demanda do setor privado. Não desistiu ainda de abocanhar recursos do FGTS nem da formação de um fundo soberano. A redução dos dividendos repassados ao Tesouro também está sendo estudada.

Para Leonardo Rolim, consultor da Comissão de Orçamento do Congresso, a deterioração das contas do FAT é preocupante, pois se trata de uma fonte de recursos acessível e barata para projetos de longo prazo, num país de baixa poupança privada.

- O impacto imediato é a redução de recursos para financiamento à produção, o que já está acontecendo - disse Rolim.

Na tentativa de buscar uma saída para o FAT, o Ministério do Trabalho está debruçado na elaboração de uma proposta para inibir a rotatividade no mercado de trabalho e, com isso, colocar um freio nos gastos com as demissões. A idéia é criar uma contribuição para os empregadores, cujo percentual vai variar de acordo com o índice de demissões em curto espaço de tempo no setor em que a empresa atua.

O projeto de lei em estudo vai regulamentar o artigo 239 da Constituição Federal, que já prevê uma espécie de punição ao empregador para inibir a rotatividade. O primeiro impacto dessa medida seria o fim da multa de 40% sobre o saldo do FGTS nas demissões sem justa causa. A multa foi instituída para vigorar até a regulamentação desse artigo, explicou um técnico.

A pasta está avaliando ainda aumentar de seis meses para dois anos de trabalho de carteira o prazo para que o trabalhador seja elegível ao seguro-desemprego. Também será repensado o papel do abono salarial. A avaliação é que, com uma política de valorização do salário mínimo, não faz mais sentido manter esses gastos.