Título: Fazenda e Itamaraty criticam texto da Ancinav
Autor: Mônica Tavares
Fonte: O Globo, 19/11/2004, O País, p. 13

Além de agitar o setor cultural, a polêmica sobre o anteprojeto de lei que cria a Agência Nacional de Cinema e Audiovisual (Ancinav) atingiu em cheio também setores do próprio governo federal. O Ministério das Relações Exteriores e a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae), do Ministério da Fazenda, manifestaram oficialmente divergências ao texto elaborado pelo Ministério da Cultura.

Secretaria quer opinar sobre questões de mercado

Durante a consulta pública ao projeto, a Seae pediu por escrito que a Ancinav não fique com a competência exclusiva sobre assuntos de mercado e de defesa da concorrência no setor cultural. Esse tema é de competência do Ministério da Fazenda, o que já está previsto no projeto das agências reguladoras. Mas o anteprojeto da Ancinav dá todo poder à própria agência nos assuntos de defesa da concorrência.

Diante disso, a Seae aconselhou o Ministério da Cultura a incluir no texto previsão para que a secretaria seja consultada antes de qualquer ato da Ancinav a respeito de problemas de concorrência e mercado.

O Ministério das Relações Exteriores também fez reparos ao texto. Enviou à Cultura uma sugestão de que a atuação da Ancinav na área internacional não fique limitada ao órgão a ser criado. O Itamaraty pediu para ser ouvido antes de serem tomadas decisões sobre ¿aspectos externos¿ ligados ao setor.

O subchefe de Análise de Políticas Governamentais da Casa Civil da Presidência, Luiz Alberto dos Santos, disse que todos os pontos serão discutidos com os ministérios.

Ontem, durante seminário ¿A Agência Nacional do Cinema e do Audiovisual (Ancinav) e o fortalecimento da produção audiovisual brasileira¿, realizado na Câmara, Manoel Rangel, assessor especial da Secretaria de Audiovisual do Ministério da Cultura, explicou a proposta do governo e admitiu que em alguns pontos houve polêmica entre representantes da sociedade civil que debateram o texto.

¿ O Comitê da Sociedade Civil trabalhou na revisão da minuta durante os últimos três meses. Foi um amplo processo de aprimoramento que, mesmo sem superar divergências, resulta num novo texto aperfeiçoado, que será submetido ao crivo do plenário do Conselho Superior do Cinema ¿ disse Rangel.

Gil: marcos regulatórios devem ser consensuais

Ele apontou quatro questões que ainda deverão ser analisadas pelo Conselho Superior de Cinema (CSC), que reúne nove ministros, na reunião marcada para o dia 9 de dezembro. A primeira é sobre a criação de mecanismos de regulação da produção e distribuição de conteúdos audiovisuais. Outra questão refere-se à abrangência da Ancinav: se terá poderes para regular desde o cinema até os novos serviços de distribuição de conteúdos oferecidos pelas operadoras de telecomunicações.

Ainda terá que ser decidido pelo conselho como será o financiamento do setor. Algumas taxas foram reduzidas e outras eliminadas, como os 10% que seriam cobrados sobre os ingressos de cinema. Rangel disse que também há polêmica sobre a ênfase no apoio à empresa e à obra audiovisual brasileiras.

O ministro da Cultura, Gilberto Gil, que encerrou o seminário, reafirmou o desejo de debater o marco regulatório do setor e a criação da Ancinav. Ele destacou a participação de todos os setores.

¿ A adoção de instrumento regulatório não deve ser objeto puro e simples de voluntarismo governamental, ainda que os governos estejam incumbidos desta tarefa. Dada a complexidade, é de bom alvitre que a adoção de marcos regulatórios seja um consenso ¿ disse Gil.