Título: Saída para o balneário
Autor: JOSÉ LUIZ ALQUÉRES e JOSÉ HUGO CAMPBELL ALQUÉRES
Fonte: O Globo, 03/02/2005, Opinião, p. 7

Nos bons tempos de André Filho, compositor e autor do hino ¿Cidade Maravilhosa¿, nossa cidade era, de fato, maravilhosa e encantada, coração (órgão vital e sentimental) do país e fonte principal da produção lírica e musical do Brasil. Continuamos, é certo, sendo referência no samba e sede do carnaval, hoje um evento global, embora o espírito da cidade seja mais bem captado nos funks, como o ¿Endereço dos Bailes¿, que descrevem a animação dos bailes populares e os valores da nova sociedade urbana carioca.

Decorridos poucos anos da fusão Guanabara-Rio de Janeiro somos hoje um balneário decadente. Ouvimos, perplexos, autoridades policiais anunciarem que o povo da Rocinha poderá dormir tranqüilo, pois há um único grupo no controle do tráfico; assistimos à consolidação da imagem da cidade do Rio de Janeiro como destino certo dos que buscam turismo sexual e prostituição; verificamos presença carioca quase inexpressiva no cenário político e econômico nacional.

Para superar isso temos o desafio de compor o melhor da nossa história e superar os problemas atuais para fazer do Rio uma cidade melhor para seus habitantes. O primeiro passo para isso é a criação da Cidade-Estado.

O novo estado, de município único, dará fim ao jogo de empurra entre governador e prefeito e da duplicação Câmara de Vereadores Assembléia Estadual; a máquina administrativa ágil e simplificada (com, por exemplo, polícias Civil, Militar e Guarda Municipal trabalhando harmoniosamente) ensejará serviços melhores e a menor custo.

Destaque-se: o primeiro segmento a ser beneficiado deverá ser a população pobre. Poucas cidades no mundo têm o privilégio de dispor de bairros populares ao lado dos bairros de classe média e alta. Isso poderia ensejar enormes vantagens competitivas em comparação com outras cidades, que relegam classes proletárias e prestadoras de serviços a distantes periferias. Revolta hoje observar a lentidão na implantação de soluções criativas com a participação das comunidades envolvidas, de forma a absorver esses bairros populares no tecido urbano, transformando-os em extensões naturais em vez de guetos aterrorizados por bandidos, onde o estado não se faz presente.

Vamos regularizar a propriedade imobiliária, vamos fazer de cada morador um proprietário dotando-o de um patrimônio legalizado, o que o permitirá dispor de seu lote como bem quiser. Vamos desenvolver um estatuto para criar em cada comunidade fontes de trabalho e obras de urbanização, injetando dinheiro que crie nelas oferta localizada de trabalho, melhore a moradia e os serviços essenciais para sua população.

Entendemos ainda que o melhor instrumento para contenção do crescimento das favelas é a oferta de moradia popular e lotes urbanizados nas áreas ainda disponíveis do Rio de Janeiro ou de seus municípios limítrofes, ao longo das linhas de trens existentes.

Infra-estrutura e meio-ambiente são também prioridades: Hoje os serviços públicos no Rio vão de mal a pior. Empresas como Light, Cedae e Supervia, entre outras, sofrem grandes perdas ¿concorrendo¿ com furtos e pirataria. Nosso patrimônio ambiental é corroído diariamente desgastando a cidade que tinha na beleza natural uma fonte de atração de recursos.

Por fim o tema desenvolvimento, que traz na sua evolução as respostas para desafios econômicos sociais, ganharia extremamente com a criação do Rio cidade-estado. A vocação da cidade hoje está nos serviços, no comércio, no conhecimento e na sua capacidade de se articular em uma rede mundial de mega-cidades, voltando a ser a porta de entrada do país.

A hora é esta, 2005 pode ser o ano de um plebiscito que volte a fazer brilhar independentes as estrelas dos estados da Guanabara e do Rio de Janeiro, para o bem de suas populações e muito especialmente para o reforço da Federação. A cidade pode e deve voltar a ser o coração do Brasil¿.