Título: ÀS PRESSAS, TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO ABRE BRECHA PARA VOLTA DO NEPOTISMO
Autor: Chico Otavio
Fonte: O Globo, 09/03/2006, O País, p. 12

O Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro decidiu, na segunda-feira, alterar a estrutura dos cargos de comissão do órgão. Assessores e assistentes deixam de estar vinculados diretamente aos gabinetes dos desembargadores e passam a integrar uma espécie de pool, subordinado a um departamento. A medida, já em vigência, é vista como uma brecha para a volta do nepotismo no TJ.

Por 23 votos a um ¿ o voto vencido foi do desembargador Marcus Faver, membro do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) ¿ o Órgão Especial aprovou a resolução 06/2006, que modifica a ¿estrutura organizacional¿ do TJ e, entre outras medidas, transfere os assessores com cargos de comissão DAS-6 (R$2,8 mil mensais) e DAS-8 (R$3,5 mil) dos gabinetes dos desembargadores para o Departamento de Coordenação e Assessoria Direta aos Desembargadores e Secretarias de Órgãos Julgadores do tribunal.

Medida dificulta rastreamento de parentes

Com isso, fica mais difícil rastrear a presença de parentes de magistrados entre os comissionados do TJ, uma vez que eles ficam administrativamente desligados dos gabinetes. Num primeiro momento, a medida beneficiará os parentes concursados, que pela resolução do Conselho Nacional de Justiça ¿ confirmada pelo Supremo Tribunal Federal ¿ estão impedidos de ocupar cargos de comissão dos gabinetes dos magistrados.

A medida foi votada às pressas. Alguns integrantes do Órgão Especial, formado pelos 25 mais antigos desembargadores, só receberam a minuta da resolução na sexta-feira, com pouco tempo para estudar os seus efeitos. Geralmente, projetos desta dimensão são analisados previamente por uma comissão de legislação, formada por três juízes antes de seguir para o plenário. A intenção é verificar os propósitos, a conveniência e a legalidade das mudanças propostas, o que não ocorreu.

O TJ aprovou a medida no momento em que enfrenta uma crise financeira, com as despesas de pessoal (5,7% da receita líquida do Estado) quase no limite imposto pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Corre o risco, inclusive, de não contratar os juízes aprovados pelo concurso mais recente porque a verba destinada a pessoal se esgotou.

O tribunal do Rio foi um dos mais resistentes ao cumprimento da resolução 07 do CNJ, que determinou o fim da prática do nepotismo no Judiciário brasileiro. Enquanto a questão não era apreciada pelo Supremo, mais de 70 liminares foram concedidas por alguns de seus desembargadores em favor de parentes de colegas. Um dos responsáveis pelas liminares foi o desembargador Sérgio Verani, que na sessão de segunda-feira defender publicamente a alteração da estrutura de cargos.

Depois que o Supremo confirmou o fim do nepotismo, mais de 80 pessoas foram demitidas no TJ.

Presidente garante que demitidos não voltarão

O presidente do tribunal, desembargador Sérgio Cavalieri, negou ontem que a resolução aprovada pelo Órgão Especial abra caminho para a volta da prática do nepotismo. Segundo ele, a medida aprovada é apenas a consolidação de uma série de mudanças administrativas já em andamento, entre elas a criação de uma ouvidoria geral no TJ.

¿ Foi uma reformulação administrativa. Os demitidos não voltam. Não sou maluco. Embora continue entendendo que a iniciativa no CNJ é inconstitucional, estou cumprindo a decisão do Supremo. Não vou mais questionar isso ¿ garantiu Cavalieri.

O presidente disse as medidas, sugeridas pela Fundação Getúlio Vargas, atingiram também a Escola da Magistratura, a Presidência e as três vice-presidências do Tribunal.

¿ Sobre os cargos de comissão, a idéia é de que não haja mais vinculação de assessor, seja parente ou não parente. Desvinculado do gabinete, ele já não vai fazer o que bem entender. Eles agora estarão ligados a um órgão de assessoria das secretarias das Câmaras ¿ declarou.

Cavalieri esteve ontem com o presidente do Supremo e do CNJ, ministro Nelson Jobim, para explicar a medida.