Título: PREÇOS DO ÁLCOOL PODEM VOLTAR A SUBIR NA BOMBA
Autor: Eliane Oliveira/Ronaldo D"Ercole
Fonte: O Globo, 12/07/2006, Economia, p. 29

Exportações contribuem para reajuste do combustível, mas usineiros e governo descartam desabastecimento

SÃO PAULO e BRASÍLIA. Os preços do álcool combustível podem voltar a subir para os consumidores nas próximas semanas, embora o país esteja em plena safra da cana-de-açúcar. O preço do produto vendido pelas usinas paulistas, que abastecem 60% do mercado nacional, já subiram 7% desde meados de maio. Na última sexta-feira, segundo o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (Cepea/USP), o litro do álcool hidratado era cotado a R$0,89 nas usinas, depois de ter chegado a R$0,83 em 19 de maio. E esse aumento ainda não chegou às bombas.

- Até setembro, os preços do álcool não devem cair, nem subir, muito além do atual patamar - prevê Antonio de Pádua, diretor técnico da Unica, entidade que reúne as usinas paulistas.

Vendas para os EUA subiram 270% no 1º semestre

Mesmo que fique no patamar de R$0,90, o álcool combustível estará 34% mais caro do que em julho de 2005 (cerca de R$0,67). Por trás dessa nova realidade de preços estão dois fatores que nada têm a ver com o consumo doméstico.

O primeiro é a proibição, nos Estados Unidos, do uso do aditivo MTBE na gasolina, o que elevou as vendas do álcool (hidratado e anidro, misturado à gasolina) para aquele país. Elas subiram 523% em valor e 270% em volume no primeiro semestre frente a igual período de 2005.

O outro fator diz respeito aos preços internacionais do açúcar. No primeiro semestre, a cotação do produto subiu 37%. Com isso, embora o Brasil tenha vendido menos em volume no período (-21%), a receita exportada cresceu 8,7%. Ou seja, as usinas não têm, neste momento, grande necessidade de vender álcool ao mercado interno para fazer caixa e cobrir os custos de produção.

Para o diretor da Unica, no entanto, não há risco de desabastecimento nem de disparada nos preços do álcool. A produção no primeiro semestre foi 14% maior que no mesmo período de 2005. Além disso, observa Pádua, na maioria dos estados os preços já estão no limite (de 70% do da gasolina) que torna o álcool vantajoso:

- A perda de competitividade em relação à gasolina impõe limites a aumentos exagerados do álcool.

O governo federal também descarta nova crise do álcool, agora ou na virada do ano, início da entressafra. Segundo o diretor do Departamento de Cana-de-Açúcar e Agroenergia do Ministério da Agricultura, Angelo Bressan, o movimento está normal. Mas ele admitiu que a alta pode estar sendo influenciada pelas exportações, que, segundo a Unica, devem atingir 1,9 bilhão de litros até setembro, volume igual ao exportado durante toda a última safra:

- O reajuste de São Paulo é um movimento isolado e dentro da margem com que trabalhamos. O mesmo não se vê em outras partes do país.

Para Marta Marjotta Maistro, do Cepea/USP, não há alterações significativas nos preços nesta safra em comparação à anterior. Ela frisou que as exportações estão aquecidas, mas o mercado interno é que pesa na demanda, por causa dos veículos bicombustíveis. Marta lembrou que o preço do álcool fechou março - pico da entressafra - em R$1,19142 o anidro e R$1,20853 o hidratado. Em junho, o valor do anidro caiu para R$0,98366 e o do hidratado, para R$0,85455 na usina, queda de até 29,29%.

Ao descartar uma crise na entressafra, Bressan lembrou a produção recorde de cana-de-açúcar este ano, estimada em 469,8 milhões de toneladas, o que daria 17,8 bilhões de litros de álcool hidratado. Mas ele reconheceu que, para o país ficar em situação confortável, seria preciso um estoque de 2 bilhões de litros na entressafra, financiados com R$1 bilhão. O problema, explicou, é que esses recursos não estão previstos no Orçamento de 2006.