Título: BUSH ASSISTE À NOSTALGIA SOVIÉTICA
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Fonte: O Globo, 10/05/2005, O Mundo, p. 24

Sem pedir perdão, Putin diz que mundo deve agradecer à URSS por derrota do nazismo

MOSCOU

Acena seria impensável durante a maior parte da segunda metade do século XX. Mas ontem, durante o tributo que o mundo pagou ao gigantesco esforço feito pela Rússia e pelos outros países que constituíam a antiga União Soviética na derrota do terror nazista na Segunda Guerra Mundial, 60 anos atrás, os presidentes dos Estados Unidos, George W. Bush, e da Rússia, Vladimir Putin, estiveram pela primeira vez lado a lado no desfile militar comemorativo na Praça Vermelha, em Moscou. Putin, no entanto, frustrou aqueles que esperavam um pedido de perdão pelas ditaduras comunistas instaladas na Europa Oriental pelo Kremlin durante a Guerra Fria.

Bush prefere lugar discreto

Na homenagem aos 27 milhões de mortos da URSS no conflito, Putin se esmerou em reencenar para os convidados a grandeza dos tempos soviéticos, quando Moscou era a capital da superpotência que disputava com os EUA o controle do mundo. Estavam presentes também os presidentes Hu Jintao, da China, e Jacques Chirac, da França, além do chanceler federal alemão, Gerhard Schroeder, e do premier Junichiro Koizumi, do Japão ¿ ambos líderes de países derrotados na guerra ¿ juntamente com chefes de Estado e governo de cerca de 50 países. O secretário-geral da ONU, Kofi Annan, também foi aos festejos.

Bush, num lugar de honra junto a Putin, preferiu deixar os holofotes ao colega russo. Putin lembrou o preço de sangue pago pelos soviéticos na guerra e ressaltou que o mundo devia ¿grandes agradecimentos¿ aos mortos da URSS, acrescentando que o legado da guerra demonstra a necessidade de uma nova unidade com a Rússia contra novas ameaças.

¿ As lições da guerra nos enviam o aviso de que a indiferença, a demora em tomar decisões e a cumplicidade com a violência levam a terríveis tragédias em escala planetária ¿ alertou Putin. ¿ Confrontados com a ameaça real do terrorismo, devemos permanecer fiéis à memória de nossos pais. É nossa obrigação defender uma ordem mundial baseada na segurança e na justiça e numa nova cultura de relações entre nações que não permita a repetição de qualquer guerra.

Apesar do grande número de líderes estrangeiros presentes, a ausência de três vizinhos deu o tom de desconfiança com que muitos na região ainda olham para a Rússia. As ex-repúblicas soviéticas de Lituânia, Estônia e Geórgia não enviaram delegações de alto nível.

Os georgianos boicotaram a festa por causa da recusa de Moscou a fechar bases russas em seu território, e os países bálticos alegam que a queda de Hitler significou apenas a troca da tirania nazista pela soviética.

¿ Um país tem de chegar a um entendimento com seu passado, e deveria expressar a tristeza de que tal coisa tenha acontecido nos dias da União Soviética ¿ pontuou Vaira Vike-Freiberga, presidente da Letônia, referindo-se à Rússia.

O presidente Putin procurou aliviar as tensões, reafirmando os compromissos democráticos assumidos pela Rússia após o fim do comunismo.

¿ Nossa política é baseada em ideais de liberdade e democracia e no direito de cada nação escolher seu próprio caminho.

Bush, após o desfile, foi para a Geórgia, que derrubou em 2003 um presidente remanescente dos tempos do comunismo soviético. A visita é considerada um gesto de apoio às democracias que nasceram das cinzas da URSS.

Por sua vez, a Rússia e a União Européia realizam hoje em Moscou uma reunião de cúpula para fazer um balanço de suas relações completado um ano da ampliação do bloco para a Europa Oriental.

Com o New York Times