Título: CESAR LATTES, A DESPEDIDA DE UM GÊNIO DA FÍSICA
Autor:
Fonte: O Globo, 09/03/2005, Rio, p. 19

Cesar Lattes deixou o nome gravado para sempre na história da física mundial. Um dos maiores cientistas que o Brasil já teve, ele também foi um dos artífices de conquistas que ao longo da segunda metade do século XX ajudaram a formar a base do ensino e do estímulo à ciência nacional. Nascido Cesare Mansueto Giulio Lattes, em 11 de julho de 1924, em Curitiba, ele começou cedo a demonstrar a genialidade que o tornaria internacionalmente conhecido. Com apenas 19 anos, formou-se em física pela Universidade de São Paulo (USP). No início da década de 40, já publicava seus primeiros trabalhos científicos.

A descoberta pela qual é mais lembrado, a do méson pi - também chamado píon - , aconteceu em 1947, quando integrava o grupo de Giuseppe Occhialini e Cecil Frank Powell. Apenas um ano depois, ele identificou a chance de produzir artificialmente o píon, uma partícula subatômica que garante a coesão do núcleo do átomo. O papel do píon é manter prótons (carga positiva) unidos aos nêutrons (carga negativa) e vice-versa. Em 1935, a existência do píon havia sido proposta pelo físico japonês Hideki Yukawa. Porém, foi Lattes que provou a existência dessa partícula ao descobrir que os píons podem ter carga neutra, positiva ou negativa e transportar informações trocadas entre prótons e nêutrons. Com isso, alteram a composição das partículas.

O trabalho de Lattes teve imenso impacto na pesquisa brasileira a partir da segunda metade do século XX. Ele marcou a emergência da física das partículas elementares no país e semeou toda uma tradição de pesquisa nacional. Ele é um dos pais da chamada Física de Altas Energias, fundamental para a compreensão dos mecanismos que regem a matéria e a formação do Universo.

Lattes foi um dos fundadores, em 1949, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), no Rio. Também esteve nos grupos que criaram o Conselho Nacional de Pesquisas (CNPq), em 1951, e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), em 1962.

Ao longo de sua intensa carreira, Cesar Lattes tornou-se também o único físico brasileiro citado na Enciclopédia Britânica, honraria para a qual nunca demonstrou dar muita importância. Ele integrava a Academia Brasileira de Ciências, a União Internacional de Física Pura e Aplicada, o Conselho Latino-Americano de Raios Cósmicos, e as sociedades Brasileira, Americana, Alemã, Italiana e Japonesa de Física. Lattes também foi indicado três vezes ao Nobel de Física.

Debilitado, Cesar Lattes foi levado no início da tarde de ontem ao Hospital Madre Teodora, em Campinas, onde ele morava desde a década de 60, com fortes dores no peito. Lá, sofreu duas paradas cardíacas, mas foi reanimado. Por volta das 15h30, foi removido para o Hospital das Clínicas da Unicamp, onde voltou a sofrer a terceira e fatal parada cardíaca. Os médicos não conseguiram reanimá-lo e ele morreu às 15h40.

Cesar Lattes tinha 80 anos e estava aposentado desde 1986. Ele era viúvo e deixou duas filhas, que moram em Campinas. O velório acontecerá hoje a partir das 8h no Cemitério Flaboian, em Campinas. O físico será sepultado às 16h45.