Título: Aeronáutica ainda não sabe as causas do acidente
Autor: Gripp, Alan
Fonte: O Globo, 17/08/2007, O País, p. 5

Posição errada do manete foi decisiva, indica caixa-preta; mas falta esclarecer se por falha do piloto ou do equipamento

BRASÍLIA. Um mês depois da tragédia do vôo 3054, a Aeronáutica já está convencida de que um erro na posição dos manetes (alavanca que regula a potência das turbinas) foi o fator decisivo para o acidente com o Airbus A-320 da TAM, mas está longe de responder à pergunta que vem obrigatoriamente em seguida: isso aconteceu por erro do experiente comandante Kleyber Lima ou por uma falha no computador de bordo, que não teria compreendido o comando do piloto?

A caixa-preta de dados revelou que, no momento em que o Airbus tocou na pista de Congonhas, o manete esquerdo foi reduzido da posição de aceleração (climb) para o ponto morto (idle), no procedimento correto. O direito, no entanto, permaneceu em climb. Isso fez com que o computador de bordo não "entendesse" que a aeronave estava em processo de pouso e não acionasse o sistema automático de freios aerodinâmicos (spoilers), o que contribuiu decisivamente para que os pilotos perdessem o controle. O Airbus chocou-se com o prédio da TAM Express, matando 199 pessoas.

Alerta de piloto pode indicar falha mecânica

Por que isso aconteceu? Em 30 dias de muita especulação, há argumentos que apontam para os dois lados. Em favor da tese de pane do Airbus, especialistas dizem ser quase impossível que um piloto com 20 mil horas de vôo pudesse errar infantilmente um procedimento aprendido nas primeiras aulas nos simuladores. Outra dúvida: segundos após o pouso, Kleyber Lima diz ao co-piloto Henrique Stephanini di Sacco: "Aiiii... Olha isso". Para alguns, pode tratar-se de um alerta de que algo acontecia fora do previsto.

Os que defendem a tese de falha humana lembram que o erro improvável já aconteceu em 2004, no acidente com o Airbus da Transasia, em Taiwan, que terminou sem vítimas. Baseiam-se ainda na segurança do Airbus A-320, aeronave com um dos mais baixos percentuais de acidentes no mundo. À fabricante franco-alemã, a comissão que investiga o acidente disse que a análise da caixa-preta "não revelou indícios de falha mecânica da aeronave". Foi o bastante para a Airbus emitir um comunicado para todos os seus clientes eximindo-se de qualquer culpa.

Apesar de não descartar nenhuma hipótese, o chefe do Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes (Cenipa), da Aeronáutica, brigadeiro Jorge Kersul, disse aos deputados da CPI do Apagão Aéreo em sessão secreta:

- Essas máquinas são muito próximas da perfeição.

Investigação ainda está longe de terminar

Numa coisa todos concordam: a investigação ainda está longe de terminar. Casos semelhantes levaram até 18 meses para resultar em um relatório final. E mais: qualquer que seja a conclusão, o documento não apontará culpados, mas sim uma série de fatores que possam ter contribuído para a tragédia. É assim por força de uma convenção internacional, da qual o Brasil é signatário.

Dentro deste cenário, só há uma certeza: a pista de Congonhas, que registrou seguidas reclamações de que é escorregadia em dias de chuva, estará entre esses fatores.

- Que influência teve a pista? Foi decisiva, ou apenas a turbina acelerada bastava para que acontecesse a explosão? Há muito o que responder ainda - diz o comandante Célio Eugênio Abreu, assessor de Segurança do Sindicato dos Aeronautas.